DESAPROPRIAÇÃO. TERRAS INDÍGENAS. DIREITO A INDENIZAÇÃO RESTRITA ÀS BENFEITORIAS. PAGAMENTO REALIZADO. AUSÊNCIA DE CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE REASSENTAMENTO DOS AUTORES, PREVISTA EM CONVÊNIO FIRMADO ENTRE A FUNAI E O INCRA. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. DEMORA EXCESSIVA NO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE REASSENTAMENTO ASSUMIDA PELO INCRA. I - Apelação interposta por José Carlos Gonçalves e Maria Rosângela Gonçalves da sentença pela qual o Juízo julgou procedente, em parte, o pedido por eles formulado, para "condenar o INCRA na obrigação advinda do Convênio DF/390001/97." Hipótese em que o Juízo fixou "o prazo de 90 [...] para que o INCRA apresente plano de reassentamento dos Autores, sob pena de multa diária no valor de R$ 2.000,00". II - Em princípio, "'[o] procedimento de demarcação de terras indígenas não pode ser comparado ao apossamento administrativo - também chamado de desapropriação indireta -, caracterizado como verdadeiro esbulho possessório, sem a necessária garantia do contraditório e do devido processo legal.' (STJ. REsp XXXXX/SC [...])." (TRF 1ª Região, AC XXXXX-47.1999.4.01.4300/TO .) III - Considerando que, segundo os fatos tidos por certos pelo Juízo, teria havido desapropriação do imóvel de propriedade dos autores, os quais postulam integral indenização pelo fato, reconheço a competência daSegunda Seção. RITRF 1ª Região, Art. 8º, § 2º, III. Ademais, a questão envolvendo a indenização pelas benfeitorias implantadas em imóvel que, posteriormente, é declarado de imemorial ocupação indígena, como se vê dos precedentes que versam sobre essa matéria, tem sido apreciada tanto pela Segunda quanto pela Terceira Seção desta Corte. IV - Pretensão à indenização pela terra nua, pela cobertura vegetal e por perdas e danos. Improcedência. Em se tratando de desapropriação para a constituição de reserva indígena, a Constituição Federal ( CF) somente prevê indenização pelas "benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé." CF , Art. 231 , § 6º. (TRF 1ª Região, AC XXXXX-62.2006.4.01.3600/MT ; AR XXXXX-87.2014.4.01.0000/MA ; AC XXXXX-51.2005.4.01.3600/MT ; AC XXXXX-14.2006.4.01.3200/AM ; AC XXXXX-51.2008.4.01.0000/MT ; AC XXXXX-12.2004.4.01.0000/RR ; AC XXXXX-31.2000.4.01.3600/MT ; AC XXXXX-07.2006.4.01.3600/MT ; AC XXXXX-97.2003.4.01.0000/MT.) V - Indenização pelas benfeitorias já procedida pela Funai. Pretensão dos autores à complementação do valor pago. Hipótese em que os autores firmaram declaração de quitação irretratável. Inexistência de alegação de vício nessa declaração. Consequente improcedência dessa pretensão. VI - Dano moral. Caracterização, no caso. Obrigação assumida pelo Incra, em convênio firmado com a Funaiem 24/09/1997, de proceder ao reassentamento dos autores. Direito ao reassentamento previsto também em ato normativo federal. Decreto 1.775 , de 1996, Art. 4º . Inexistência de prova, nos autos, do reassentamento. Negligência manifesta do Incra, caracterizadora de culpa grave. Demora que implica, de forma direta e imediata, sofrimento emocional aos autores, em relação ao qual não se espera que uma pessoa racional e razoável seja capaz de suportar. Demora excessiva, mormente considerando que o prazo inicial de vigência do convênio firmado entre ele a Funai era de cinco anos, embora sujeito à prorrogação. Demora de quase 20 anos que supera mero dissabor, incômodo ou aborrecimento. Sofrimento emocional experimentado pelos autores de natureza grave. Perda, pelos autores, do principal meio de sustento respectivo. Circunstâncias que, vistas em conjunto, são suficientes à demonstração de que o sofrimento emocional suportado pelos autores é grave. Dano moral caracterizado. Nesse sentido, esta Corte reconheceu o direito à indenização por dano moral em virtude da omissão da Administração Pública no adimplemento de obrigação por ela assumida. Assim, "[e]xcepcionalmente, é de se reconhecer violação a direito da personalidade em decorrência da indevida morosidade administrativa, ante a existência de processo de indenização por benfeitorias que perdura por mais de 20 (vinte) anos, sem que os administrados tenham concorrido paratanto." (TRF 1ª Região, AC XXXXX-83.2010.4.01.3200/AM .) VII - Indenização por dano moral fixada em R$ 60.000,00, para cada um dos autores, considerando a demora excessiva, a perda do meio de sustento, o fato de a obrigação também estar prevista em ato normativo federal, a necessidade de ajuizamento desta ação, as aflições suportadas pelos autores e a posição familiar, cultural, social e econômico-financeira deles, os quais são pessoas humildes, e a posição do ofensor, o Incra. VIII - "'A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde o arbitramento' (STJ, Súmula 362 ). Os juros moratórios devem ser calculados no percentual de 0,5% ao mês, desde a data do evento danoso (Súmula 54 /STJ)". (TRF 1ª Região, AC XXXXX-33.2003.4.01.3500/GO .) XI - Apelação provida em parte.