TJ-DF - XXXXX20228070016 1713829
CIVIL E CONSUMIDOR. REGULAMENTO DO PROGRAMA DE PONTOS DO CARTÃO DE CRÉDITO - CONTRATO DE ADESÃO - AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE - CONTRATO UNILATERAL E BENÉFICO - INEXISTÊNCIA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA - INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA - VALIDADE DA CLÁUSULA QUE PROÍBE A TRANSFERÊNCIA DOS PONTOS AOS HERDEIROS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Cuida-se de recurso inominado interposto pela Livelo S.A. contra sentença que declarou a nulidade de cláusula contida em regulamento do programa de pontos que proíbe a sucessão hereditária de pontuação acumulada pelo titular e determinou à recorrente a transferência dos pontos acumulados aos herdeiros. Na origem, considerou-se que a cláusula em comento foi inscrita em contrato de adesão, sem o destaque necessário, sendo limitativa do direito do consumidor. 2. Em suas razões, a recorrente defende a inexistência de abusividade no regulamento do programa de pontos, pois se trata de contrato unilateral em que somente a Livelo assume obrigação gratuita de desempenhar prestações em favor dos usuários e, por este, motivo a cláusula deve ser interpretada restritivamente. Acrescenta que os pontos são bonificações concedidas pela instituidora do programa àquele consumidor pela sua fidelidade com os serviços prestados por ela, não sendo lógico permitir que tais pontos bônus sejam transmitidos aos herdeiros, por ocasião do falecimento do titular que muitas vezes sequer são clientes. Pede a reforma da sentença para que os pedidos dos autores sejam julgados improcedentes. 3. Em contrarrazões, os autores sustentam que a pontuação adquirida pelo participante do programa não é uma liberalidade da ré, mas uma contrapartida por despesas feitas utilizando os cartões de crédito, o que proporciona, no regime da livre iniciativa, ganhos para a empresa. Discorrem que a abusividade da cláusula reside na subtração do direito de transmissão dos pontos que possuem conteúdo econômico aos sucessores. Defendem a nulidade da cláusula por a considerar abusiva, pois coloca o consumidor em situação de desvantagem excessiva. 4. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade (art. 51 , inciso IV do CDC ). 5. Nos termos do art. 114 do CDC , os contratos gratuitos devem ser interpretados de forma restritiva. A cláusula do regulamento do programa de pontos que veda a transferência de pontuação, na hipótese de falecimento do titular, não pode ser considerada abusiva pois, apesar de inserida em contrato de adesão, não coloca o consumidor em situação de desvantagem exagerada, tampouco é incompatível com a boa-fé contratual. 6. O fato de uma cláusula contratual estar inserida em contrato de adesão, por si só, não gera sua nulidade, se não demonstrada a violação aos direitos do contratante. É de se notar que a estipulação em apreço, apesar de ser criada unilateralmente, impõe obrigações tão somente à empresa, beneficiando de forma gratuita o consumidor que é dispensado de contraprestação pecuniária. 7. Neste sentido a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisou situação semelhante quanto ao programa de pontos de empresa aérea e considerou válida a cláusula do regulamento do programa de fidelidade que previa o cancelamento dos pontos acumulados pelo cliente após o seu falecimento: ?DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. IRRESIGNAÇÃO MANEJADA SOB A ÉGIDE DO NCPC . AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. REGULAMENTO DE PLANO DE BENEFÍCIO. PROGRAMA TAM FIDELIDADE. VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ART. 1.022 DO NCPC . INEXISTÊNCIA. CLÁUSULA 1.8 DO REGULAMENTO DO MENCIONADO PROGRAMA. CONTRATO DE ADESÃO. ART. 51 DO CDC . NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA ABUSIVIDADE OU DESVANTAGEM EXAGERADA. INEXISTÊNCIA. CONTRATO UNILATERAL E BENÉFICO. CONSUMIDOR QUE SÓ TEM BENEFÍCIOS. OBRIGAÇÃO INTUITO PERSONAE. AUSÊNCIA DE CONTRAPRESTAÇÃO PECUNIÁRIA PARA A AQUISIÇÃO DIRETA DOS PONTOS BÔNUS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. ART. 114 DO CC/02 . CONSUMIDOR QUE PODE OPTAR POR NÃO ADERIR AO PLANO DE BENEFÍCIOS E, MESMO ASSIM, UTILIZAR O SERVIÇO E ADQUIRIR OS PRODUTOS OFERTADOS PELA TAM E SEUS PARCEIROS. VALIDADE DA CLÁUSULA QUE PROÍBE A TRANSFERÊNCIA DOS PONTOS BÔNUS POR ATO CAUSA MORTIS. VERBA HONORÁRIA. MODIFICAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 85 , § 2º , DO NCPC . RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC . 2. Não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional (violação do art. 1.022 do NCPC ), quando a fundamentação adotada pelo Tribunal Estadual é apta, clara e suficiente para dirimir integralmente a controvérsia que lhe foi apresentada. 3. Inexistindo ilegalidade intrínseca, nos termos do art. 51 , IV do CDC , as cláusulas constantes de contrato de adesão só serão declaradas nulas quando estabelecerem obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade. 4. Deve ser considerado como contrato unilateral e benéfico a adesão ao Plano de Benefícios que dispensa contraprestação pecuniária do seu beneficiário e que prevê responsabilidade somente ao seu instituidor. Entendimento doutrinário. 5. Os contratos benéficos, que por sua natureza são intuito personae, devem ser interpretados restritivamente, consoante disposto no art. 114 do CC/02 . 6. Recurso especial provido?. ( REsp n. 1.878.651/SP , relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 4/10/2022, DJe de 7/10/2022.) 8. Em assim sendo, não há que ser declarada a nulidade da cláusula contratual que veda a transmissão de pontos aos herdeiros. A pontuação adquirida pelo titular deve ser considerada pessoal e intransferível. 9. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO Para reformar a sentença e julgar improcedentes os pedidos dos autores. 10. Decisão proferida na forma do art. 46 , da Lei nº 9.099 /95, servindo a ementa como acórdão. 11. Sem custas adicionais e sem condenação em honorários advocatícios à ausência de recorrente vencido.