STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp XXXXX SP XXXX/XXXXX-4
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. FILHA MAIOR E SOLTEIRA. REQUISITOS DA LEI 3.373 /58. ART. 5º, PARÁGRAFO ÚNICO. FILHA SOLTEIRA E NÃO OCUPANTE DE CARGO PÚBLICO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. PRECEDENTES DO STJ. ALEGAÇÃO DE OCORRÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL, FEITA PELO PARQUET, APÓS AS CONTRARRAZÕES DE APELAÇÃO DA UNIÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE ENTENDEU NECESSÁRIA A DILAÇÃO PROBATÓRIA. RECURSO ESPECIAL MINISTERIAL. ALEGADA OFENSA AO ART. 1º , CAPUT, DA LEI 12.016 /2009. CONTROVÉRSIA QUE EXIGE A ANÁLISE DOS FATOS E DAS PROVAS DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7 /STJ. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO. I. Recurso Especial interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/2015 . II. Na origem, trata-se de Mandado de Segurança, impetrado pela ora recorrida, contra o Superintendente de Administração do Ministério da Fazenda em São Paulo (SAMF/SP), bem como contra a União, objetivando a cassação do ato, proferido nos autos do Processo Administrativo 16115.000101/2017-80, que - em razão de alegada ausência de dependência econômica da impetrante, em relação ao seu falecido genitor - cancelara a pensão temporária por ela recebida, em razão do falecimento de seu pai, em 10/04/78, postulando-se o restabelecimento de seu pagamento, eis que presentes as condições mencionadas no art. 5º , parágrafo único , da Lei 3.373 /58. A segurança foi concedida, aos fundamentos de que a impetrante provara os dois requisitos para a concessão do benefício, não se fazendo necessária a comprovação da dependência econômica - o que motivara o cancelamento da pensão -, bem como a existência de decadência para o cancelamento do benefício. Interposta Apelação, pela União, combatendo ambos os fundamentos, após as contrarrazões ao recurso o Ministério Público Federal proferiu parecer pelo provimento da Apelação da União, ao fundamento de que, conforme notícia extraída da internet, a impetrante manteria união estável. O Tribunal de origem manteve a sentença, daí a interposição do Recurso Especial do Ministério Público Federal, à alegação de existência de união estável da impetrante. A União também interpôs Recurso Especial, sob fundamento de ausência de dependência econômica da impetrante, em relação ao seu falecido pai, bem como inocorrência de decadência para o cancelamento do benefício. Seu Recurso Especial foi inadmitido, com fundamento na Súmula 83 /STJ, não tendo a União interposto recurso contra a aludida decisão. III. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, em atenção ao princípio tempus regit actum, ocorrendo o óbito do instituidor da pensão temporária por morte na vigência da Lei 3.373 /58, a filha de qualquer idade possui a condição de beneficiária, e nela permanece, desde que atenda a dois requisitos, quais sejam, ser solteira e não ocupante de cargo público permanente, o que garante a concessão (e mantença) do benefício, independentemente de comprovação de dependência econômica ou da percepção de outro benefício previdenciário. IV. Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar especificamente o acórdão 2.780/2016, do TCU, decidiu que, "reconhecida a qualidade de dependente da filha solteira maior de vinte e um anos em relação ao instituidor da pensão e não se verificando a superação das condições essenciais previstas na Lei n.º 3373 /1958, que embasou a concessão, quais sejam, casamento ou posse em cargo público permanente, a pensão é devida e deve ser mantida, em respeito aos princípios da legalidade, da segurança jurídica e do tempus regit actum" (STF, MS 35.889 AgR/DF, Rel. Ministro EDSON FACHIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 10/06/2019). Em igual sentido: STF, MS 35.414 AgR/DF, Rel. Ministro ALEXANDRE DE MORAES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 05/04/2019. V. Assim, eventual vínculo empregatício privado e/ou recebimento de outro benefício previdenciário não impedem a concessão/manutenção da pensão temporária por morte, desde que atendidos os dois requisitos do art. 5º , parágrafo único , da Lei 3.373 /58. Nesse sentido: STJ, AgInt no REsp XXXXX/RJ , Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 18/12/2020; REsp XXXXX/RJ , Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, DJe de 20/04/2021; AgInt no REsp XXXXX/CE , Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 22/03/2021; AgInt no REsp XXXXX/SC , Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 11/12/2020; AgInt no REsp XXXXX/RJ , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 23/06/2020. VI. Sobre o tema, esta Corte também já proclamou que "o art. 226 , § 3º , da CF/1988 , ao conferir proteção à união estável, visou igualar os direitos entre ela e o casamento, sendo descabido que essa proteção garanta à tal forma de família direitos não previstos para o casamento. Estando os companheiros e os cônjuges em igualdade de condições, não se pode conceder mais direitos ao primeiro do que ao último. Não há como conceber que as pessoas em união estável utilizem a legislação somente em benefício próprio, apenas nos aspectos em que a situação de convivência gere direitos e furtando-se aos seus efeitos quando os exclua. Da mesma forma que há violação ao princípio da isonomia o não reconhecimento de direito à união estável, afronta o referido princípio acatar o direito à pensão às mulheres que estejam nessa composição familiar, mas não às que estejam casadas. Com o reconhecimento da união estável pelo constituinte originário e pelo sistema jurídico pátrio, a jurisprudência tem admitido sua equiparação ao casamento quanto a todos os efeitos jurídicos, pessoais e patrimoniais, e mesmo no que concerne à modificação do estado civil de solteira. (...) No caso em exame não se trata de estabelecer requisito não previsto na legislação de regência para perpetuação de benefício, nem de retroagir nova interpretação para modificar ato jurídico consolidado, mas sim de reconhecer o implemento de condição resolutiva pré-estabelecida já prevista pela Lei 3.373 /1998: a manutenção da condição de solteira. Portanto, descabido o argumento de que existe violação a direito adquirido e inobservância do prazo de cinco anos para a Administração rever os atos de que decorram efeitos favoráveis aos seus destinatários. Na hipótese analisada, uma das condições para a manutenção da pensão concedida com base no art. 5º , parágrafo único, da Lei 3.373 /1998 - que é a continuação da qualidade de solteira - não mais se verifica, porquanto consta dos autos que foi apurado em processo administrativo que a Impetrante contraiu união estável. Portanto, está implementada a condição resolutiva, já que o primeiro requisito essencial à manutenção de benefício da impetrante, qual seja, a qualidade de filha solteira, foi superado" (STJ, RMS XXXXX/RS , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 25/06/2020). VII. No caso dos presentes autos, a motivação do ato administrativo de cancelamento da pensão por morte deu-se apenas por perceber a impetrante rendimentos decorrentes de atividade na iniciativa privada, e não pela falta da condição de solteira, a qual restou por ela reafirmada, quando da impetração, tendo o Tribunal de origem, soberano na análise dos aspectos fáticos, delimitado a controvérsia fática e jurídica, ao anotar, no julgamento dos Declaratórios, opostos pelo Órgão ministerial, que "o argumento trazido pela parte embargante, no sentido de que 'por meio de buscas na internet com o nome da apelada, foi encontrada uma notícia do jornal 'InformACAI' em que Gilberto Martins afirma conviver em regime de união estável com a impetrante, Selma farah Pinheiro, com a qual possui um filho' demandaria dilação probatória, podendo, em tese, até ser desconstituída pela parte contrária, em atenção aos princípios do contraditório e ampla defesa, o que é inadmissível em sede de mandado de segurança". VIII. Pacífico é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de "ser possível a revaloração jurídica dos fatos delimitados nas instâncias inferiores, que não se confunde com reexame de provas vedado pelo Enunciado n. 7/STJ" (STJ, REsp XXXXX/DF , Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, DJe de 11/11/2013). Entretanto, "(...) 'a errônea valoração da prova, a permitir a intervenção desta Corte na questão, é a jurídica, decorrente de equívoco de direito na aplicação de norma ou princípio no campo probatório' ( AgRg no AREsp XXXXX/GO , Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 27/9/2013). No caso, o recorrente nem sequer aponta qual teria sido o erro jurídico na aplicação de norma ou princípio" (STJ, AgRg no AREsp XXXXX/RO , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 25/09/2014). IX. Percebe-se, das razões recursais do Ministério Público Federal, que a sua irresignação não se dirige a erro jurídico que teria sido cometido pelo acórdão recorrido, mas à não consideração da eventual prova por ele trazida, colhida da internet, que, no seu entender, demonstraria a ausência do direito líquido e certo da impetrante. X. Com efeito, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a análise da alegação de contrariedade ao art. 1º da Lei 12.016 /2009 - único dispositivo tido como violado, no Recurso Especial ministerial -, a fim de aferir a existência de direito líquido e certo, necessário à concessão da segurança, demanda exceder os fundamentos colacionados no acórdão guerreado, com a incursão no conteúdo fático-probatório dos autos, o que implica, necessariamente, o reexame de fatos e provas, insuscetível de ser realizado em sede de Recurso Especial, ante o óbice da Súmula 7 /STJ. Nesse sentido: STJ, AgInt no REsp XXXXX/SC , Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 08/10/2018; AgInt no AREsp XXXXX/PI , Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 30/08/2018; REsp XXXXX/RJ , Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 05/12/2019; AREsp XXXXX/PR , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 07/08/2020. XI. Ademais, mesmo que superado o óbice da Súmula 7 /STJ, ressalte-se que a sentença reconheceu igualmente a decadência administrativa para cassar a pensão por morte, percebida pela ora impetrante, o que fora objeto da Apelação da União. Contudo, não aventada a questão da decadência, pelo acórdão recorrido, nem tendo sido objeto de Embargos de Declaração, para suprir a omissão, tal fundamento para a concessão da segurança - suficiente para manter a sentença - não foi objeto de qualquer irresignação, pela parte ora recorrente, nem tampouco a União se insurgiu quanto à inadmissão, com fundamento na Súmula 83 /STJ, de seu Recurso Especial, no qual sustentava a inexistência de dependência econômica da impetrante, em relação ao seu falecido pai, bem como a inocorrência de decadência para o cancelamento da aludida pensão. XII. Recurso Especial não conhecido.