EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A HONRA. PENA MÁXIMA. CONCURSO MATERIAL. QUANTUM SUPERIOR A DOIS ANOS. ART. 61 , LEI N. 9.099 /95. INCOMPETÊNCIA. AÇÃO PRIVADA. AUTOR QUE DEU CAUSA À NULIDADE. VEDAÇÃO AO BENEFÍCIO DA PRÓPRIA TORPEZA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O autor, ora apelante ofereceu queixa-crime em desfavor da ré, ora apelada, imputando-lhe a suposta prática dos crimes incursos nas sanções dos artigos 138 , 139 e 140 , todos do Código Penal , decorrentes de imputações criminosas contra a honra do autor em seu perfil do facebook. Na sentença do evento nº 29 o juízo de origem julgou improcedentes os pedidos e absolveu a ré das imputações que lhe foram feitas, por não constituir o fato infração penal. Irresignado o autor interpôs recurso de apelação criminal no evento nº 35 onde bate preliminarmente pela aplicação da causa de aumento de pena, concurso material de crimes e como consequência a incompetência dos juizados especiais criminais. Contrarrazões no evento nº 44. Parecer do MP atuante no 1º grau no evento nº 47 e do MP das Turmas Recursais no evento nº 53 ambos no sentido de dar provimento ao recurso para reconhecer a incompetência do juízo. 2. A criação dos Juizados Especiais concretiza a garantia do acesso à Justiça e permite a materialização da tutela jurisdicional de maneira célere e simples. No aspecto penal, adota, também, medidas despenalizadoras, reduzindo a característica punitiva para crimes considerados de menor potencial ofensivo. 3. A partir das novas diretrizes traçadas pela Lei 10.259 /2001, que estendeu o conceito de infração de menor potencial ofensivo constante da Lei 9.099 /95, tem-se que todos os crimes, com pena máxima não superior a dois anos, ou multa, são da competência do Juizado Especial. 4. Na hipótese dos autos, tratando-se de imputação de mais de um crime cometido em mais de uma ocasião, partindo-se da pena abstrata cominada para calúnia (máximo de 2 anos) e para difamação (máximo de 1 ano), e aplicando-se o concurso material com a soma das penas, alcança-se a pena máxima, para efeito da definição da competência, de 3 anos, o que afastaria a competência dos juizados para o julgamento da demanda. 5. Contudo, tendo em vista que trata-se de ação penal privada, onde o autor na própria exordial pugnou pela condenação da ré em concurso de crimes e, mesmo sabendo do limite fixado, ainda assim optou pela propositura da demanda perante o Juizado Especial Criminal não há como em sede recursal inovar em seus fundamentos com base em nulidade que o próprio deu causa e sob pena de beneficiar pela própria torpeza pela irresignação do julgamento contrário a seus interesses. Nesse sentido o entendimento do STJ: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O NARCOTRÁFICO. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ALEGAÇÃO NO MOMENTO PROCESSUAL OPORTUNO. DESÍDIA DA DEFESA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Após haver sido cientificado da denúncia e instado a oferecer defesa prévia (nos termos do art. 55 da Lei de Drogas ), o agravante constituiu advogado - que, inclusive, compareceu à audiência de instrução e julgamento -, deixando, no entanto, transcorrer in albis o prazo para a manifestação. Sem razão a defesa, portanto, no ponto em que afirma que deveria haver sido determinada a suspensão do feito prevista no art. 366 do CPP , haja vista que esse artigo prevê a suspensão do processo e do prazo prescricional somente quando o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, o que não foi o caso. 2. Eventual nulidade de determinado ato não pode ser arguída por quem lhe deu causa, consoante o disposto no art. 565 do CPP , in verbis: "Nenhuma das partes poderá arguir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse". 3. Na audiência de instrução e julgamento - momento processual oportuno para levar ao conhecimento do Magistrado a ocorrência do suposto vício decorrente da ausência de apresentação de defesa prévia -, o advogado do agravante não alegou a nulidade ora aventada, o que reforça a impossibilidade de se reconhecer a nulidade do feito. 4. O agravante constituiu defensor ainda na fase inquisitiva, conferindo-lhe amplos poderes "para que pudesse atuar em seu favor até a decisão final", a evidenciar que a defesa teve plenas condições de atuar no feito e que os interesses do réu estavam, sim, sendo patrocinados por advogado durante toda a instrução criminal. Portanto, se o acusado deixou de apresentar o rol de testemunhas, o fez por desídia, motivo pelo qual não lhe é dado, agora, pretender se beneficiar de sua própria torpeza. 5. Agravo regimental não provido. (grifei) ( AgRg no HC XXXXX / MG AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS XXXXX/XXXXX-5, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data do Julgamento 12/05/2020). 6. Quanto ao mérito acertada a sentença prolatada na origem ante a ausência de materialidade da conduta, uma vez que as postagens da apelada constituem claro pedido de ajuda jurídica e sem nenhum intuito de caluniar, injuriar ou difamar o autor. Assim, ante a ausência do animus exigido para a configuração dos crimes imputados, merece ser mantida a absolvição da ré, conforme jurisprudência do STJ: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL PRIVADA ORIGINÁRIA. QUEIXA-CRIME. MANIFESTAÇÃO DO QUERELADO EM REDE SOCIAL. ATO PRATICADO NA CONDIÇÃO DE GOVERNADOR. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CRÍTICAS GENÉRICAS AO GOVERNO ANTERIOR, SEM ATRIBUIR EXPRESSAMENTE FATO OU CONDUTA AO QUERELANTE. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. IMPUTAÇÃO DE DIFAMAÇÃO E INJÚRIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. REJEIÇÃO DA QUEIXA-CRIME. 1. Apesar da informalidade das comunicações via redes sociais, a manifestação apontada, em tese, como criminosa, foi proferida durante o exercício do cargo e relacionada às funções desempenhadas pelo querelado, na condição de Governador, atraindo a competência do Superior Tribunal de Justiça. 2. Tem prevalecido nesta Corte o entendimento de que "os delitos contra a honra reclamam, para a configuração penal, o elemento subjetivo consistente no dolo de ofender na modalidade de 'dolo específico', cognominado 'animus injuriandi' ( APn XXXXX/DF , Rel. Ministro LUIZ FUX, CORTE ESPECIAL, julgado em 1º/04/2009, DJe de 14/05/2009). 3. Na espécie, não se constata, no exame do material probatório constante dos autos, o intuito do querelado de injuriar ou difamar o querelante, mas apenas a formulação de críticas genéricas à gestão anterior do Governo do Estado. 4. Não verificado o dolo específico ínsito ao tipo, a conduta não ingressa na órbita penal. Precedentes. 5. Impõe-se a rejeição da queixa-crime, uma vez que o fato narrado, embora verdadeiro, não constitui crime ( CPP , art. 397 , III , c/c Lei 8.038 /90, art. 6º ). ( APn XXXXX/DF , Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/11/2020, DJe 27/11/2020) 7. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. Sentença mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos. 8. Sem custas e honorários advocatícios.