DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO C/C INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ART. 121 , § 2º , I , III E IV , DO CP C/C ART. 2º , § 3º , DA LEI N. 12.850 /13. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. PLEITO DE NULIDADE DO JULGAMENTO EM RAZÃO DE DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA A PROVA DOS AUTOS POR NÃO TER SIDO RECONHECIDA A PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA E EM RAZÃO DA CONDENAÇÃO PELO CRIME CONEXO. NÃO ACOLHIMENTO. EXAME DOS AUTOS QUE DEMONSTRAM COEXISTIREM DUAS TESES, UMA DA ACUSAÇÃO E UMA DA DEFESA. EXISTÊNCIA DE PROVAS CAPAZES DE INTERFERIR NO CONVENCIMENTO DOS JURADOS. DECISÃO DE ACORDO COM O LIVRE CONVENCIMENTO DO CORPO DE JURADOS. MERA OPÇÃO POR UMA DAS TESES APRESENTADAS. SOBERANIA DOS VEREDICTOS DO TRIBUNAL DO JÚRI. DECISÃO DOS JURADOS MANTIDA. PLEITO DE REEXAME DA DOSIMETRIA PARA SE ADEQUAR O QUANTUM DE EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. ACOLHIMENTO. AJUSTE NO CÁLCULO PENAL FINAL REDUZIDA. REGIME PRISIONAL MANTIDO NO FECHADO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA NO CAPÍTULO DOSIMÉTRICO. 1. Cuida-se de recurso de apelação interposto pela defesa do acusado em face da sentença exarada pelo MM Juízo 5ª Vara do Júri da comarca de Fortaleza/CE, que, após deliberação do Tribunal do Júri, condenou o réu nas tenazes do art. 121, § 2º, incisos I, III e IV do CPB e art. 2º da Lei nº 12.850/03, com a imposição de pena privativa de liberdade fixada, após somatório do concurso material, em 23 (vinte e três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, em regime inicial fechado, além do pagamento de 11,66 (onze virgula sessenta e seis) dias-multa. Ao final, foi negado ao réu o direito de recorrer em liberdade. 2. Adentrando no mérito recursal, observa-se que o apelante pugnou, como tese principal, pela nulidade do julgamento em razão de decisão manifestamente contrária a prova dos autos, argumentando que a conduta imputada ao acusado seria de menor importância na empreitada delituosa, não havendo justificativas para que os jurados não reconhecessem tal minorante, bem como que não haveriam provas que justificassem a condenação pelo delito de integrar organização criminosa, notadamente por não terem sido identificadas 4 ou mais pessoas que integrariam essa suposta associação criminosa. 3. Após compulsar os autos, percebe-se que, ao contrário do alegado pelo recorrente, a decisão proferida pelo Conselho de Sentença não se mostra em total desacordo com o conjunto probatório, alicerçando-se, na verdade, em alguns elementos fáticos registrados nos autos, especialmente a filmagem das imediações do local do crime (mídia à pág. 305/306 e relatório técnico às págs. 62/69) e os relatos dos policiais civis responsáveis pela investigação do delito. 4. Na verdade, a prova colacionada revela que foram apresentadas duas versões do acontecimento, uma pela defesa, que pugnou, entre outros pedidos, pelo reconhecimento da participação de menor importância no delito de homicídio e pela absolvição quanto ao delito de integrar organização criminosa, e outra pela acusação, concernente na condenação do réu. O Tribunal do Júri, quando do julgamento, após exposição de ambas as teses no tablado das discussões e análise das provas produzidas na instrução processual, optou pela versão dos fatos apresentada pela acusação, reconhecendo que a conduta do acusado fora relevante para possibilitar o sucesso da empreitada criminosa e que haviam elementos suficientes para condená-lo pelo delito de integrar organização criminosa, não podendo ter sua soberania ferida em decorrência disso. 5. Sufragar o recurso interposto, admitindo que o Tribunal de toga, com base em provas carreadas aos autos, substitua-se ao Tribunal do Júri, quando se está diante de existência de carga probatória que lhe dá suporte, seria uma afronta esférica ao postulado constitucional da soberania dos veredictos daquele tribunal popular. Inclusive, sobre o tema a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça está consolidada na Súmula nº 06 , segundo a qual ¿as decisões dos jurados, em face do princípio constitucional de sua soberania, somente serão anuladas quando inteiramente contrárias à prova dos autos¿, o que não se observa no presente caso. 6. Além disso, as Cortes Superiores tem entendimento consolidado que "decisão manifestamente contrária à prova dos autos é aquela que não encontra amparo nas provas produzidas, destoando, de maneira inequívoca e inquestionável, de todo o acervo probatório. A tese acolhida pelo Conselho de Sentença há de ser integralmente incompatível com as provas e totalmente divorciada da realidade que exsurge dos autos, não se podendo admitir a reforma quando, a juízo do Tribunal, os jurados tiverem decidido mal". Nesse contexto, existindo provas que sustentem as teses acolhidas pelos jurados entremostra-se impossível a anulação do julgamento, em homenagem ao princípio da soberania dos vereditos. 7. Avançando no mérito recursal, observa-se que o apelante, como tese subsidiária, pugnou pela reforma da dosimetria da pena no que se refere ao quantum adotado na primeira fase do cálculo para incrementar a pena-base. Nesse aspecto, assiste razão ao recorrente, considerando que, reexaminado o cálculo, constatou-se que, de fato fora utilizada uma fração de exasperação diversa da sugerida pela doutrina e jurisprudência, de forma mais gravosa ao réu, sem qualquer justificativa para tanto, revelando, assim, uma desproporcionalidade na individualização da sua pena. 8. Assim sendo, mantendo a valoração negativa do vetor 'culpabilidade', mas readequando o quantum de exasperação por esta circunstância judicial, fica reduzida a pena-base do delito de homicídio qualificado. De ofício, constatou-se, também, um pequeno equívoco na fixação da pena de multa, levando em conta que, nos termos do art. 11 do Código Penal , as frações de reis devem ser desprezadas do cálculo. Na sequência, mantendo as demais considerações realizadas no cálculo penalógico, mas mediante os ajustes aqui realizados, fica a pena final definitiva do acusado fixada em 22 (vinte e dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, além do pagamento de 11 (onze) dias-multa. 9. Fica mantido o regime inicial fechado, ante o quantum da pena concreta, nos termos do art. 33 , § 2º , alínea 'a', do Código Penal . Mantida também a segregação cautelar imposta ao acusado, considerando que, além da gravidade concreta da conduta, a prisão preventiva se mostra necessária para interromper a cadeia de comando da organização criminosa e para se evitar a reiteração delitiva, considerando que o réu ostenta outras ações penais em andamento, justificando, portanto, a manutenção da cautelar máxima neste momento. 10. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada tão somente no capítulo dosimétrico. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os integrantes da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer do recurso apelatório interposto, para dar-lhe parcial provimento, reformando a sentença tão somente no capítulo dosimétrico, nos termos do voto desta Relatoria. Fortaleza/CE, 28 de maio de 2024 MARLÚCIA DE ARAÚJO BEZERRA Relatora