PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C , DO CPC . TRIBUTÁRIO. ICMS. CREDITAMENTO (PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE). AQUISIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CONSUMIDA NO ESTABELECIMENTO COMERCIAL (SUPERMERCADO). ATIVIDADES DE PANIFICAÇÃO E CONGELAMENTO DE ALIMENTOS. ARTIGO 33 , II , B, DA LEI COMPLEMENTAR 87 /96. ARTIGO 46 , PARÁGRAFO ÚNICO , DO CTN . DECRETO 4.544 /2002 (REGULAMENTO DO IPI). PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. CREDITAMENTO DO ICMS. IMPOSSIBILIDADE. 1. As atividades de panificação e de congelamento de produtos perecíveis por supermercado não configuram processo de industrialização de alimentos, por força das normas previstas no Regulamento do IPI (Decreto 4.544 /2002), razão pela qual inexiste direito ao creditamento do ICMS pago na entrada da energia elétrica consumida no estabelecimento comercial. 2. A Lei Complementar 87 /96, pelo princípio da não-cumulatividade, assegura ao sujeito passivo do ICMS, entre outros, o direito de creditamento do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria destinada ao uso ou consumo do estabelecimento (artigo 20, caput). 3. O artigo 33, II, da lei complementar em tela, no que concerne ao direito de aproveitamento de crédito de ICMS decorrente da energia elétrica usada ou consumida no estabelecimento, previu o que se segue: "Art. 33. (...) Na aplicação do art. 20 observar-se-á o seguinte: (...) II - a energia elétrica usada ou consumida no estabelecimento dará direito de crédito a partir da data da entrada desta Lei Complementar em vigor;" (redação original) "II ? somente dará direito a crédito a entrada de energia elétrica no estabelecimento: a) quando for objeto de operação de saída de energia elétrica; b) quando consumida no processo de industrialização; c) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais; e d) a partir de 1º de janeiro de 2003, nas demais hipóteses;" (inciso e alíneas com a redação dada pela Lei Complementar 102 , de 11 de julho de 2000)"d) a partir de 1º de janeiro de 2007, nas demais hipóteses;" (alínea com a redação dada pela Lei Complementar 114 , de 16 de dezembro de 2002)"d) a partir de 1º de janeiro de 2011, nas demais hipóteses;" (redação dada pela Lei Complementar 122 , de 12 de dezembro de 2006) (....)"4. A redação original do inciso II , do artigo 33 , da Lei Complementar 87 /96, preceituava que a energia elétrica genericamente usada ou consumida no estabelecimento geraria direito ao creditamento do ICMS, a partir de 1º.11.1996 (data da entrada em vigor da aludida lei complementar).5. Deveras, com o advento da Lei Complementar 102 /2000 (entrada em vigor em 1º.08.2000), a entrada de energia elétrica no estabelecimento somente ensejaria direito de crédito: (i) quando objeto de operação de saída de energia elétrica (alínea a); (ii) quando consumida no processo de industrialização (alínea b); (iii) quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior (alínea c); e (iv) a partir de 1º de janeiro de 2003, nas demais hipóteses (alínea d).6. A Lei Complementar 114 , de 16 de dezembro de 2002 (vigência a partir de 17.12.2002), no que concerne às hipóteses diversas das previstas nas alíneas a , b e c , do inciso II , do artigo 33 , da Lei Kandir , dispôs que haveria direito de creditamento de ICMS na entrada de energia elétrica no estabelecimento a partir de 1º de janeiro de 2007.7. Por fim, a Lei Complementar 122 , de 12 de dezembro de 2006 (entrada em vigor em 13.12.2006), determinou que o aludido direito de creditamento do ICMS na entrada de energia elétrica no estabelecimento (em hipóteses outras que as elencadas nas alíneas a , b e c , do inciso II , do artigo 33 , da LC 87 /96) surge somente a partir de 1º de janeiro de 2011.8. Consectariamente, a entrada de energia elétrica no estabelecimento, que não for objeto de operação de saída de energia elétrica, que não for consumida no processo de industrialização e cujo consumo não resulta em operação de saída ou prestação para o exterior, somente ensejará direito ao creditamento de ICMS a partir de 1º.01.2011.9. In casu, contudo, o estabelecimento comercial (supermercado) ajuizou embargos à execução fiscal fundada em auto de infração, lavrado em 20.08.2004, que considerou indevido o creditamento de ICMS pago na entrada de energia elétrica consumida nas atividades de panificação e congelamento de produtos perecíveis.10. Deveras, o objeto social da empresa, ora recorrente, consiste na"comercialização de produtos manufaturados, semi-manufaturados, ou in natura, nacionais ou estrangeiros, de todo e qualquer gênero e espécie, natureza ou qualidade, desde que não vedada por lei, bem como a industrialização e processamento de produtos por conta própria ou de terceiros", tendo sido confirmado, pelo Tribunal de origem, que o supermercado, em alguns setores, realiza atividades tendentes à transformação de matéria-prima e ao aperfeiçoamento de produtos destinados ao consumo.11. A tese genérica de que o contribuinte tem direito ao creditamento de ICMS se comprovar ter utilizado a energia elétrica"no processo de industrialização", ex vi do disposto no artigo 33 , II , b , da Lei Complementar 87 /96, foi consagrada pela Primeira Seção, no âmbito de embargos de divergência interpostos por estabelecimento industrial ( EREsp XXXXX/RS , Rel. Ministro Humberto Martins , julgado em 13.08.2008, DJe 15.09.2008).12. O parágrafo único , do artigo 46 , do CTN , ao versar sobre o IPI, considera industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo.13. Nada obstante, as normas previstas no Regulamento do IPI (Decreto 4.544 /2002) afastam a caracterização das atividades de panificação e congelamento de alimentos como industriais.14. Com efeito, o artigo 3º, do aludido regulamento, preceitua que"produto industrializado é o resultante de qualquer operação definida neste Regulamento como industrialização, mesmo incompleta, parcial ou intermediária".15. As características e modalidades de industrialização restaram elencadas no artigo 4º , do Decreto 4.544 /2002, verbis:"Art. 4º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Lei nº 4.502 , de 1964, art. 3º, parágrafo único, e Lei nº 5.172 , de 25 de outubro de 1966, art. 46 , parágrafo único ): I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação); II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento); III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem); IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto e a localização e condições das instalações ou equipamentos empregados."16. O aludido regulamento, por seu turno, enumera as operações que não são consideradas industrialização, entre as quais consta:"I - o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação: a) na residência do preparador ou em restaurantes, bares, sorveterias, confeitarias, padarias, quitandas e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta a consumidor"(artigo 5º, inciso I, alínea a, do Regulamento do IPI).17. O regulamento do IPI, em seu artigo 6º , incisos I e II, esclarece que embalagem de apresentação não se confunde com o acondicionamento para transporte do produto.18. Conseqüentemente, a atividade de panificação, desenvolvida pelo supermercado, não se afigura como"processo de industrialização", à luz do disposto no artigo 46 , do CTN , em virtude da exceção prevista no artigo 5º , inciso I , alínea a , do Decreto 4.544 /2002, que se apresenta como legislação tributária hígida.19. A atividade de congelamento de alimentos, por seu turno, não se amolda aos critérios estabelecidos no artigo 4º , do regulamento citado.20. O Supremo Tribunal Federal, em 22.10.2009, reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário XXXXX/SC , cujo thema iudicandum restou assim identificado:"ICMS. Creditamento de serviços de energia elétrica utilizado no processo produtivo.Princípio da não-cumulatividade. Supermercado.Atividade industrial de alimentos. Panificação e congelamento."21. O reconhecimento da repercussão geral pelo STF, com fulcro no artigo 543-B , do CPC , como cediço, não tem o condão, em regra, de sobrestar o julgamento dos recursos especiais pertinentes.22. É que os artigos 543-A e 543-B , do CPC , asseguram o sobrestamento de eventual recurso extraordinário, interposto contra acórdão proferido pelo STJ ou por outros tribunais, que verse sobre a controvérsia de índole constitucional cuja repercussão geral tenha sido reconhecida pela Excelsa Corte (Precedentes do STJ: AgRg nos EREsp XXXXX/RN , Rel. Ministra Laurita Vaz , Terceira Seção, julgado em 13.05.2009, DJe 27.05.2009; AgRg no Ag XXXXX/SP , Rel. Ministro Benedito Gonçalves , Primeira Turma, julgado em 18.08.2009, DJe 31.08.2009; AgRg no REsp XXXXX/SP , Rel. Ministro Luiz Fux , Primeira Turma, julgado em 18.06.2009, DJe 06.08.2009; AgRg no REsp XXXXX/SP , Rel. Ministro Humberto Martins , Segunda Turma, julgado em 05.02.2009, DJe 26.02.2009; EDcl no AgRg nos EDcl no AgRg no REsp XXXXX/RS , Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima , Quinta Turma, julgado em 04.11.2008, DJe 24.11.2008; EDcl no AgRg no REsp XXXXX/MG , Rel. Ministro Castro Meira , Segunda Turma, julgado em 13.05.2008, DJe 21.05.2008; e AgRg nos EDcl no REsp XXXXX/RN , Rel. Ministro Paulo Gallotti , Sexta Turma, julgado em 05.06.2008, DJe 29.09.2008).23. Destarte, o sobrestamento do feito, ante o reconhecimento da repercussão geral do thema iudicandum, configura questão a ser apreciada tão somente no momento do exame de admissibilidade do apelo dirigido ao Pretório Excelso.24. Os dispositivos legais apontados como violados restaram implicitamente prequestionados, não se vislumbrando violação do artigo 535 , do CPC , uma vez que o acórdão recorrido afastou a alegação de cerceamento de defesa (pugnando pela desnecessidade da prova) e considerou impossível o creditamento do ICMS, ao fundamento de que"a atividade desenvolvida pela apelante não pode ser considerada como industrial para efeito de creditamento, porquanto ainda que se vislumbre, em alguns setores, a transformação de matéria-prima e o aperfeiçoamento de produtos destinados ao consumo, seu desempenho possui caráter secundário no plano empresarial, focado, essencialmente, na comercialização de bens de consumo".25. O artigo 557 , do CPC , autoriza o relator a negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior (redação dada pela Lei 9.756 /98).26. A manutenção do julgado monocrático pelo órgão colegiado, em sede de agravo interno, com a encampação dos fundamentos exarados pelo relator, torna prejudicada a controvérsia acerca da regular aplicação do caput, do artigo 557 , do Código de Processo Civil (Precedentes do STJ: AgRg no Ag XXXXX/DF , Rel. Ministra Laurita Vaz , Quinta Turma, julgado em 17.09.2009, DJe 13.10.2009; AgRg no Ag XXXXX/GO, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), Terceira Turma, julgado em 18.08.2009, DJe 03.09.2009; REsp XXXXX/SP , Rel. Ministro Luiz Fux , Primeira Turma, julgado em 04.11.2008, DJe 27.11.2008; AgRg no REsp XXXXX/SC , Rel. Ministro Humberto Martins , Segunda Turma, julgado em 09.09.2008, DJe 09.10.2008; e REsp XXXXX/PR , Rel. Ministro Teori Albino Zavascki , Primeira Turma, julgado em 17.04.2008, DJe 12.05.2008).27. A apontada violação dos artigos 130 e 131 , do CPC , não resta configurada, quando o Tribunal de origem, prestigiando o princípio do livre convencimento motivado do julgador, considera desnecessária a produção de prova, sob o fundamento de que"a atividade desenvolvida pela apelante não pode ser considerada como industrial para efeito de creditamento, porquanto ainda que se vislumbre, em alguns setores, a transformação de matéria-prima e o aperfeiçoamento de produtos destinados ao consumo, seu desempenho possui caráter secundário no plano empresarial, focado, essencialmente, na comercialização de bens de consumo".28. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C , do CPC , e da Resolução STJ 08/2008.