RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CASAMENTO. REGIME DE BENS. MODIFICAÇÃO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA 211 /STJ. CONTROVÉRSIA ACERCA DA INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.639 , § 2º , DO CÓDIGO CIVIL . EXIGÊNCIA DA APRESENTAÇÃO DE RELAÇÃO DISCRIMINADA DOS BENS DOS CÔNJUGES. INCOMPATIBILIDADE COM A HIPÓTESE ESPECÍFICA DOS AUTOS. AUSÊNCIA DE VERIFICAÇÃO DE INDÍCIOS DE PREJUÍZO AOS CONSORTES OU A TERCEIROS. PRESERVAÇÃO DA INTIMIDADE E DA VIDA PRIVADA. 1. Ação distribuída em 21/8/2017. Recurso especial interposto em 21/3/2019. Autos conclusos ao gabinete da Relatora em 21/9/2020. 2. O propósito recursal consiste em verificar se houve negativa de prestação jurisdicional e em definir se a apresentação da relação pormenorizada do acervo patrimonial do casal é requisito essencial para deferimento do pedido de alteração do regime de bens. 3. O acórdão recorrido adotou fundamentação suficiente à solução da controvérsia, não se vislumbrando, nele, qualquer dos vícios elencados no art. 1.022 do CPC/15 . 4. A ausência de debate, pelo Tribunal de origem, sobre as normas contidas nos arts. 141 e 492 do CPC/15 atrai a incidência da Súmula 211 /STJ. 5. De acordo com a jurisprudência consolidada desta Corte Superior, é possível a modificação do regime de bens escolhido pelo casal - autorizada pelo art. 1.639 , § 2º , do CC/02 - ainda que o casamento tenha sido celebrado na vigência do Código Civil anterior , como na espécie. Para tanto, estabelece a norma precitada que ambos os cônjuges devem formular pedido motivado, cujas razões devem ter sua procedência apurada em juízo, resguardados os direitos de terceiros. 6. A melhor interpretação que se pode conferir ao § 2º do art. 1.639 do CC é aquela no sentido de não se exigir dos cônjuges justificativas ou provas exageradas, desconectadas da realidade que emerge dos autos, sobretudo diante do fato de a decisão que concede a modificação do regime de bens operar efeitos ex nunc. Precedente. 7. Isso porque, na sociedade conjugal contemporânea, estruturada de acordo com os ditames assentados na Constituição de 1988 , devem ser observados - seja por particulares, seja pela coletividade, seja pelo Estado - os limites impostos para garantia da dignidade da pessoa humana, dos quais decorrem a proteção da vida privada e da intimidade, sob o risco de, em situações como a que ora se examina, tolher indevidamente a liberdade dos cônjuges no que concerne à faculdade de escolha da melhor forma de condução da vida em comum. 8. Destarte, no particular, considerando a presunção de boa-fé que beneficia os consortes e a proteção dos direitos de terceiros conferida pelo dispositivo legal em questão, bem como que os recorrentes apresentaram justificativa plausível à pretensão de mudança de regime de bens e acostaram aos autos farta documentação (certidões negativas das Justiças Estadual e Federal, certidões negativas de débitos tributários, certidões negativas da Justiça do Trabalho, certidões negativas de débitos trabalhistas, certidões negativas de protesto e certidões negativas de órgãos de proteção ao crédito), revela-se despicienda a juntada da relação pormenorizada de seus bens. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.