PRELIMINARES. PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO POLICIAL. DISPENSABILIDADE. PRAZO IMPRÓPRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. NULIDADE DA DECISÃO QUE RECEBEU A DENÚNCIA. NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ALTERAÇÃO DA ORDEM DE INTERROGATÓRIO. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. REJEITADAS. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. COLABORAÇÃOPREMIADA. PROVA. ATIPICIDADE. DOLO ESPECIAL. PREJUÍZO. COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL. EXCLUDENTE DE ILICITUDE DO EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO. RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO PARECERISTA. "EMENDATIO LIBELI". DESCLASSIFICAÇÃO PARA FALSIDADE IDEOLÓGICA. CONTINUIDADE DELITIVA. CRITÉRIO DE AUMENTO. PENA PECUNIÁRIA. 1. O Ministério Público, conforme teoria dos poderes implícitos, está autorizado pela Constituição Federal a promover a colheita de determinados elementos de prova. Trata-se de interpretação que compatibiliza o disposto nos artigos 129 e 144 da Constituição Federal , de modo a permitir não apenas a correta e regular apuração dos fatos delituosos, mas também a formação da "opinio delicti". Precedente: RE 593.727 /STF. 2. O inquérito policial não é indispensável para o oferecimento da denúncia, como prescreve o art. 46 , § 1º , do Código de Processo Penal . 3. Não há de se falar em excesso de prazo para o oferecimento da denúncia, pois devidamente observado o disposto no art. 46 , "caput", do Código Penal , que, ademais, se trata de prazo processual impróprio, cuja inobservância caracteriza mera irregularidade, não acarretando nenhuma nulidade. 4. O ato judicial de recebimento da denúncia prescinde de fundamentação detalhada e exaustiva, pois se dedica a impulsionar a ação criminal, cujas deliberações acerca do crime e da autoria delitiva ficam para a fase instrutória, não havendo violação ao art. 93 , inciso IX , da Constituição Federal , tampouco em prejuízo ao exercício da defesa do réu. 5. As nulidades no âmbito processual penal, tanto as relativas quanto as absolutas, somente devem ser reconhecidas quando delas puder resultar em prejuízo para a acusação ou para a defesa, nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal e da reiterada jurisprudência dos Tribunais Pátrios. 6. Não há falar em inépcia da denúncia, pois formulada em obediência ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal , descrevendo perfeitamente o fato típico praticado, com todas as suas circunstâncias, com base nos elementos coletados na fase informativa. A narrativa clara e congruente do fato permitiu perfeita compreensão da imputação e o exercício da ampla defesa. 7. Não há determinação legal quanto à ordem de interrogatório a ser seguida, o que deve ser feito a critério do Juízo. 8. O magistrado "a quo" bem fundamentou a condenação, indicando as razões e os motivos de sua decisão, não havendo falar em ofensa ao artigo 93 , IX , da Constituição Federal , bem como art. 381 , III , do Código de Processo Penal . Com efeito, não há que se confundir a ausência de fundamentação com motivação que não satisfaz o interesse da parte. Enquanto a primeira é matéria preliminar e implica em nulidade da sentença, a segunda constitui matéria de mérito e, caso a insatisfação seja acolhida, implicará a reforma da decisão recorrida. 9. A identidade física do Juiz é prevista no art. 399 , § 2º , do Código de Processo Penal , o qual dispõe que o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença. Contudo, a regra não é absoluta e admite-se excepcionalmente que Magistrado diverso o faça quando aquele estiver impossibilitado de realizar o ato por motivo de afastamento, licenciamento, remoção, convocação para atuação no Tribunal, entre outros. 10. Não há violação ao princípio da correlação ou congruência quando há correspondência entre o fato descrito na denúncia e aquele pelo qual o réu foi condenado. 11. A colaboração premiada, por expressa determinação legal (art. 3º , I , da Lei n. 12.850 /13), éinstrumento de investigação e de prova válido e eficaz que, somado a outros elementos probatórios, poderá ensejar condenação criminal. 12. Questões relativas à credibilidade das delações resolvem-se pela valoração da prova, com análise da qualidade dos depoimentos, considerando, por exemplo, densidade, consistência interna e externa e, principalmente, com a existência ou não de prova de corroboração. Ainda que o colaborador seja criminoso profissional, se as declarações soarem verídicas e forem corroboradas por provas independentes, remanesce o valor probatório do conjunto. 13. Não há falar em absolvição pelo delito previsto no art. 89 da Lei 8.666 /93, pois devidamente comprovadas as autorias e materialidade. 14. O crime previsto no art. 89 da Lei n. 8.666 /1993 exige a presença do dolo específico de causar dano ao erário e da caracterização do efetivo prejuízo. 15. O dolo específico fica demonstrando pelas provas que evidenciam que os réus tinham ciência do esquema destinado à arrecadação de propina, operado nos procedimentos licitatórios, bem como que concorreram para que estes fossem realizados sem a obediência às determinações legais no que se refere à justificativa técnica da escolha do fornecedor ou executante do serviço e no que tange ao preço, como determina o art. 26 , incisos II e III, da Lei n. 8.666 /93. 16. Devidamente comprovado o prejuízo ao erário, na medida em que os procedimentos administrativos foram realizados sem a obediência às determinações legais, sendo as propostas apresentadas pelas empresas vencedoras calçadas pelas demais empresas participantes apenas para conferir uma aparência de legalidade ao procedimento, elaboradas de forma a contemplarem, além dos valores relativos à execução dos contratos, fixados livremente e no interesse dos réus, já acrescidos dos montantes que foram repassados a terceiros como propina. 17. O instituto da coação moral irresistível, previsto no artigo 22 do Código Penal que, pelo conceito tripartite do crime, implica na não caracterização do delito por parte do sujeito ativo direto, ocasionando a punição exclusiva do autor da coação, exige não apenas a demonstração da coação moral, mas que esta seja absolutamente irresistível, insuperável, o que não é o caso dos autos. 18. Os advogados gozam de inviolabilidades por seus atos e manifestações no exercício da profissão, conforme dispõe o art. 133 da Constituição Federal , entretanto, tal inviolabilidade pressupõe o exercício regular e legítimo de sua atividade profissional. 19. Não há falar em inexigibilidade de conduta diversa da advogada que emitiu os pareceres nos procedimentos licitatórios descritos na denúncia, ao argumento de que eram opinativos, pois devidamente comprovado que ela atuava decisivamente no direcionamento dos contratos, buscando conferir uma aparência de legalidade aos procedimentos burlados por meio de seus pareceres, tendo ela plena consciência dos crimes cometidos, sendo, inclusive, a pessoa responsável por elaborar todo o sistema de contratação emergencial. 20. Cabível nessa instância revisora o instituto da "emendatio libelli", previsto no art. 383 do Código de Processo Penal , porquanto o réu se defende dos fatos descritos na denúncia e não da classificação penal inicialmente realizada. Os três réus que inseriram informação falsa em documento particular usado nos crimes do artigo 89 da Lei 8.666 /93, mas que não se beneficiaram com a dispensa irregular de licitação, devem ter suas condutas tipificadas no artigo 299 do Código Penal . 21. A pena de multa do art. 89 da Lei n. 8.666 /93 é de aplicação cogente, porquanto está prevista no preceito secundário do tipo penal. 22. Nos termos da doutrina e da jurisprudência deste egrégio Tribunal, pacificou-se o entendimento de que, em caso de crime continuado ou concurso formal próprio, deve ser adotado o critério da quantidade de crimes cometidos, ficando estabelecidas as seguintes medidas: dois crimes - acréscimo de um sexto (1/6); três delitos - acréscimo de um quinto (1/5); quatro crimes - acréscimo de um quarto (1/4); cinco delitos - acréscimo de um terço (1/3); seis crimes - acréscimo de metade (1/2); sete delitos ou mais - acréscimo de dois terços (2/3). 23. Preliminares rejeitadas. Desprovidos os recursos de Jacira Lemos Barrozo, Carlos Eduardo Bastos Nonô e Carlos José de Oliveira Michiles. Parcialmente providos os recursos de Messias Ribeiro Neto,Francisco Tony Brixi de Souza, Ernesto Calvet de Paiva Carvalho, Alessandro de Queiroz, Maurício Gomes de Lima, Gilberto Batista de Lucena, Luiz Carlos Garcia e Alexander Duarte Paniago. Providos os recursos de Sérgio Henrique de Souza Santos, Alexandre Augusto de Souza e Márcio Gonçalo do Nascimento.