Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 RECURSO Nº. XXXXX-37.2019.8.05.0001 RECORRENTE: EMILY KARINE MAGALHAES SILVA RECORRIDA: INSTITUTO SULAMERICANO DE EDUCACAO EIRELI RELATOR: JUSTINO FARIAS EMENTA OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EDUCACIONAIS. DEMORA NA ENTREGA DE CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DE CURSO. ALEGAÇÃO DE FALTA DE ADIMPLEMENTO DA ÚLTIMA MENSALIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE CONDICIONAMENTO DA EMISSÃO DE CERTIFICADO AO PAGAMENTO DA TOTALIDADE DAS PARCELAS. VIOLAÇÃO ÀS REGRAS GERAIS DA EDUCAÇÃO NACIONAL. ART. 6º E SEU § 1º DA LEI N.º 9.870 /99. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE CAUSA EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. DANO MORAL CONFIGURADO. REFORMA DA SENTENÇA PARA JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTES PARA DECLARAR A QUITAÇÃO DO CONTRATO E DETERMINAR O CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - ENTREGA DE CERTIFICADO E FIXAR INDENIZAÇÃO A TÍTULO DE DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO ARBITRADO EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS), COM BASE NOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE E PARA DESESTIMULAR A REITERAÇÃO DO ATO ILÍCITO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados. Realizado o julgamento, a Terceira Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, decidiu, à unanimidade, CONHECER E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO INTERPOSTO, nos termos do voto do Juiz Relator, adiante lavrado, que passa a integrar o presente acórdão. Sala das Sessões, em 03 de junho de 2020. JUSTINO FARIAS Juiz Relator Documento Assinado Eletronicamente RECURSO Nº. XXXXX-37.2019.8.05.0001 RECORRENTE: EMILY KARINE MAGALHAES SILVA RECORRIDA: INSTITUTO SULAMERICANO DE EDUCAÇÃO EIRELI RELATOR: JUSTINO FARIAS VOTO Dispensado o relatório e com fundamentação concisa, nos termos do art. 46 da Lei nº. 9.099 /95. Presentes os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade, conheço do recurso. No mérito, depois de minucioso exame dos autos, estou persuadido de que a irresignação manifestada pela recorrente merece parcial acolhimento. Trata-se de pretensão de obrigação de fazer, para instar a demandada a proceder à desconstituição do débito, entrega de certificado de conclusão de curso, cumulada com pedido de indenização por danos morais. Alega a autora, em síntese, ter assinado contrato no dia 25/05/2018, com a Requerida, no qual ficou determinada a prestação de serviços de ensino do curso de AUXILIAR VETERINÁRIO, tendo concluído suas aulas em 26 de janeiro de 2019. No entanto, não recebeu o diploma referente à conclusão do seu curso. Feito pedido administrativo, não logrou êxito na entrega do diploma, causando-lhe prejuízos. A acionada, em defesa (evento nº 11), aduziu que o certificado não foi entregue a parte autora devido a existência de débito em aberto referente à última parcela do curso, informando que tal postura encontra fundamento em cláusula contratual, não havendo que se falar em falha na prestação do serviço. O ilustre magistrado a quo julgou improcedentes os pedidos. Contudo, com a devida vênia, no caso dos autos, no tocante à emissão do certificado, verifica-se que a autora acostou ao evento nº 01, prova de que realizou a solicitação do documento, além de faturas com a realização dos pagamentos referentes às mensalidades do curso contratado. Ademais, cumpre esclarecer, ainda que fosse o caso de existência de débito em aberto, a parte ré, como instituição de ensino, apenas poderia se valer de meios legais de cobrança, não sendo possível a retenção de documentos por motivo de inadimplência de aluno, não encontrando tal medida respaldo legal. Senão vejamos o que dispõe o art. 6º da Lei n.º 9.870 /99: Art. 6o São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor , e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias. Este também é o entendimento do nosso Tribunal Local: JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. INSTITUIÇÃO DE ENSINO. AUSÊNCIA DE ENTREGA DO CERTIFICADO DE CONCLUSÃO DA PÓS GRADUAÇÃO. RECURSO EXCLUSIVO DA PARTE AUTORA. PLEITO INDENIZATÓRIO DEFERIDO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS E ORA ARBITRADOS EM R$ 8.000,00 (QUATRO MIL REAIS). 1.A parte autora comprovou que concluiu as matérias regulares do curso, tendo efetuado a solicitação do certificado de conclusão da pós-graduação, contudo, até o ajuizamento da demanda, a acionada não havia entregado o documento. 2.A retenção do documento afronta o art. 6º , da lei 9.870 /99, que estabelece: ¿São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento¿. 3. A não entrega do certificado é suficiente para se concluir que a ré descumpriu sua obrigação de bem prestar os serviços educacionais, que vão desde a admissão do aluno até a emissão do certificado de conclusão. 4. Os danos morais restaram evidenciados e foram fixados em R$ 8.000,00. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA PARA ARBITRAR DANOS MORAIS EM R$ 8.000,00. (Classe: Recurso Inominado,Número do Processo: XXXXX-14.2018.8.05.0001 ,Relator (a): NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS,Publicado em: 10/07/2019 ) Assim, qualquer cláusula em sentido contrário se afigura abusiva. Desta forma, verifica-se, do conjunto probatório constante dos autos, que a parte suplicante terminou as aulas em 26/01/2019 e, em que pese a previsão contratual de entrega de certificado no prazo de 30 dias corridos a contar da última aula do curso, a demandada sequer procedeu com a expedição do mesmo, embora as mensagens trocadas por aplicativo de whatsApp (evento 01) comprovem que o certificado já estava pronto, violando, assim, o direito que consumidor/aluno de ter acesso a documento que o habilite a exercer a sua profissão, devendo a demandada indenizar moralmente a parte Autora. Constata-se, portanto, a gravidade do ilícito praticado pela parte ré recorrida, bem como a amplitude do dano causado ao recorrente em razão da má qualidade do serviço prestado. Tal fato, por si só, é suficiente para justificar o pleito indenizatório, posto que, em se tratando de indenização decorrente da má prestação do serviço, a prova do dano moral se satisfaz com a demonstração da sua ocorrência, independentemente da prova objetiva do abalo na honra e na reputação, facilmente presumíveis. A jurisprudência mais atual tem reconhecido que todo dano moral causado por conduta ilícita é indenizável como direito subjetivo da própria pessoa ofendida. Também é assente que a moral, absorvida como dado ético pelo direito, que não pode se dissociar dessa postura, impõe sejam as ofensas causadas por alguém a outrem devidamente reparada pelo autor da ofensa. No caso, enquadra-se perfeitamente a referência feita a Savatier pelo insigne Caio Mário da Silva Pereira, que diz: O fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos. Colocando a questão em termos de maior amplitude, Savatier oferece uma definição de dano moral como ¿qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária¿, e abrange todo atentado à reputação da vítima, à sua autoridade legítima, ao seu pudor, à sua segurança e tranquilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de sua inteligência, a suas afeições etc. (Traité de La ResposabilitéCivile, vol. II, nº 525) Na fixação da indenização por dano moral, não se encontrando no sistema normativo brasileiro método prático e objetivo, o juiz deve considerar as condições pessoais do ofendido; o seu ramo de atividade; perspectivas de avanço e desenvolvimento na atividade que exercia, ou em outra que pudesse vir a exercer; o grau de suportabilidade do encargo pelo ofensor e outros requisitos, caso a caso. Requisitos que há de valorar com critério de justiça, com predomínio do bom senso, da razoabilidade e da exequibilidade do encargo a ser suportado pelo devedor. Com base nessas premissas, considerando-se a circunstância de que a indenização deve ter, sim, caráter punitivo, penalizando a conduta imprópria, desleixada e negligente, como a adotada pela ré, desestimulando a prática de novos atos ilícitos, é de se entender que o valor da condenação deve ser majorado para R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Ademais, a parte autora informa em recurso que, em que pese a informação presente em peça contestatória (evento 11) de que disponibilizaria o certificado objeto da lide, o mesmo não foi por esta recebido, razão pela qual pugna pela reforma da sentença para que a obrigação de fazer seja julgada procedente. Em análise à contestação e documentos colacionados, se percebe que não há prova concreta de que foi devidamente realizada a entrega do aludido certificado. Por essa razão, entendo por bem determinar que a instituição de ensino demandada comprove a expedição e entrega do certificado de conclusão do curso de Auxiliar Veterinário à Autora, cumprindo com todos os requisitos legais exigidos, em 10 (dez) dias, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais), limitada ao importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), sem prejuízo de majoração deste teto em caso de descumprimento. Por fim, considerando-se a juntada de documentos aos autos pela parte autora que comprovam fartamente o adimplemento regular de todas as faturas, bem como considerando-se que a plena quitação também pode ser extraída de documentos colacionados aos autos pela parte ré (tela sistêmica informando quitação da última parcela pendente), entendo pela declaração de inexistência do débito ora discutido, devendo a parte ré proceder com a devida baixa em seu sistema. Em vista de tais razões, com a devida vênia, voto no sentido de dar parcial provimento ao recurso, para reformar a sentença impugnada e condenar a ré ao cumprimento da obrigação de fazer de entrega do certificado de conclusão do curso de Auxiliar Veterinário à Autora, cumprindo com todos os requisitos legais exigidos, em 10 (dez) dias, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais), limitada ao importe de R$ 3.000,00 (três mil reais), sem prejuízo de majoração deste teto em caso de descumprimento, além da baixa do débito no sistema da acionada e ao pagamento de indenização no montante R$ 3.000,00 (três mil reais), com juros legais a partir da citação, nos termos do art. 405 do Código Civil (adotando o entendimento da maioria, em razão do princípio da colegialidade, não obstante entender em sentido diverso), e correção monetária a partir desta data (Súmula 362 do STJ). Sem condenação ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, consoante o disposto no art. 55 da Lei nº 9.099 /95. É como voto. Sala das Sessões, em 03 de junho de 2020. JUSTINO FARIAS Juiz Relator Documento Assinado Eletronicamente