E M E N T A CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DIREITO À VIDA. DIREITO À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS PELO SUS. MYOZYME® (ALFAGLICOSIDASE). MEDICAMENTO COM REGISTRO NA ANVISA. AUSÊNCIA DO MEDICAMENTO NA LISTA DO SUS (RENAME). PRESCINDIBILIDADE. FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA (ASTREINTES) COMO FORMA DE COMPELIR A FAZENDA PÚBLICA A ADIMPLIR A OBRIGAÇÃO. CABIMENTO. PRECEDENTES. REEXAME NECESSÁRIO DESPROVIDO. 1. Cuida-se de reexame necessário de sentença que julgou a ação procedente, determinando à União o fornecimento do medicamento Myozyme® (Alfaglicosidase) ao autor, portador da Doença de Pompe (CID E74.0), tratando-se de fármaco de alto custo. 2. Impende ressaltar que o Estado deve zelar pelo direito à vida, garantido no caput do art. 5º da Constituição Federal . 3. Também é garantido o direito à saúde (art. 6º , CF ), sendo de competência da União, Estados, Distrito Federal e Municípios o cuidado com ela (art. 23 , II , CF ), bem como a organização da seguridade social, garantida a "universalidade da cobertura e do atendimento" (art. 194 , parágrafo único , I , CF ). 4. Mais contundente ainda é o que dispõe o art. 196 da Constituição Federal , pelo qual "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação", sendo que, de acordo com o art. 198, "o atendimento integral" é uma diretriz constitucional das ações e serviços públicos de saúde. 5. Por conseguinte, é dever do Estado, em todas as suas esferas, garantir aos seus cidadãos o direito à saúde, sendo inconcebível a recusa do fornecimento medicamento objeto do presente feito, a saber, Myozyme® (Alfaglicosidase), pois comprovadamente necessário para o tratamento do autor, acometido de grave doença. 6. No que tange à responsabilidade da União, do Estado e do Município, o C. Supremo Tribunal Federal já consagrou o entendimento no sentido da solidariedade entre os entes políticos pelo SUS, cabendo a todos e qualquer um deles a responsabilidade pelo efetivo fornecimento de tratamento à pessoa sem recursos financeiros, conforme restou decidido no julgamento do Recurso Extraordinário XXXXX/SE , pelo rito da repercussão geral, tema 793. 7. Dessa forma, qualquer dos entes federados, isolada ou conjuntamente, pode compor o polo passivo de ação judicial proposta objetivando o fornecimento de medicamentos às pessoas desprovidas de recursos financeiros, por se tratar de responsabilidade solidária. 8. No caso vertente, o autor juntou, dentre outros documentos, Relatório Médico subscrito pelo neurologista Dr. Wladimir Bocca Vieira de Rezende Pinto, CRM-SP 150.542, datado de 09/06/2017, atestando que o paciente possui o diagnóstico de Doença de Pompe – forma do adulto ou glicogenose tipo 2 (CID-10: E74.0), e que o tratamento indicado deve ser feito com o medicamento Myozyme® (alfaglicosidase ácida recombinante humana). 9. De acordo com o Laudo Técnico Pericial, subscrito pelo Dr. Aloísio Chaer Dib, perito judicial nomeado pelo juízo de primeiro grau, conforme perícia realizada com base na documentação médica acostada aos autos e no exame físico, o autor é acometido pela Doença de Pompe, havendo indicação clínica formal para o uso do fármaco pleiteado, qual seja, Myozyme. 10. Com efeito, o fato de o medicamento postulado pela parte autora não ter sido padronizado pelo SUS, não constando na Relação Nacional de Medicamentos Essenciais – RENAME, não constitui óbice ao fornecimento do fármaco. Isso porque, conforme o entendimento do Colendo Supremo Tribunal Federal ( ARE XXXXX AgR), a lista do SUS não constitui o parâmetro único a ser levado em conta na avaliação da necessidade de fornecimento de um medicamento, o que que depende, no caso concreto, de avaliação médica. 11. Configura o direito público subjetivo à saúde norma constitucional de eficácia plena, de aplicação imediata, cabendo ao Estado formular e implementar políticas públicas com o escopo de assegurar a consecução dos objetivos elencados no art. 196 da Constituição Federal . 12. Diante dos comandos emanados da Constituição da Republica Federativa do Brasil e da Lei, regramentos destinados a proteger um bem maior - o direito à vida -, não cabe a alegação, de cunho meramente financeiro, de que o fornecimento do tratamento ao autor traria impactos ao erário. 13. Portanto, sopesando todos os valores envolvidos, tenho que aqueles relacionados ao direito à vida, à dignidade da pessoa humana, à saúde, à assistência social e à solidariedade, devem prevalecer sobre eventuais restrições financeiras, razão pela qual procede a pretensão do autor no que tange ao direito de receber o fornecimento do medicamento de que necessita. 14. Cabível a fixação de multa diária cominatória (astreintes) contra a Fazenda Pública com o escopo de assegurar o cumprimento da obrigação no prazo estipulado, ante o entendimento firmado na jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp XXXXX/RS sob o rito dos recursos repetitivos, tema: 98. 15. Considerando-se a ampla jurisprudência e restando comprovado o direito do autor à tutela jurisdicional específica pleiteada para o fornecimento de medicamento imprescindível à garantia de sua saúde e vida, a sentença deve ser mantida nos termos em que proferida. 16. Reexame necessário não provido.