RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRONACIONAL. GESTÃO FRAUDULENTA E EMISSÃO DE TÍTULOS SEM LASTRO. ARTS. 4.º , 7.º , INCISO III, C.C. O ART. 25 DA LEI N.º 7.492 /86.DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OSARESTOS RECORRIDO E PARADIGMA. ARGUIÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA.EXORDIAL ACUSATÓRIA QUE DESCREVE, SATISFATORIAMENTE, A CONDUTA, EMTESE, DELITUOSA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 157 DO CÓDIGO DEPROCESSO PENAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 284 DO SUPREMO TRIBUNALFEDERAL. ART. 7.º , INCISO III , DA LEI N.º 7.492 /86. TIPO PENALCOMPLETO. RESOLUÇÃO N.º 15/1991, da SUSEP. CARÁTER INTERPRETATIVOARTS. 4.º, CAPUT, E 7.º, INCISO III, DA LEI QUE DEFINE OS CRIMESCONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DACONSUNÇÃO. IMPROCEDÊNCIA NO CASO. FIGURAS AUTÔNOMAS. SÚMULA N.º 7 DOSUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ELEVAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMOLEGAL. PEDIDO DE APLICAÇÃO DA CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE REFERENTE ÀCONFISSÃO ESPONTÂNEA. NÃO CONFIGURAÇÃO. COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADEDO CRIME DE GESTÃO FRAUDULENTA. SÚMULA N.º 7 DESTE TRIBUNAL. ARGUIDAINCIDÊNCIA DA CONDUTA TÍPICA PREVISTA NO ART. 5.º , CAPUT, DA LEI N.º 7.492 /86. APROPRIAÇÃO OU DESVIO DE DINHEIRO, TÍTULO, VALOR OU OUTROBEM. SÚMULA N.º 7 DESTE SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECURSOSESPECIAIS DA DEFESA PARCIALMENTE CONHECIDOS E, NESSA EXTENSÃO,PARCIALMENTE PROVIDOS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL NÃOCONHECIDO.Recurso especial de PEDRO GOES MONTEIRO DE OLIVEIRA: 1. Quanto à arguida divergência jurisprudencial acerca dainterpretação 41 do Código de Processo Penal , não há similitudefática entre os julgados. O acórdão recorrido não abarca a tese,rechaçada nos arestos paradigmas, de que é possível a denúnciagenérica nos casos de crimes societários. Ao contrário, o Tribunal aquo entendeu que a denúncia é válida por descrever, de formasuficiente os elementos necessários indicativos da participação doAcusado no evento criminoso. 2. Com relação à suscitada ofensa ao art. 41 do Código de ProcessoPena, já decidiu esta Corte, "Eventual inépcia da denúncia só podeser acolhida quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir acompreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa do acusado,ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP "(RHC XXXXX/SP, 5.ª Turma, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 15/05/2006.) 3. Nos crimes de autoria coletiva, é prescindível a descriçãominuciosa e individualizada da ação de cada acusado, bastando anarrativa das condutas delituosas e da suposta autoria, comelementos suficientes para garantir o direito à ampla defesa e aocontraditório, como verificado na hipótese.4. No caso, a inicial acusatória descreve as condutas delituosas dosacusados, relatando os elementos indispensáveis para a demonstraçãoda existência do crime em tese praticado, bem assim os indíciossuficientes para a deflagração da persecução penal.5. O Recorrente alega negativa de vigência ao art. 157 do Código deProcesso Penal, que não traz disposição acerca da quaestio juris,isto é, nulidade do decisum por falta de análise das teses acercadas provas carreadas aos autos, uma vez que o Recorrente, apesar deocupar cargo de direção, alega não deter poderes de gestão daINTERUNION CAPITALIZAÇÃO S.A.. Como o dispositivo tido por violadonão contém comando normativo capaz de alterar a conclusão a quechegou o Tribunal de origem, incide o óbice contido na Súmula n.º 284 do Pretório Excelso.6. Pela leitura do art. 7º , inciso III , da Lei n.º 7.492 /86extrai-se claramente qual a conduta por ela vedada, consistente ememitir, oferecer ou negociar, de qualquer modo, títulos ou valoresmobiliários, sem lastro ou garantia suficientes. Não é norma penalem branco, pois não há necessidade de que norma complementar venha adefinir o que seja lastro ou garantia, uma vez que tais vocábulostem definição certa, não havendo dúvida na interpretação dos seussignificados.7. A simples inclusão da expressão "nos termos da legislação", noinciso III, não tem o condão de transformá-la em norma penal embranco, mas, na verdade, apenas indica que o intérprete da leipenal, diante da natureza extremamente técnica da matéria, poderá sevaler de outros conceitos normativos para aferir se, no casoconcreto, a emissão dos títulos estaria devidamente lastreada ougarantida.8. A Resolução n.º 15 /1991, da Superintendência de Seguros Privados,na qual há uma seção destinada às provisões técnicas para acobertura dos títulos cambiais, sequer pode ser considerada normacomplementar ao tipo penal mas, funcionando apenas como elementoauxiliar no balizamento e na interpretação dos comandos legais.9. Importante acrescentar que as instâncias ordinárias consideraramamplamente comprovado que o patrimônio da INTERUNION CAPITALIZAÇÃOS.A. não apresentava ativos com capacidade de liquidez, segurança eprontidão, violando as regras técnicas do funcionamento de umainstituição financeira. Por consequência, foram negociados títulossem lastro no sistema financeiro.10. O Tribunal a quo considerou que os crimes dos arts. 4.º, caput,e 7.º, inciso III, da Lei que define os crimes contra o SistemaFinanceiro são autônomos, não havendo que se falar em aplicação doprincípio da consunção à hipótese em comento. Fundamentou-se que odelito relativo à emissão de títulos de capitalização sem lastro nãofoi utilizado como meio necessário ou normal fase de preparação oude execução para o crime de gestão fraudulenta, até porque este foicometido por intermédio de outros atos de administração. Rever aconclusão das instâncias ordinárias, para considerar que se aplica oprincípio da consunção entre as imputações, implicaria vedadoreexame de provas. Incidência do verbete sumular n.º 7 do SuperiorTribunal de Justiça.11. Não poderia a sentença utilizar um mesmo fato, consistente nosprejuízos causados pela conduta delituosa, para considerardesfavoráveis as circunstâncias e as consequências do crime, emindevido bis in idem. Igualmente, era vedado ao Tribunal a quo,valorar negativamente circunstância a culpabilidade, em recursoexclusivo da Defesa, e, em assim procedendo, houve reformatio inpejus.12. Subsiste como negativa apenas a circunstância judicial referenteàs consequências do crime, pois chegaram ao exaurimento, em face doselevadíssimos prejuízos econômicos ao erário e à economia popular,conforme ressaltado pelas instâncias ordinárias.Recurso especial de ARTUR OSÓRIO MARQUES FALK:13. Não há como ser aplicada, na espécie, a atenuante da confissãoespontânea, tendo em vista que o Réu negou a autoria delitiva.14. No exame da culpabilidade do agente e das circunstâncias docrime, verifica-se que os elementos concretos foram detidamenteanalisados pelo Tribunal a quo, para demonstrar porque a conduta doRéu se reveste de especial reprovabilidade. Com efeito, consignou-seque os ilícitos foram perpetrados sob a orientação do Recorrente,que engendrou complexo esquema para gerir, desviar recursos e emitirtítulos sem lastro por longo lapso temporal. Além disso, ele foi omaior beneficiário da empreitada.15. Da mesma forma, as consequências dos crimes se revelamdesfavoráveis, uma vez que, repito, restaram comprovados osmilionários prejuízos econômicos ao erário e à economia popular.16. Não prospera a arguida violação ao art. 4.º da Lei n.º 7.492 /86,sob o argumento de que o acórdão recorrido considerou como criminosaconduta que não constitui infração penal. Ao contrário do quesustenta a Defesa, o Tribunal a quo não fundamentou a materialidadedesse crime no simples fato de a INTERUNION CAPITALIZAÇÃO S.A. terrealizado adiantamentos para futuros aumentos de capital - as AFACs.Não foi desqualificada essa prática empresarial, mas, ao revés, seconsiderou que vários atos de administração eram exercidos de formafraudulenta.17. Ademais, rever o entendimento das instâncias ordinárias, paraconsiderar como não comprovada a materialidade do crime de gestãofraudulenta, implicaria o revolvimento fático-probatório, o que évedado na via do recurso especial. Incidência do verbete sumular n.º 7 do Superior Tribunal de Justiça.Recurso especial do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL:18. Também esbarra no óbice contido no verbete sumular n.º 7 opedido de condenação pelo crime do art. 5.º , caput, da Lei n.º 7.492 /86, relativo à apropriação ou desvio de dinheiro, título,valor ou outro bem, pois o Tribunal de origem considerou comofundamento para a absolvição também o fato de que o desvio devalores, para empresas controladas por Artur Falk, "constitui aprópria gestão fraudulenta e se identifica plenamente com o conceitojurídico definido no art. 4.º , caput da Lei 7.492 /86".19. Recurso do Parquet não conhecido. Recursos especiais da Defesaconhecidos, sendo desprovido o apelo de ARTUR FALK e parcialmenteprovido o de PEDRO GOES MONTEIRO DE OLIVEIRA a fim de redimensionaras reprimendas que lhe foram aplicadas, nos termos explicitados novoto.