PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. TEMPO COMUM E ESPECIAL. VÍNCULOS CONSTANTES NA CTPS NÃO IMPUGNADOS. RUÍDO E HIDROCARBONETOS. AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO DA COMPOSIÇÃO DOS ÓLEOS MINERAIS. RISCO CARCINOGÊNICO RECONHECIDO. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO MISERO. EPI EFICAZ. IRRELEVÂNCIA. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO DO INSS NÃO PROVIDOS. 1- Trata-se de reexame necessário e de apelação interposta pelo INSS em face da sentença de fls. 269/287 (autos eletrônicos baixados em sua integralidade e de forma crescente) que concedeu parcialmente a segurança para reconhecer, como tempo comum, os períodos de 16/06/1977 a 30/08/1977 e 15/09/1977 a 16/11/1977, bem como, como tempo especial, por exposição aos agentes nocivos ruído e químico, os períodos de 02/02/1978 a 04/09/1978, 22/07/1997 a 14/08/2000, 13/11/2000 a 30/11/2006 e 15/03/2010 a 30/11/2015, determinando, em consequência, a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição ao impetrante desde a DER (08/03/2016). Houve a concessão da liminar na sentença. Em razões de apelação (fls. 299/305), o INSS apresenta alegações genéricas quanto a não comprovação de atividade especial reconhecida na sentença, aduzindo, neste contexto, que a exposição ao ruído se deu em nível inferior ao limite legal, bem como que a mera indicação a óleos, graxas e outros produtos químicos não se mostra possível de caracterizar a atividade como insalubre, uma vez que somente serão considerados agentes caracterizadores de período especial aqueles que possuírem potencial carcinogênico (presença de compostos aromáticos em sua estrutura molecular). 2- Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do reexame necessário e da apelação interposta pelo INSS. 3- Atividade comum. O Juízo sentenciante reconheceu os períodos de 16/06/1977 a 30/08/1977 e 15/09/1977 a 16/11/1977 como tempo comum, uma vez que registrados na CTPS do obreiro e não impugnados pela autarquia previdenciária. De fato, os períodos estão devidamente anotados na CTPS (fls. 51/52) do apelado, comprovando o trabalho exercido na Metalúrgica Gema Comércio e Indústria LTDA, tendo sidos desconsiderados pela autarquia previdenciária sem nenhuma justificativa. Ora, as anotações em CTPS na qual não se aponta defeito formal apto a afastar sua credibilidade goza de presunção relativa de veracidade para comprovação de tempo de contribuição para fins previdenciários, ainda que não presentes no CNIS (Súmula 75 da TNU). 4- Atividade especial. Como já relatado, houve o reconhecimento dos períodos de 02/02/1978 a 04/09/1978, 22/07/1997 a 14/08/2000, 13/11/2000 a 30/11/2006 e 15/03/2010 a 30/11/2015 como tempo especial. O primeiro período (02/02/1978 a 04/09/1978) em razão do agente ruído e os demais pela exposição a agentes químicos (hidrocarbonetos). Ademais, o período de 15/03/2010 a 21/10/2012, além da exposição aos agentes químicos, o juízo sentenciante também entendeu que o impetrante esteve exposto a ruído acima dos limites de tolerância. Na via administrativa, por sua vez, os períodos acima não foram computados como especiais, considerando que: a) a exposição aos níveis de ruído foi abaixo do limite de tolerância; b) a ausência de informação técnica dos agentes químicos (indicando, por exemplo, os tipos de óleos minerais, solventes, poeiras, etc.); e c) ausência de apresentação do Nível de Exposição Normalizado NEN para o ruído no período de 15/03/2010 a 21/10/2012. fls. 120. Pois bem. A legislação aplicável ao caso deve ser aquela vigente à época da realização da atividade. Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal já se posicionou (Ag. Reg. RE XXXXX-0, Rel. Min. Eros Grau, DJ 29.04.2005). Em relação ao agente ruído, conforme previsão do Decreto 53.831 /64, para ser considerada nociva, a atividade deveria estar sujeita a níveis superiores a 80dB. A partir de 06/03/1997, por força do Decreto 2.172 /97, passou a ser considerado o nível de ruído superior a 90dB. A partir de 2003, somente se considera nocivo o ruído superior a 85dB, conforme alteração no Decreto 3.048 /99, trazida pelo Decreto 4.882 /2003. Vale acrescentar que o Superior Tribunal de Justiça analisou a questão, em sede de recurso repetitivo ( RECURSO ESPECIAL Nº 1.398.260 - PR ), afastando a possibilidade de aplicação retroativa da redução efetuada (de 90 para 85 decibéis). Em relação ao período de 02/02/1978 a 04/09/1978, embora o INSS não tenha computado no cálculo do benefício, tenho que a questão é incontroversa, diante do reconhecimento de tal interstício como especial pela decisão administrativa. De todo modo, ademais, o PPP de fls. 35/36 comprova a exposição do impetrante a ruídos de 94 dB (A) no desempenho da atividade de servente e ajudante na empresa Vallourec Tubos do Brasil S.A., superior ao nível 80 decibéis (dB), portanto, suficiente para caracterização da atividade especial. Alem disso, é preciso esclarecer que, para todos os demais vínculos laborados pelo autor e reconhecidos pelo Juízo como especiais, consta nos PPPs colacionados aos autos (fls. 99/102) que o autor, no desempenho da função de mecânico de manutenção, nas empresas Comec Construções Metálicas e Civil Ltda. e Indústria Mecânica Irmão Corgozinho - IMIC, esteve exposto aos agentes químicos óleo lubrificante e graxa (PPP - COMEC) e óleo, graxa, desengraxante e lubrificante (PPP IMIC), fazendo uso de EPI eficaz. Nesse passo, quanto aos químicos (hidrocarbonetos), ressalvado o posicionamento pessoal em sentido contrário, a jurisprudência da TNU fixou entendimento favorável ao reconhecimento da especialidade das atividades que submetam o segurado, de forma habitual e permanente, à exposição a óleos, graxas, derivados de hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, com suporte no o código 1.0.7 do Anexo IV dos Decretos nºs 2.172 /97 e 3.048 /99. Além disso, no anexo 13 da NR-15 do M.T.E, consta, no tópico dedicado aos "hidrocarbonetos e outros compostos de carbono", que a manipulação de óleos minerais caracteriza hipótese de insalubridade de grau máximo. Cabe ainda registrar que, na NR-15, os hidrocarbonetos dispostos no anexo 13 não necessitam de uma aferição quantitativa para fins do reconhecimento da especialidade, diversamente do que ocorre para o agentes aos quais a nocividade se dá por limite de tolerância, previstos nos anexos 11 e 12 da NR15. (Nesse sentido: Processo n. XXXXX-32.2011.4.03.6302 , decidido em 26/06/2018; PEDILEF XXXXX20124047204 , DOU 13/09/2016; PEDILEF n. XXXXX71950018280 DOU 25/05/2012 representativo). Outrossim, em que pese não constar no segundo período quais as especificidades do óleo mineral lubrificante ou da graxa, tais impropriedades no formulário não infirmam a pretensão do autor ao reconhecimento deste período como especial, devendo ser aplicada ao caso, com a ressalva mais uma vez do meu entendimento em sentido contrário, o princípio in dubio pro misero e reconhecido o seu risco carcinogênico, na esteira da jurisprudência desta Câmara a seguir alinhavada, cujos fundamentos passam a integrar o presente voto (Precedente citado: AC XXXXX-64.2012.4.01.3800 , JUIZ FEDERAL GUILHERME BACELAR PATRÍCIO DE ASSIS, TRF1 - 2ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DE MINAS GERAIS, e-DJF1 08/06/2020 PAG). Fixada tal premissa, há de se reconhecer que não há documentação hábil a desconstituir a presunção da nocividade que prevalece em relação a agentes cancerígenos, de modo que a simples menção de o EPI ser eficaz nos formulários não infirma a pretensão do impetrante, ora apelado. Deve-se ressaltar, por fim, que no período de 15/03/2010 a 21/10/2012 também se mostra possível o reconhecimento da atividade como especial pelo ruído excessivo, uma vez que o apelado esteve exposto ao nível de intensidade sonora de 86 dB (A), portanto, acima dos limites de tolerância e, ao contrário do que noticia a decisão administrativa, há expressa menção à técnica utilizada como sendo a da NHO 1 FUNDACENTRO, o que demonstra que foi observado no período o nível de exposição normalizado NEN. Nessa toada, conforme cálculos do juízo de fls. 289/290, convertidos os períodos comuns em especial, o impetrante contava com 40 anos e 23 dias de tempo de contribuição ao tempo da DER, fazendo jus, portanto, à aposentadoria por tempo de contribuição com proveitos integrais. Assim, devem ser mantidos os vínculos reconhecidos pelo juízo a quo e, por conseguinte, mantida a sentença seus pelos próprios fundamentos. 5- Correção monetária e juros moratórios. Para o pagamento das parcelas vencidas desde a impetração, foi determinada na sentença a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que já observa o RE XXXXX/SE (tema 810), sob a sistemática da repercussão geral e com trânsito em julgado em 03/03/2020. 6- Custas e honorários. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º , inciso I , da Lei 9.289 /96. Ainda, diante da expressa vedação legal (art. 25 da Lei 12.016 /09), deixo de fixar honorários advocatícios sucumbenciais 7- Remessa necessária e recurso do INSS não providos.