Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 1ª TURMA RECURSAL CÍVEL E CRIMINAL PROCESSO Nº.: XXXXX-04.2018.8.05.0201 RECORRENTE: CLECIA ROSA SANTOS RECORRIDO: JOABE SANTOS DA FONSECA E OUTROS RELATORA: JUÍZA AMANDA PALITOT VILLAR DE MELLO JACOBINA EMENTA RECURSO INOMINADO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. POSSIBILIDADE. RELAÇÃO DE CONSUMO. TEORIA MENOR DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE, QUANDO SE TRATA DE RELAÇÃO DE CONSUMO, DEVE ATENDER AOS REQUISITOS DO ART. 28 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR . O ART. 28 , § 5.º , DO CDC , APLICÁVEL AO CASO, PERMITE A DESCONSIDERAÇÃO, MEDIANTE A TEORIA MENOR, QUANDO COMPROVADO QUALQUER OBSTÁCULO POR PARTE DO DEVEDOR EM SOLVER SUA DÍVIDA, INDEPENDENTEMENTE DAS OUTRAS HIPÓTESES DISPOSTAS NESSE ARTIGO. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. RELATÓRIO Trata-se de recurso inominado interposto pela parte demandante, contra sentença que julgou improcedente o pedido de desconsideração da personalidade jurídica dos réus nos autos principais. Intimadas, as recorridas não apresentaram contrarrazões. VOTO Presentes as condições de admissibilidade, uma vez que o recurso foi interposto dentro do prazo legal, requerida a justiça gratuita, conheço do mesmo. Adentrando na análise do mérito recursal, entendo que o recurso deve ser provido, devendo ser reformada a sentença para autorizar a desconsideração da personalidade jurídica, haja vista flagrante incidência da teoria menor, senão vejamos. A Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica está consagrada no Código Civil : Art. 50. Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874 , de 2019) Assim, aquele artigo admite a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade que se caracteriza pelo ato intencional (Teoria Maior Subjetiva da Desconsideração), ou quando evidenciada a confusão patrimonial e os bens de um se confundem ou escondem no acervo do outro (Teoria Maior Objetiva da Desconsideração). O Código de Defesa do Consumidor , por seu turno, também acolhe a Teoria: Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. § 1º (Vetado). § 2º As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 3º As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 4º As sociedades coligadas só responderão por culpa. § 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. Assim, a técnica do CDC , norma especial, consagra a Teoria Menor da Desconsideração ao admitir que o estado de insolvência e o inadimplemento são suficientes à sua aplicação. Cabe considerar, ainda, que, não obstante se trate de medida drástica, é instrumento da maior relevância para que se cumpram princípios da lealdade e da boa-fé nas relações civis e comerciais, prestigiando a efetividade das decisões judiciais. Acerca da desconsideração da personalidade jurídica orientam precedentes do e. STJ: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FRUSTRADA. PEDIDO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INDEFERIMENTO. FUNDAMENTAÇÃO APOIADA NA INEXISTÊNCIA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 (TEORIA MAIOR). ALEGAÇÃO DE QUE SE TRATAVA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. INCIDÊNCIA DO ART. 28 , § 5º , DO CDC (TEORIA MENOR). OMISSÃO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC RECONHECIDA. 1. É possível, em linha de princípio, em se tratando de vínculo de índole consumerista, a utilização da chamada Teoria Menor da desconsideração da personalidade jurídica, a qual se contenta com o estado de insolvência do fornecedor, somado à má administração da empresa, ou, ainda, com o fato de a personalidade jurídica representar um "obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores" (art. 28 e seu § 5º , do Código de Defesa do Consumidor ). 2. Omitindo-se o Tribunal a quo quanto à tese de incidência do art. 28 , § 5º , do CDC (Teoria Menor), acolhe-se a alegação de ofensa ao art. 535 do CPC . 3. Recurso especial parcialmente conhecido e provido. ( REsp XXXXX/RJ , Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 06/12/2012, DJe 04/02/2013) Portanto, A aplicação da teoria menor da desconsideração às relações de consumo está calcada na exegese autônoma do § 5º do art. 28 , do CDC , porquanto a incidência desse dispositivo não se subordina à demonstração dos requisitos previstos no caput do artigo indicado, mas apenas à prova de causar, a mera existência da pessoa jurídica, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores. O recorrente comprova que foram realizadas todas as tentativas possíveis de constrição de bens móveis pelos sistemas BACENJUD e RENAJUD, além de penhora de bens na sede da empresa demandada. Os sócios da empresa demandada, validamente citados, deixaram de comparecer às audiências designadas nos autos. Todas essas situações são suficientes o bastante para caracterizar os óbices enfrentados pela Recorrente para se ver ressarcida dos prejuízos sofridos em virtude da relação de consumo estabelecida com a empresa QBEX COMPUTADORES LTDA. Assim, Voto pelo PROVIMENTO do recurso para reformar a sentença e determinar que o juízo a quo proceda com a desconsideração da personalidade jurídica da empresa QBEX COMPUTADORES S/A, devendo adotar os atos de constrição necessários para ressarcir os prejuízos causados ao consumidor, primeiramente através do BACEJUND, em face dos sócios/diretores arrolados no ev. 01. Sem condenar no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, com fundamento no art. 55 da Lei nº 9.099 /95, uma vez que não há recorrente vencido. AMANDA PALITOT VILLAR DE MELLO JACOBINA JUÍZA RELATORA