E M E N T A PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. LIMINAR EM MANDADO DE SEGURANÇA. PIS . COFINS. REGIME NÃO-CUMULATIVO. APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS. PREVISÃO TAXATIVA. INCABÍVEL INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. DEDUÇÃO DE DESPESAS. ICMS. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. 1 - De partida, cumpre registrar que a discussão, no caso em apreço, não gira em torno da base de cálculo a ser considerada na apuração do valor devido pela empresa a título de PIS e COFINS; o que pretende a agravante é questionar a legitimidade da exclusão do ICMS - Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação -, promovida por meio da edição da Medida Provisória nº 1.159 /2023 (que, por sua vez, modificou as Leis 10.637 /2002 e 10.833 /2003) na apuração dos créditos do PIS e da COFINS. 2 - Na qualidade de pessoa jurídica submetida ao regime não-cumulativo, pretende-se a manutenção de benefício fiscal que usufruía antes da alteração legislativa que determinou a exclusão do ICMS na apuração dos créditos de PIS e COFINS, na forma estabelecida pelas Leis nº 10.637 /2002 e 10.833 /2003, respectivamente. É o cenário que se estabeleceu após a edição da Medida Provisória nº 1.159 /2023. 3 - Diversamente da não-cumulatividade prevista constitucionalmente em relação ao ICMS e ao IPI, aquela aplicável às contribuições ao PIS e COFINS depende de previsão legal e pode beneficiar distintos setores da atividade econômica, conforme disposto no § 12 do artigo 195 da Constituição , incluído pela Emenda Constitucional n.º 42 /03. Não se trata, portanto, de um direito individual do contribuinte de somente pagar o tributo se observada a não-cumulatividade, na medida em que o dispositivo constitucional apenas conferiu ao legislador a faculdade de instituir a não-cumulatividade, podendo, inclusive, adotar como critério diferenciador o setor da atividade econômica atingido, sem que isso implique em ofensa à isonomia. Nesse sentido, o e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 756 ( RE n.º 841.979 ), firmou tese no sentido de que “o legislador ordinário possui autonomia para disciplinar a não cumulatividade a que se refere o art. 195, § 12, da Constituição , respeitados os demais preceitos constitucionais, como a matriz constitucional das contribuições ao PIS e COFINS e os princípios da razoabilidade, da isonomia, da livre concorrência e da proteção à confiança”. 4 - Na exclusão do crédito tributário a legislação fiscal deve ser adotada literalmente (artigo 111 , I , do CTN ), o que não autorizaria interpretação extensiva. Os créditos que podem ser descontados são previstos taxativamente pela legislação infraconstitucional, cujo critério de eleição depende da vontade do legislador, ou seja, a tributação submete-se à conveniência e oportunidade do ato, de sorte que somente nos casos em que o comando legal apresentar inconstitucionalidade objetiva poderá o Judiciário declarar sua invalidade. Na apuração tributária, somente é cabível o aproveitamento de créditos pelo contribuinte naquelas situações expressamente previstas na lei. 5 - Os artigos 3º , § 2º , III , das Leis n.ºs 10.637 /02 e 10.833 /03 estabelecem que não dará direito ao aproveitamento de créditos o valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição. 6 - É bem verdade que a exclusão dos créditos de PIS e COFINS sobre ICMS sobreveio por meio da edição de Medida Provisória, a qual sinaliza a política tributária adotada pelo Poder Executivo na atualidade. No entanto, resta pacífica a possibilidade de instituição de tributo por meio de Medida Provisória, sem que se possa identificar qualquer irregularidade quanto à previsão trazida pela MP nº 1.159 /2023. Registre-se, inclusive, que a apreciação dos pressupostos de relevância e urgência para a edição da Medida Provisória é reservada ao Poder Executivo, não cabendo ao Poder Judiciário, em princípio, imiscuir-se no mérito administrativo e em tema de caráter claramente subjetivo. Além disso, não há qualquer elemento que revele ofensa aos princípios constitucionais e tributários, tendo sido observado, em particular, o princípio da anterioridade nonagesimal na adoção da medida provisória, de modo que não se vislumbra qualquer indicativo que autorize o Judiciário a substituir tarefa que incumbe aos demais Poderes, usurpando competência que não lhe cabe. 7 - Também desarrazoado invocar o suposto descumprimento do princípio da anterioridade nonagesimal após a publicação da Lei nº 14.592 /2023. Explico. A MP nº 1.159 , de 12/01/2023, particularmente no tocante à exclusão do valor “do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição” na apuração dos créditos de PIS e COFINS, estabeleceu que os seus efeitos somente seriam produzidos a partir do primeiro dia do quarto mês subsequente ao de sua publicação (art. 3º, I). Consoante Ato Declaratório do Presidente da Mesa do Congresso Nacional nº 40, de 2023, a referida MP “teve seu prazo de vigência encerrado no dia 1º de junho de 2023”. A Lei nº 14.592 /2023, por sua vez, foi publicada em 30/05/2023 e entrou em vigor na data de sua publicação (art. 15). Portanto, antes da edição do referido diploma legislativo, o contribuinte já tinha conhecimento da alteração promovida pela Medida Provisória. Com a sua mera reprodução por meio da Lei nº 14.592 /2023, após mais de quatro meses, com o mesmo teor da MP nº 1.159 – que ainda estava vigente-, não faz sentido se exigir novo respeito ao princípio da anterioridade nonagesimal, já que não houve qualquer surpresa ao contribuinte. 8 - Destaca-se, ainda, a possibilidade de apresentação de Emenda parlamentar durante o processo legislativo de conversão de Medida Provisória em lei, desde que tenha pertinência temática ao objeto originário, ou seja, o tema inserido pelo Legislativo por meio de novos dispositivos deve estar relacionado ao assunto tratado na MP. Quanto a esse aspecto, a Lei nº 14.592 /23 - fruto da conversão da MP n.º 1.147/23 que inicialmente tratou sobre o benefício de redução de alíquotas do PIS e COFINS -, em razão de Emenda parlamentar, também dispôs sobre o tema da exclusão do ICMS para fins de apuração do crédito das mesmas contribuições (originariamente previsto na MP nº 1.159 /2023, posteriormente revogada pela Lei nº 14.592 /23), o que evidencia a correlação dos assuntos disciplinados, desta feita, sem que se possa cogitar de qualquer irregularidade, ante a clara distinção do famigerado contrabando legislativo que se pretende coibir. Há que se ponderar que a Medida Provisória nº 1.159 /2023 não tratou de regular a fixação da base de cálculo do ICMS – a ensejar, nesse caso, eventual ofensa ao texto constitucional – mas tão somente tratou da incidência e forma de cálculo dos créditos do PIS e da COFINS. 9 - As empresas tributadas pelo regime da Lei n.º 9.718 /98 têm como fato gerador e base de cálculo do PIS e COFINS seu faturamento, entendido na qualidade de espécie de receita, cuja ordem é operacional. Já as empresas tributadas pelo regime das Leis n.ºs 10.637 /02 e 10.833 /03 (regime não-cumulativo) têm como fato gerador e base de cálculo a totalidade de suas receitas e não apenas aquelas consideradas “faturamento”; independentemente de constar no texto destas normas que o fato gerador “é o faturamento mensal” e a base de cálculo “é o valor do faturamento”, a definição apresentada para faturamento (o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendida a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela empresa) é incontestavelmente a do gênero “receita”, que é absolutamente compatível com a EC n.º 20 /98. 10 - Em momento algum, as normas constitucionais ou infraconstitucionais relativas ao PIS e à COFINS determinam que, na incidência tributária, sejam descontados o cálculo dos créditos de PIS e COFINS sobre o valor do bem. Reforça-se, como acima mencionado, que a incidência tributária se dá sobre “receita”, tratando-se de opção do legislador estabelecer a possibilidade de aproveitamento dos créditos, inclusive no tocante ao pagamento de tributos. Nesse sentido, a Medida Provisória não apresenta ofensa ao art. 110 do Código Tributário Nacional , justamente porque não alterou “a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal , pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias”. 11 - Além do mais, a título tão somente de argumentação, acaso este órgão colegiado entendesse ferida qualquer das disposições constitucionais sobre o tema, imperativa a suspensão do processo, com a sua consequente remessa ao Órgão Especial, competente para a análise de hipotéticas arguições de inconstitucionalidade conforme dispõe o art. 97 da CF/88 (cláusula de reserva de plenário). 12 - De se notar que não se está aqui a fazer qualquer “paralelismo” com o julgamento do Recurso Extraordinário n.º 574.706/PR , com reconhecimento de repercussão geral (tema n.º 69), no qual o e. STF firmou tese no sentido de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins” (j. 15.03.2017), porquanto, de fato, este nada refere acerca da apuração dos créditos de tais contribuições. Apenas se reconhece a higidez da norma que previu a exclusão do ICMS na apuração dos créditos de PIS e COFINS, o que se mostra suficiente para demonstrar que a agravante não faz jus ao aproveitamento de créditos na forma aqui vindicada, não restando demonstrada a probabilidade do direito. Tampouco se revela o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, haja vista que o recolhimento tributário ao qual se encontra obrigada (ainda que sem o aproveitamento de créditos do PIS e COFINS) não obsta o exercício regular de suas atividades, bem como porque, em caso de procedência de seu pedido, a parte poderá repetir o indébito. 13 – Agravo de instrumento. desprovido.