PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE PERNAMBUCO Gabinete do Desembargador Eudes dos Prazeres França Rua Dr. Moacir Baracho , Nº 207, 7º andar, Santo Antônio, Recife/PE, CEP: 50.010240 Fone: (81) 3181-0902 – e-mail: gabdes.eudes.pfranca@tjpe.jus.br TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO Nº XXXXX-78.2022.8.17.4001 COMARCA DE ORIGEM: 18ª VARA CRIMINAL DA CAPITAL JUIZ SENTENCIANTE: BLANCHE MAYMONE PONTES MATOS APELANTE: CRISÓSTENES DE SOUZA ALVES APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO RELATOR: DES. EUDES DOS PRAZERES FRANÇA PROCURADORA DE JUSTIÇA: SINEIDE MARIA DE BARROS SILVA CANUTO PENAL . E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS (ARTS. 33 , CAPUT, DA LEI 11.343 /2006) E RECEPTAÇÃO (ART. 180 DO CÓDIGO PENAL ). PRELIMINARES. ATUAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR. ALEGAÇÃO DE INVASÃO DE DOMICÍLIO. ENTREGA DE DROGAS. DENÚNCIA ANÔNIMA. CAMPANA. FLAGRANTE PERMANENTE. JUSTA CAUSA. INVASÃO DE DOMICÍLIO NÃO CONFIGURADA. NULIDADE EM DECORRÊNCIA DA INVERSÃO DA ORDEM DAS OITIVAS EM AUDIÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. NULIDADE DA SENTENÇA POR DESRESPEITO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PRELIMINARES REJEITADAS. MÉRITO. DOSIMETRIA DA PENA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. DECOTES DAS VETORIAIS. PENAS-BASES REDUZIDAS E ARBITRADAS NO MÍNIMO LEGAL. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA SEMIABERTO. DETRAÇÃO. JUÍZO DA EXECUÇÃO. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO A CRITÉRIO DO JUÍZO DA EXECUÇÃO (INTELIGÊNCIA DO ART. 804 DO CPP ). 1. No crime de tráfico ilícito de entorpecentes embora se trate de crime permanente, cujo estado de flagrância também é permanente a entrada em domicílio exige a presença de fundadas razões. Consoante orientação que se mantém firme no âmbito do STF, as fundadas razões devem ser justificadas posteriormente pela autoridade, sob pena de responsabilização civil, penal e administrativa. Nesse sentido, o STF: “A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas ‘a posteriori’, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados” (STF. Plenário. RE XXXXX/RO , Rel. Min. Gilmar Mendes , julgado em 4 e 5/11/2015 - Repercussão Geral – Tema 280 - Info 806). No caso, se a investigação policial foi originada de informações obtidas por inteligência policial e mediante diligências prévias (campana), especialmente em flagrante, redundando em acesso à residência do acusado, tal procedimento configura “exercício regular da atividade investigativa promovida pelas autoridades policiais, não podendo ser considerada hipótese de ofensa a comando constitucional” (cf. AgRg no HC 734.423-GO , Rel. Min. João Otávio de Noronha , Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 24/05/2022, DJe 26/05/2022). 2. A nulidade apontada na instrução, pela inversão do interrogatório do réu, exige, para seu reconhecimento, que seja arguida no momento oportuno. Na espécie, embora na audiência tenha sido anotado o protesto, este se deveu a uma praxe do juízo, que de imediato, ao proceder com a inversão, já afirma que a parte está protestando, porque de costume acontecer. Porém, além dessa peculiaridade, não restou demonstrado, de plano, nas razões do caso sob exame especificamente qualquer prejuízo e tampouco o fez a defesa no instante recursal qualquer prejuízo a justificar a anulação do ato. A jurisprudência do STJ há muito se firmou no sentido de que a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief, consagrado no art. 563 do Código de Processo Penal . Precedentes STJ. 3. De fato, a sentença foi proferida pela Juíza Titular da 18ª Vara Criminal a mesma que conduziu o processo desde o seu nascedouro até decisão final , tendo sido, porém, presidida e realizada a audiência de instrução por juiz substituto. Não se sabe ao certo o motivo da ausência do juízo titular à audiência. A defesa não apresentou qualquer prova de que as exceções de que tratam a norma processual (art. 399 do CPP ) não foram respeitadas. Apenas sugere que não foram. E só. Ora, não é possível apontar, no caso, sem a devida prova, que houve desrespeito ao comando normativo do art. 399 do CPP . Além do mais, como bem leciona a melhor doutrina o dispositivo em voga não pode ser aplicado a ponto de gerar uma total imobilidade do sistema jurídico processual penal. Portanto, o princípio da identidade física do juiz não é absoluto, devendo ser mitigado sempre que a sentença proferida por juiz que não presidiu a instrução criminal seja congruente com as provas produzidas sob o crivo do juiz substituído, hipótese dos autos. Precedentes do STF. 4. A culpabilidade foi maculada com uma simples afirmação: a conduta do réu tem altíssimo grau de reprovação social. Mas essa afirmação, porque isolada, não justifica o acréscimo, eis que não apresenta aspectos que extrapolam aqueles inerentes ao tipo penal. Ou seja, não há revelação de uma reprovação mais acentuada a justificar a mácula da vetorial. 5. Em relação às consequências do crime, disse a juíza que “além das graves consequências penais para a sociedade”, as drogas levam à ruína a vida de vários jovens e suas famílias. É evidente que tais consequências já estão inseridas no tipo penal, motivo pelo qual essa fundamentação não pode tornar desfavorável ao réu a vetorial. 6. Na esteira do entendimento do STJ, é de se afastar a aplicação da causa especial de diminuição de pena, constante no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas , pois, além da elevada quantidade de droga (maconha) apreendida em poder do apelante (aproximadamente 10Kg), foi encontrada ainda balança de precisão em seu apartamento, bem como o réu confessou que não exerce ocupação lícita. Precedente do STJ. 7. Para a configuração do concurso material de crimes exige-se que o agente pratique dois ou mais crimes mediante mais de uma ação ou omissão. É exatamente a hipótese dos presentes autos, em que o apelante, praticando mais de uma ação, cometeu os crimes de receptação e de tráfico de entorpecentes. 8. O § 2º do art. 387 do CPP , após a redação dada pela Lei 12.376/12, dispõe que “o tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”. Todavia, a efetiva contagem do período já cumprido para o fim de progressão de regime somente poderá ser efetuada pelo juízo da VEP, pois que é sua a competência para exame do requisito subjetivo, conforme o disposto no art. 66 , inciso III , alínea c , da Lei de Execucoes Penais . 9. Quanto ao pleito de isenção das custas judiciais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que, mesmo sendo beneficiário da assistência judiciária gratuita, o condenado deve responder pelo pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal , ficando, contudo, seu pagamento sobrestado, enquanto perdurar seu estado de pobreza, pelo prazo de cinco anos, quando então a obrigação estará prescrita, conforme determina o art. 12 da Lei n.º 1.060 /50. 10. Apelação conhecida. Preliminares rejeitadas. Mérito parcialmente provido. Decisão unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do recurso acima referenciado, ACORDAM os Desembargadores da Terceira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, à unanimidade, rejeitar as preliminares, e, no mérito, dar provimento parcial ao recurso, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas, que fazem parte integrante deste julgado. Recife, de de 2024. Des. Eudes dos Prazeres França Relator AC XXXXX-78.2022.8.17.4001 (RC)