PENAL. ESTELIONATO MAJORADO. ART. 171, § 3º, DO CPB. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: ATIPICIDADE DA CONDUTA AFASTADA. DOSIMETRIA DA PENA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Trata-se de apelação interposta pela defesa em face da sentença, que julgou procedente a pretensão punitiva do Estado para condenar o Réu como incurso nas penas do delito constante do art. 171, § 3º, do CPB (estelionato majorado), por, no exercício de sua função de Técnico em Contabilidade, no dia 29/12/2011, ter se utilizado de dados a que possuía acesso para forjar a declaração de rescisão de vínculo laboral do trabalhador F.C.S. e obter, junto à Caixa Econômica Federal, a liberação do saldo da conta vinculada ao FGTS do mencionado trabalhador no valor de R$ 8.825,95. A pena definitiva do Acusado foi fixada em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa, tendo sido fixado como valor do dia-multa 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época do fato, devidamente corrigido, além de ter sido procedida a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, correspondentes a prestação pecuniária no valor de 02 (dois) salários-mínimos e prestação de serviços à comunidade, que deverá ser cumprida à razão de 01 (uma) hora de tarefa por dia de condenação, ambas junto à entidade assistencial ou estabelecimento congênere, a serem indicadas pela Secretaria da Vara. 2. A defesa pede a absolvição do Réu sob o fundamento da atipicidade da conduta, em face da aplicação do princípio da insignificância. 3. O Superior Tribunal de Justiça, na linha de intelecção adotada pelo Supremo Tribunal Federal, tem defendido a aplicação do princípio da insignificância mediante a constatação simultânea dos seguintes vetores: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprobabilidade do comportamento e d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. 4. No caso, a conduta perpetrada pelo Acusado é de relevante ofensividade, já que o delito praticado não se identifica como um indiferente penal, pois as consequências vão além do mero prejuízo financeiro, pois afetam a própria credibilidade dos programas sociais do Governo, além de revelar importante periculosidade social, já que atingiu diretamente as reservas financeiras do trabalhador vitimado, destinadas, em muitas hipóteses, à liberação em momentos de vulnerabilidade econômica. 5. Ademais, é significativo o grau de reprobabilidade do comportamento, haja vista que os atos de fraude eram praticados quando o Acusado se encontrava empregado e não em situação de dificuldade financeira. 6. Não se desconhece a aplicação do princípio da insignificância na jurisprudência e, por conseguinte, o reconhecimento da atipicidade de condutas delituosas, quando os prejuízos econômicos sejam inferiores ao teto de R$ 20.000,00, estabelecido na Portaria MF nº 75, de 22 de março de 2012, da Fazenda Nacional, a qual, nessas situações, autoriza o não ajuizamento de execuções fiscais. Nessas hipóteses, o princípio em referência é analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal, excluindo-se ou afastando-se a tipicidade penal, observada a presença de certos fatores, como aqueles reconhecidos pelo Superior Tribunal de Justiça. Contudo, não há de se falar, no caso, em inexpressividade da lesão jurídica provocada, porque, embora o prejuízo econômico não tenha sido tão elevado apurado em R$ 8.825,95 , a lesão jurídica vai além deste, vez que abrange a ofensa à fé pública (evidenciada pela inserção de informações falsas, pelo Réu, no sistema da Caixa Econômica Federal e pelo forjamento do Termo de Rescisão Contratual do empregado F. C. S.) e a credibilidade dos programas sociais do Governo. 7. A conduta delituosa do Réu ocorreu inúmeras vezes, sob o mesmo modus operandi. O Acusado responde, além do presente processo, a 5 (cinco) inquéritos policiais pelo mesmo delito ora apurado nestes autos e, ainda, ao processo nº XXXXX-07.2018.4.01.3500, cuja sentença condenatória anexada revela que naqueles autos o prejuízo econômico foi da ordem de R$ 29.922,77. 8. Ausência dos balizadores exigidos para a aplicação do princípio da insignificância, sendo a dosimetria mantida, ante a inexistência de qualquer irregularidade nos critérios adotados. 9. Apelação desprovida.