Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível Recurso nº XXXXX-72.2021.8.05.0001 Processo nº XXXXX-72.2021.8.05.0001 Recorrente (s): WRJ LOG CREONICE LOPES DE ABREU TRANSPORTES Recorrido (s): RAFAEL JACOB CENOGRAFIA E STANDS EIRELLI EMENTA RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. CONTRATO DE TRANSPORTE E ENTREGA DE MERCADORIA. MATERIAL NÃO ENTREGUE. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. ALEGAÇÃO DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO, EM RAZÃO DA ENCOMENDA DESPACHADA TER SIDO EXTRAVIADA. PROVA DO FORNECIMENTO EM DESACORDO COM OS TERMOS DA OFERTA, EVIDENCIANDO A MÁ-PRESTAÇÃO DO SERVIÇO CONTRATADO. ILICITUDE CONFIGURADA. MANUTENÇÃO, NOS SEUS PRÓPRIOS TERMOS, DA SENTENÇA QUE CONDENOU A PARTE RÉ AO RESSARCIMENTO DOS DANOS MATERIAIS. DANO MATERIAL COMPROVADO. SENTENÇA MANTIDA INTEGRALMENTE, PELOS SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Dispensado o relatório, nos termos do artigo 46 da Lei Federal 9.099 /1995. A parte recorrente se insurge contra a sentença de origem, que teve como parte dispositiva (sic): Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, nos termos da sentença, para condenar a parte ré ao pagamento do valor de R$ 12.760,00 a título de reparação material, incidindo juros a contar da citação e correção do efetivo prejuízo (data do extravio). Julgo improcedente o pedido de indenização por dano moral por falta de suporte jurídico. Para tanto, afirma a ausência de comprovação do dano material pretendido pela parte autora. Afirma, ainda, não ter agido de forma a ocasionar danos à demandante. Pugnou, ao final, pela improcedência da demanda. Já a parte autora defende a ilicitude da falha no fornecimento do serviço de transporte das mercadorias, em razão da encomenda despachada ter sido extraviada e, portanto, jamais entregue ao destino. Por fim, reforça que tentou, junto à parte acionada, a resolução administrativa da lide, sem que houvesse qualquer manifestação de interesse na resolução de seu problema. Pugnou pela manutenção da decisão. Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma. VOTO A sentença recorrida, tendo analisado corretamente os aspectos fundamentais do litígio, merece confirmação integral, não carecendo, assim, de qualquer reparo ou complemento dentro dos limites traçados pelas razões recursais, culminando o julgamento do recurso com a aplicação da regra inserta na parte final do art. 46 da Lei Federal 9.099 /1995, que exclui a necessidade de emissão de novo conteúdo decisório para a solução da lide, ante a integração dos próprios e jurídicos fundamentos da sentença guerreada. A título de ilustração apenas, e para realçar o feliz desfecho encontrado para a contenda no primeiro grau, alonga-se na fundamentação do julgamento, nos seguintes termos. Nos termos da Constituição Federal , ¿a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social¿, observado, dentre outros princípios eleitos pelo legislador constituinte, a defesa do consumidor (art. 170, V). A Carta Magna também ordena que a lei deve reprimir ¿o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros¿ (art. 173, § 4º). Por outro lado, como norma de ordem pública constitucional, o Código de Defesa do Consumidor foi promulgado com o objetivo precípuo de restabelecer o equilíbrio de direitos e deveres entre o consumidor e o fornecedor nas relações de consumo, pautado nos princípios da boa fé e lealdade. Como direitos básicos do consumidor, o art. 6º , do CDC estabelece ¿a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços¿ (IV); e ¿a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas¿ (V). Também o Código Civil consagra os princípios da probidade e boa-fé não só na conclusão, como também, na execução do contrato (art. 422), impondo, ainda, balizas à liberdade de contratar, a qual será ¿exercida em razão e nos limites da função social do contrato¿ (art. 421). Por fim, o CDC , em seu art. 22 , estabelece que as empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Assim, por força das normas constitucionais citadas e das infraconstitucionais ínsitas no Código de Defesa do Consumidor , bem como por imperativo do próprio Código Civil , ao juiz é permitido atenuar o princípio da força obrigatória do pacto (pacta sunt servanda), subjugando-o pela necessidade de restabelecer o equilíbrio entre as partes quando houver onerosidade excessiva decorrente ou não de fatos supervenientes e, não necessariamente imprevisíveis (rebus sic stantibus), podendo, assim, promover a exclusão das cláusulas e condições que estabeleçam prestações desproporcionais, bem como a revisão das que forem excessivamente onerosas ao consumidor, reconhecendo a abusividade (art. 51 , IV , do CDC ), privilegiando a interpretação que lhe seja mais favorável (art. 47 , CDC ). Igualmente não se deve esquecer, que o art. 6º , da Lei Federal 9.099 /1995, autoriza ao juiz adotar ¿em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum¿. Com isso, munidos desses instrumentos, o julgador tem autorização para promover a readequação de encargos contratuais, quando constatada a violação de quaisquer regras e princípios consagrados pelo legislador. No entanto, as discussões da espécie não podem ficar somente em termos abstratos, sem se ater ao contrato em julgamento. Assim, concentrando-se no contrato firmado entre as partes, investigando-os à luz dos sistemas de proteção ao consumidor aqui lembrados, não restam dúvidas de que, uma vez constatada a conduta lesiva e definida objetivamente pelo julgador, pela experiência comum, a repercussão negativa na esfera do lesado, surge à obrigação de reparar o dano moral. A acionada acabou por afrontar o quanto disposto nos artigos 14 , § 1º , I , e 20 , ambos do CDC . Não há dúvidas que, na hipótese dos autos, o serviço prestado mostrou-se defeituoso, não fornecendo ao consumidor a segurança que dele esperava, mostrando-se ainda mais relevante a inadequação do modo de fornecimento no qual o serviço se deu. Considerando ainda que padeceu a fornecedora de serviços para com a cautela e para com a obrigação anexa decorrente das cláusulas gerais, dentre as quais tem-se que ao fornecedor impõe-se a obrigação de cuidado com o consumidor e o seu patrimônio. Ao fornecedor cabe provar não somente a qualidade dos serviços prestados e dos produtos inseridos no mercado de consumo, mas também que todas as informações a respeito do negócio foram devidamente prestadas ao consumidor no momento da avença, redigindo as cláusulas e condições contratuais de forma a facilitar a compreensão dos sentidos e alcances, dando destaque àquelas que implicarem em limitação de direito (art. 54 , § 4º , do CDC ), ficando o consumidor desobrigado do cumprimento de qualquer disposição que não tenha sido levado ao seu conhecimento, no momento da contratação, de forma clara e induvidosa, nos termos do art. 46 , do CDC . Vale lembrar, ainda, que, discutindo-se a prestação defeituosa de serviço incide a responsabilidade civil objetiva inerente ao próprio risco da atividade econômica, consagrada no art. 14 , caput, do CDC , que impõe também ao fornecedor o ônus de provar causa legal excludente (§ 3º do art. 14), algo que a parte ré não se desincumbiu, já que não fez qualquer prova de suas alegações, deixando de trazer elementos de convicção suficientes de que a oferta contratada poderia sofrer esta alteração substancial, capaz de impossibilitar o uso, se o consumidor se negar a arcar com os custos extras a ele impostos, o que exclui a possibilidade de prevalência das cláusulas e condições informadas pela parte ré. Com isso, a míngua de prova contrária, a cargo da parte ré, deve ser aceita a versão da parte autora de descumprimento da oferta contratada entre as partes. Assim, nas circunstâncias apuradas, inexistindo prova de que a contratação não se deu nos termos compreendidos pela Ré, configura-se como abusiva a conduta adotada pelo fornecedor da relação jurídica de consumo contravertida nesta demanda, o que causou ao consumidor-aderente inafastáveis danos, devidamente comprovados, impondo-se à devida compensação pecuniária, conforme bem concluiu o Juízo a quo. Nestes termos, no mérito recursal, a hipótese é de manutenção da sentença impugnada, nos seus próprios termos, e por seus próprios fundamentos. Isto porque, da análise das provas produzidas, verifica-se que a parte autora demonstrou a verossimilhança de suas alegações (que houve o descumprimento ilegítimo da oferta contratada entre as partes, tendo em vista ilicitude da falha no fornecimento do serviço de transporte de cargas, em razão da encomenda despachada ter sido extraviada, causando-lhe prejuízos devidamente respaldados e contabilizados a partir dos fatos e provas processuais, e violando o princípio de proteção da confiança, tendo a parte ré se negado a reparar administrativamente a ilicitude, forçando-a à demanda judicial. Nesse sentido, deve ser ressarcida a parte Autora do valor total desembolsado em face dos fatos narrados, o que representa R$ 12.760,00, conforme a vasta documentação trazida aos autos já no evento processual . Por isso, voto por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso, para MANTER a sentença impugnada, por seus próprios fundamentos, e nos seus próprios termos. À parte recorrente, integralmente vencida, impõe-se a condenação ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 20% (vinte por cento) do valor pecuniário imposto à CONDENAÇÃO, atentando, especialmente, para a natureza, a importância econômica da ação, e o trabalho da profissional que defendeu os interesses da parte recorrida. Salvador, Sala das Sessões, de 2022. ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA Juíza Relatora [1] Art. 46. O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão. ACÓRDÃO Realizado o Julgamento pela 5ª TURMA RECURSAL, composta dos Juízes de Direito decidiu, à unanimidade de votos, por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso, para MANTER a sentença impugnada, por seus próprios fundamentos, e nos seus próprios termos. À parte recorrente, integralmente vencida, impõe-se a condenação ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em 20% (vinte por cento) do valor pecuniário imposto à CONDENAÇÃO, atentando, especialmente, para a natureza, a importância econômica da ação, e o trabalho da profissional que defendeu os interesses da parte recorrida. Salvador, Sala das Sessões, de 2022. ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA Juíza Relatora