TJ-CE - Apelação Cível XXXXX20148060001 Fortaleza
CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DIREITO DE DEFESA E ILEGITIMIDADE ATIVA. REJEITADAS. NO MÉRITO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. NEGATIVA DE TRATAMENTO PELO PLANO DE SAÚDE. EXIGÊNCIA DE CAUÇÃO PELO HOSPITAL PARA ATENDIMENTO DE URGÊNCIA. PRÁTICA ABUSIVA. SUJEITO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. ATAQUE A DIREITO DA PERSONALIDADE. CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 12, III, A DA LEI Nº 9.656 /98. INDENIZAÇÃO DA HONRA SUBJETIVA REDUZIDA. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. RECURSOS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. Cinge-se a demanda em saber se a negativa do plano de saúde a custear o tratamento do recém-nascido pautou-se pela legislação vigente, se a exigência do cheque-caução pelo hospital pode ser considerada como uma atitude abusiva e se estas atitudes ensejam a reparação de danos. 2. PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DIREITO DE DEFESA E DE ILEGITIMIDADE ATIVA. 2.1. A primeira versa sobre o cerceamento do direito de defesa, em razão do indeferimento da oitiva de uma das testemunhas, não merece guarida pelo motivo a seguir delineado. Em face do princípio do livre convencimento motivado, faculta-se ao magistrado o indeferimento das provas quando considerar que há elementos suficientes para sua convicção quanto às questões de fato e de direito no processo, tornando dispensável, como no caso em comento, a oitiva de uma testemunha, sem que isso provoque o cerceamento de direito de defesa. 2.2. A segunda preliminar versa sobre a ilegitimidade ativa do neonato quanto ao dano moral, já que o menor não foi o responsável pelo pagamento/contratação do serviço hospitalar. Entretanto, tal alegativa não merece guarida, visto que foi o recém-nascido quem teve a sua internação e tratamento de uma infecção com menos de 30 dias de vida condicionados a entrega de cheque-caução com valor superior a quase 5 (cinco) vezes ao montante despendido pelos seus genitores, fato este apto a ensejar o dano moral in re ipsa, já que a cobrança de tal garantia é considerada como abusiva quando decorre de uma situação de emergência como a do caso em tela. 3. NO MÉRITO. 4. O hospital ao exigir cheque-caução dos genitores para o atendimento de urgência do neonato agiu de forma vedada pelo artigo 6º , inciso IV do Código de Defesa do Consumidor , uma vez que tal prática constitui método coercitivo ilegal, porquanto obriga que a família assuma obrigação excessivamente onerosa prática esta vedada pelo art. 156 do CC/02 . Ademais, a recusa do tratamento sem que seja entregue a garantia enseja o dano moral in re ipsa, já que provoca maior angústia e aborrecimento aos genitores e, consequentemente, ao neonato, agravando, ainda mais, a situação emocional destes que já se encontrava fragilizada pela internação de urgência. 5. Lembra-se, ainda, que a exigência da garantia como requisito para que fosse prestado o tratamento e, consequentemente, a internação de emergência ou urgência é ilegal. Afinal, atualmente essa conduta é tipificada penalmente, nos termos do art. 135-A do Código de Penal, introduzido pela Lei nº. 12.653 /2012, o que reforça sua abusividade. 6. Não se pode olvidar ainda que a Resolução Normativa nº 44/2003 da ANS, veda, em qualquer situação, a exigência por parte do prestado de serviço hospitalar de caução, depósito de qualquer natureza, nota promissória ou quaisquer outros títulos de crédito, no ato ou anteriormente à prestação do serviço, como requisito para que o paciente ou pessoa de sua família, em situação de risco, tenha o serviço prestado. 7. Assim, claramente observa-se que a cobrança de tal garantia por parte do hospital, como sendo uma situação de urgência, foi abusiva e ilícita, configurando a existência do dano moral ao apelado. Precedentes STJ e TJCE. 8. A recorrente AMIL alega que autorizou todas as solicitações realizadas, no entanto o apelado só conseguiu ter de fato a inscrição no plano de saúde 4 (quatro) dias após sua internação no hospital. Mesmo assim, após a alta do neonato, ainda foi cobrado o montante de R$ 2.597,74 (dois mil, quinhentos e noventa e sete reais e setenta e quatro centavos) pelo Hospital Cura D'ars pelos gastos hospitalares. Assim, não resta dúvida quanto a necessidade do plano de saúde de ressarcir o apelado pelos gastos com o nosocômio. 9. Ademais, o plano de saúde, conforme está previsto no artigo 12 , inciso III , alínea a da Lei nº 9.656 /98, deve assegurar a cobertura assistencial ao recém-nascido, filho de consumidor, durante os 30 (trinta) primeiros dias após o parto. Sendo assim, a recorrente deveria ter autorizado o tratamento do neonato desde a primeira solicitação feita pelo hospital, bem como não poderia ter realizado a cobrança da quantia de R$ 2.597,74 (dois mil, quinhentos e noventa e sete reais e setenta e quatro centavos) pelo tratamento, já que o apelado estava totalmente amparado pelo convênio da AMIL. 10. No caso sob análise, o dano constatado foi ocasionado pela negativa injustificada do plano de saúde em cobrir a internação do neonato com menos de 30 (trinta) dias de vida. 11. O valor do arbitramento do dano sofrido deve estar regrado dentro de parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, sob pena de deferir enriquecimento indevido a uma das partes. No caso ora trazido à baila, percebe-se ao se efetuar o cotejo entre a situação fática com os referidos parâmetros descritos pela jurisprudência que o Juízo a quo não observou o princípio da proporcionalidade ao arbitrar o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de dano moral. 12. Desta forma, assiste razão aos apelantes quanto ao pleito para minorar o valor do dano moral, uma vez que a condenação de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a cada um dos recorrentes, melhor se coaduna perante o princípio da proporcionalidade. 13. Quanto aos honorários advocatícios, entende-se que o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação não pode ser considerado irrisório e, corresponde sim, a uma remuneração digna ao trabalho realizado pelo causídico. 14. Recursos conhecidos e parcialmente providos. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos das apelações cíveis de nº. XXXXX-35.2014.8.06.0001 , em que figuram as partes acima indicadas, acordam os Desembargadores da 2ª Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, conhecer dos recursos, para dar-lhes parcial provimentos, nos termos do voto do relator. Fortaleza, 4 de dezembro de 2019 FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR CARLOS ALBERTO MENDES FORTE Relator