JUIZADO ESPECIAL. FAZENDA PÚBLICA. INDENIZAÇÃO DE ATIVIDADES EXTERNAS. PAGAMENTO INDEVIDO. AUSENTE MÁ-FÉ DO SERVIDOR. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I. Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré contra a sentença que julgou procedente o pedido para declarar indevida a restituição dos valores pagos a título de indenização de Atividades Externas, recebidos a maior pela parte autora durante o período de férias dos anos de 2014 e 2015, bem como a consequente determinação para que o Distrito Federal se abstenha de efetuar qualquer medida para o desconto dos valores percebidos pela autora relativos à matéria debatida nos autos. A parte recorrente destaca o dever de autotutela administrativa, bem como assinala que o STJ, no tema 1009 de recursos repetitivos, ressaltou a possibilidade de se determinar a devolução de valores, inclusive porque no caso concreto não se constata a inequívoca boa-fé objetiva da parte autora, uma vez que recebeu a indenização de atividades externas durante o período em que estava de férias. Destaca que o artigo 120 da Lei Complementar nº 840/2011 dispõe que o pagamento em desacordo com a legislação não aproveita ao servidor beneficiado, de modo que a sua não aplicação ao caso concreto exige a sua declaração de inconstitucionalidade. II. Recurso próprio, tempestivo e isento de preparo. Contrarrazões apresentadas. III. A lide decorre da divergência quanto a restituição de valores indevidamente recebidos pela parte autora a título de indenização de atividades externas relativo ao período que estava de férias nos anos de 2014 e 2015, sendo que no ano de 2016 o TCDF constatou a irregularidade no pagamento da indenização aos servidores da Agefis no período que estavam em usufruto de férias. IV. A devolução de valores recebidos por servidor público, em razão de em razão de erro operacional ou de cálculo decorrente de ato da administração pública, foi objeto de deliberação pelo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento dos REsp nº 1769209/AL e REsp XXXXX / AL , julgados em 01/03/2021 (Tema 1.009), que fixou o seguinte entendimento: ?os pagamentos indevidos a servidores públicos, decorrentes de erro administrativo (operacional ou de cálculo) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei, estão sujeitos à devolução, a menos que o beneficiário comprove a sua boa-fé objetiva, especialmente com a demonstração de que não tinha como constatar a falha?. Ao modular os efeitos da decisão, o STJ entendeu por bem determinar que sua eficácia somente atingirá os processos iniciados após a publicação do acórdão. V. Ficou estabelecido na revisitação do tema 531, que não há que se confundir erro na interpretação de lei com erro operacional. Assim, o tema 1.009 elencou a hipótese e requisitos para autorizar a restituição ao Erário dos valores pagos indevidamente decorrente de erro de cálculo ou operacional da Administração Pública, desde que não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração. Isso porque, diferentemente dos casos de errônea ou má aplicação de lei, nos quais o elemento objetivo é, por si só, suficiente para se concluir que o servidor recebeu o valor de boa-fé, assegurando-lhe o direito à não devolução do valor recebido indevidamente, na hipótese de erro operacional o STJ ressaltou no tema 1.009 de recursos repetitivos que é exigível a verificação da boa-fé do servidor, uma vez que não há legítima expectativa a justificar a percepção de tais valores. VI. Contudo, por ocasião do julgamento daqueles recursos paradigmas do tema 1.009 foi determinada a modulação dos efeitos da tese fixada, nos seguintes termos: ?Os efeitos definidos neste representativo da controvérsia, somente devem atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão?. Assim, não incide a aplicação automática da tese ao caso vertente, de modo que é dispensado que o beneficiado demonstre a sua boa-fé objetiva, sendo que o ressarcimento será devido em caso de evidente má-fé. VII. Contudo, a má-fé não se presume. No caso concreto, não obstante a tese do Distrito Federal de que a parte autora deveria ter ciência de que não poderia receber indenização de atividade externa durante o usufruto das férias, constata-se que a parte autora não teve qualquer participação no erro operacional da administração pública, sendo que inexistem elementos para atestar a sua suposta má-fé. A situação decorre de erro operacional da administração, sendo que a apuração de que a verba não seria devida durante as férias somente foi identificada mediante auditoria e decisão proferida no ano de 2016 pelo TCDF, de modo que não há que se falar em má-fé do servidor que recebia aquela verba. Precedente desta E. Turma Recursal acerca do pagamento da indenização de atividades externas nos anos de 2014 e 2015: (Acórdão XXXXX, XXXXX20218070016 , Relator: EDILSON ENEDINO DAS CHAGAS, Primeira Turma Recursal, data de julgamento: 24/9/2021, publicado no DJE: 18/10/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.) VIII. Apesar de sustentar a sua atuação conforme a legalidade estrita, não é lícito à parte ré efetuar o desconto de diferenças pagas indevidamente em decorrência de erro operacional da Administração Pública quando se constata que o recebimento pela parte beneficiada se deu de boa-fé. IX. O entendimento não viola o disposto no artigo 120 da Lei Complementar nº 840/2011, eis que decorre de interpretação conforme a Constituição Federal e também face os princípios da razoabilidade e da boa-fé objetiva, não existindo determinação para conceder o ingresso definitivo de valores mensais nos vencimentos da servidora, mas apenas atestando que a restituição dos valores recebidos sofre limitações face a ausência de má-fé na sua percepção. Assim, não é caso de declaração de inconstitucionalidade do dispositivo mencionando. Neste sentido: (Acórdão XXXXX, XXXXX20208070018 , Relator: ARNOLDO CAMANHO, 4ª Turma Cível, data de julgamento: 7/10/2021, publicado no DJE: 26/10/2021. Pág.: Sem Página Cadastrada.); e (Acórdão XXXXX, XXXXX20178070018 , Relator: CARMELITA BRASIL, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 7/2/2018, publicado no DJE: 19/2/2018. Pág.: Sem Página Cadastrada.) X. Apesar do princípio da autotutela atribuir à Administração Pública o poder-dever de anular os atos administrativos ilegais e revogar aqueles inconvenientes, destaca-se que há limitação quanto ao ressarcimento de verbas de natureza alimentar e recebidas de boa-fé, como no caso concreto, decorrente de pagamento indevido proveniente de erro operacional da própria Administração Pública. XI. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Sentença mantida. Sem custas ante a isenção legal. Condeno a parte recorrente vencida ao pagamento dos honorários advocatícios que fixo em 15% do valor da causa. XII. A Ementa servirá de Acórdão, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099 /95.