JUIZADO ESPECIAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO. AQUISIÇÃO DE BILHETE POR INTERMEDIAÇÃO DE AGÊNCIA DE VIAGEM. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEITADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Acórdão lavrado de acordo com a disposição inserta nos artigos 2º e 46 , da Lei 9.099 , de 26.09.1995 e artigo 103, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno das Turmas Recursais. Presentes os pressupostos específicos, conheço do recurso. 2. Recurso interposto pelas rés, ora recorrentes em face da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para: ? declarar rescindido o contrato entabulado entre as partes e condenar as requeridas CVC BRASIL OPERADORA E AGÊNCIA DE VIAGENS e AM VILA NOVA AGÊNCIA DE VIAGENS E TURISMO, de forma solidária, a restituírem à parte autora o valor de 1.905,96 (mil, novecentos e cinco reais e noventa e seis centavos), referente a diferença entre o valor efetivamente pago pelas passagens aéreas e o valor do crédito disponibilizado pela requerida TAM LINHAS AÉREAS, a ser efetivado no prazo de 12 (doze) meses a contar da data do voo cancelado, em 22/11/2020, observada a atualização monetária calculada com base no INPC, nos exatos termos do artigo 3º da Lei 14.034 /20. Sobre a quantia deverão incidir juros de mora de um por cento ao mês a contar da citação e correção monetária calculada com base no INPC a contar da data do desembolso, 30/08/2020 (Id XXXXX). Condeno, ainda, as requeridas CVC BRASIL OPERADORA E AGÊNCIA DE VIAGENS e AM VILA NOVA AGÊNCIA DE VIAGENS E TURISMO, de forma solidária, a pagarem ao autor o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização por danos morais, acrescido de juros de mora de um por cento ao mês e correção monetária calculada com base no INPC, a contar da data da publicação da sentença. 3. As recorridas alegam que o Juízo a quo homologou acordo entre o recorrido e a primeira ré, LATAM, no qual a primeira ré disponibilizará ao recorrido, Travel Voucher no valor total de R$ 3.800,00, ID XXXXX. Porém, o presente feito continuou em relação às recorrentes. Alegam também a ilegitimidade passiva, pois, houve a compra das passagens aéreas, e, todo imbróglio ocorreu em função da ausência de resposta da LATAM, uma vez que esta é a responsável pela liberação do crédito e restituição dos valores. Portanto, somente a Cia. Aérea deve arcar com o pagamento integral da condenação, nos termos do Art. 3º da 14.034/2020. Afirmam que de acordo com a jurisprudência do STJ, as recorrentes não são solidariamente responsáveis por atos praticados pela companhias aéreas quando apenas realiza a intermediação da venda de passagens aéreas - sem a venda de pacotes turísticos. No presente caso é exatamente o mesmo do Agravo de Instrumento no RESP. (STJ, AgRg no Recurso Especial nº 1.453.920 - CE , Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 9.12.2014, v.u.). 4. Esclarecem que o recorrido adquiriu as passagens aéreas por intermédio da SV Viagens Ltda, onde foram prestadas todas as informações, portanto, não pode ser responsabilizada por fatos ocorridos na companhia aérea. As recorrentes são meras intermediadoras de atividades econômicas entre o consumidor e o fornecedor. O STJ entende que a responsabilidade solidária das agências de viagens de turismo somente ocorrerá quando houver defeito no pacote turístico. Não pode ser responsabilizada se atua como simples intermediária na venda de passagens aéreas. Requerem a extinção da dívida em relação às recorrentes. Como a Companhia Aérea, primeira ré, realizou acordo com o recorrido, a ação perdeu seu objeto, pois todos os transtornos foram causados pelo cancelamento, sendo devidamente reparado pela companhia aérea. Requer o recebimento do presente recurso em ambos os efeitos e provido para o fim de reformar a sentença. 5. O recorrido, em contrarrazões, alega que o recurso deverá ser improvido, pois, não demonstrou nenhum erro in procedendo ou in judicando. A condenação de reembolso e dano moral não tem como fundamento o cancelamento do voo em questão, e sim, pela gravíssima falha na prestação de serviços de não remarcação em trecho disponível e/ou de prestar total assistência ao passageiro, conforme afirmado pelas recorrentes. Afirma que a viagem tinha por objetivo desfrutar da lua de mel, sendo que as recorrentes não proporcionaram auxílio e/ou assistência ao recorrido. Não alteraram o trecho da passagem, obrigando ao recorrido a proceder compra de novas passagens aéreas para Argentina, mesmo com direito à crédito, aumentando os gastos no valor de R$ 3.250,00 (três mil, duzentos e cinquenta reais), para não inviabilizar a programação da viagem de lua de mel. Aduz que as recorrentes detinham várias opções de remarcações e demais opções legais, prova disso, que o recorrido conseguiu comprar outros bilhetes e realizar a viagem, demonstrando desídia e incúria para com o recorrido. 6. Afirma que as recorrentes pretendem se desvencilhar de suas obrigações legais, apontam o valor ofertado pela LATAM, R$ 3.800,00 (três mil e oitocentos reais), no entanto o valor efetivamente pago em prol das recorrentes foi de R$ 5.705,96, ou seja, muito superior ao voucher disponibilizado pela companhia. As recorrentes requerem aplicação da quitação, sendo uma inverdade, querendo se beneficiar dos valores menores pagos por liberalidade da primeira ré, não em dinheiro em espécie, e sim em serviços. Requer a manutenção da sentença. 7. No caso, o recorrido adquiriu passagens aéreas BRASILIA/PARIS em 22/11/2020 e PARIS/BRASILIA em 03/12/2020, viagem de lua de mel, mediante intermediação das recorridas, conforme voucher de ID XXXXX, Eis aí sua legitimidade passiva. À luz das jurisprudências referenciadas, resta evidenciado que o exame das condições da ação se dá com abstração dos fatos demonstrados no processo. Examinados os argumentos e as provas, o provimento é de mérito. Jurisprudência pacífica do STJ ( AgRg no AREsp XXXXX / RJ XXXXX/XXXXX-8. Relator, Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO). A discussão sobre a responsabilidade solidária entre a (s) agência (s) intermediadora (s) e a companhia aérea no descumprimento do contrato é matéria que diz respeito ao mérito. Preliminar rejeitada. 8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem afastado a solidariedade entre a agência de turismo e a companhia aérea quando o negócio se limite à venda de passagem (e não de pacote turístico) e o dano decorra de ato exclusivo da transportadora, como no caso de atraso ou cancelamento de voo ( AgRg no REsp XXXXX/CE , Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª Turma, julgado em 09/12/2014). Tal entendimento decorre do fato de o atraso de voo se dever a ato exclusivo da companhia aérea, para o qual o serviço da agência não concorreu de qualquer maneira. 9. No presente caso, tendo em vista a companhia aérea ter realizado acordo com o recorrido, foi extinto o processo em relação a LATAM, portanto, foi dado baixa à primeira ré. Todavia, o prejuízo financeiro do recorrido foi mais elevado que o valor que foi obtido no acordo, o que legitima a continuidade do feito em relação às recorrentes. 10. Entendo que a hipótese não se trata de atraso ou de defeito atribuível exclusivamente à companhia aérea, mas de contrato celebrado com as recorridas, cujo cumprimento não se viabilizou em razão da pandemia, de modo a implicar na resolução do contrato que originou as obrigações, contrato este originalmente firmado com as recorridas/agências. A resolução do contrato, importa, pois, em repercussão na órbita dos interesses jurídicos das recorridas/agências, de onde exsurge a pretensão de obter a alteração do contrato ou a sua extinção, conforme disciplinado na Lei n. 14.034 /2020. 11. Chama a atenção o fato de as próprias recorridas terem reconhecido o direito do recorrente ao reembolso, embora o façam na forma da Lei. O recorrido pretendia viajar em lua de mel, e para não frustrar o ocorrido, e pelo fato de não conseguir alterar o voo, ou destino, adquiriu novas passagens aéreas para Buenos Aires - Argentina. Para encontrar uma alternativa, o recorrido não foi assessorado, nem socorrido pelas recorrentes. 12. A teoria do risco do negócio ou da atividade é a base da responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor , visando a proteção da parte mais frágil da relação jurídica, no caso, o consumidor, não podendo o Poder Judiciário abster-se da aplicação da lei no caso concreto, sob pena de violação de direitos primordiais. 13. A controvérsia em questão não se adequa ao julgado do Superior Tribunal de Justiça/STJ, o recorrido expõe falhas na prestação do serviço de intermediação na aquisição das passagens aéreas, portanto, responsabiliza as recorrentes pelos danos sofridos. 14. A Lei 14.034 /2020 preconiza que o consumidor terá o direito ao reembolso da passagem aérea; concessão de crédito de valor maior ou igual ao da passagem aérea, ou, ainda, ser oferecido ao consumidor as opções de reacomodação em outro voo, próprio ou de terceiro e remarcação da passagem aérea. No caso, o recorrido, não conseguiu nenhuma das opções, precisou adquirir novas passagens aéreas. 15. As recorrentes não deram causa ao cancelamento do voo, mas não prestaram assistência ao consumidor, ora recorrido, pois, ele não conseguiu alterar o voo, mesmo com crédito disponibilizado. 16. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. 17. Condeno as recorrentes vencidas ao pagamento dos honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do Art. 55 da Lei 9.099 /95. A