EMENTA: RECURSO INOMINADO. FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. ABONO DE PERMANÊNCIA. EMENDA CONSTITUCIONAL ESTADUAL 65/2019. NECESSIDADE DE EDIÇÃO DE LEI ESPECÍFICA PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. IMPLEMENTAÇÃO DO BENEFÍCIO QUANDO JÁ EM VIGOR A EMENDA CONSTITUCIONAL. DIREITO À PERCEPÇÃO NÃO CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Submetida a questão a julgamento perante a 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, o ilustre relator, Dr. Wild Afonso Ogawa, votou pelo parcial provimento do Recurso Inominado interposto pelo estado réu, entendendo que a parte autora teria direito a percepção do abono permanência, até a entrada em vigor da Lei Complementar Estadual nº 161, de 30 de dezembro de 2020, sendo esta data o termo final para a percepção do benefício. Respeitosamente, por dele divergir, peço vênia para externar as razões do meu convencimento. 2. Recurso Inominado interposto por Estado de Goiás em razão de sentença proferida pelo 3º Juízo do Núcleo de Justiça 4.0 especializado em matéria de Juizado Especial da Fazenda Pública, que julgou procedente a pretensão inicial. 3. A parte promovente, Agente de Polícia Classe Especial, admitido em 13/03/1997, alegara ter preenchido os requisitos para aposentadoria em 13/04/2020, tendo efetivamente se aposentado em 06/05/2022 (Portaria nº 707, de 02/05/2022, publicada no Diário Oficial nº 23.791, de 06/05/2022), mas, a despeito de requerimento administrativo (procedimento administrativo SEI nº XXXXX00007046535) não recebera os valores do abono de permanência de 13/04/2020 a 06/05/2022. O juízo singular (ev. 16) considerou que a concessão do abono de permanência está vinculada ao preenchimento dos requisitos para a aposentadoria voluntária, permanecendo o servidor em atividade. Entendeu ter a parte promovente demonstrado o preenchimento dos requisitos em 13/04/2020 e se aposentado em 06/05/2022, logo, faz jus ao recebimento do benefício. Condenou o Estado a pagar os abonos de permanência no período pleiteado. Em sede de recurso inominado, aduziu o Estado réu, que os efeitos do Decreto Estadual nº 9.590/2020 não mantém o direito ao abono de permanência para os militares (art. 139, § 5º). 4. Fundamentos do reexame 4.1. Inicialmente, é crível destacar que apesar de a parte recorrente apresentar argumentos sobre ser a parte recorrida militar e não perceber abono de permanência em razão da inaplicabilidade do art. 139, § 5º da Lei Complementar Estadual nº 77/2010 que disciplina o abono de permanência aos militares estaduais, considerando eventuais reflexos da Lei Federal nº 13.954 /2019, denota-se que a recorrida é Agente da Polícia Civil e não da Polícia Militar. 4.2. Ademais, pondera-se que restou incontroverso a data em que a parte autora adquiriu o direito de aposentadoria (13/04/2020). 4.3. Sabe-se que o abono de permanência foi instituído pela Emenda Constitucional nº 41 /2003, que alterou o art. 40 da Constituição Federal , e corresponde ao valor da contribuição previdenciária descontada da remuneração do servidor, desde que este tenha cumprido os requisitos para se aposentar e opte por permanecer em atividade. 4.4. Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 103 , de 12/11/2019 (reforma da previdência) deu nova redação ao § 19 do art. 40 da CF , transformando a concessão do abono de norma de eficácia imediata para norma de eficácia contida, cuja aplicabilidade depende da edição de lei específica, por ente federativo. Confira ? se: ?Art. 40. (?) § 19. Observados critérios a serem estabelecidos em lei do respectivo ente federativo, o servidor titular de cargo efetivo que tenha completado as exigências para a aposentadoria voluntária e que opte por permanecer em atividade poderá fazer jus a um abono de permanência equivalente, no máximo, ao valor da sua contribuição previdenciária, até completar a idade para aposentadoria compulsória. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103 , de 2019).? 4.5. Por sua vez, na esfera estadual, a Emenda Constitucional Estadual nº 65, de 21/12/2019, alterou o art. 97, § 19 da Constituição do Estado de Goias e definiu que, ressalvados os casos de direito adquirido, a partir da publicação da emenda, o abono de permanência, somente, poderá ser concedido por meio da edição de lei formal, de iniciativa do Chefe do Executivo do Estado. 4.6. Sob esse enfoque, verifica-se que a controvérsia objeto da presente demanda reside exatamente na data de entrada em vigor da referida emenda constitucional estadual em detrimento de quando implementado o direito do Reclamante à aposentadoria, uma vez que, de acordo com o peticionante, ele possui o direito de perceber o abono de permanência. 4.7. Logo, denota-se que razão assiste ao recorrente já que o próprio recorrido aduz em sua petição inicial, ter completado os requisitos para aposentar-se em 13/04/2020, ou seja, após a publicação da Emenda à Constituição Estadual nº 65/2019. 4.8. Portanto, como não há lei do Estado de Goiás com previsão de concessão do abono de permanência e por não se submeter o reclamante ao regramento anterior, inexiste o direito da parte autora, impondo-se a reforma da sentença para julgar improcedente o pleito autoral. 4.9. Ainda, cumpre destacar acerca do mandado de segurança nº XXXXX-14.2021.8.09.0000 , impetrado pela Associação dos Procuradores do Estado de Goiás, que buscou o direito de percepção do abono permanência àqueles que adquiriram os requisitos para aposentadoria após a entrada em vigor da Emenda Constitucional Estadual nº 65/19, ou seja, após 30/12/2019. Veja-se in verbis: ?O direito líquido e certo ameaçado, portanto, é o direito dos procuradores do Estado de Goiás que já tenham completado as exigências para aposentadoria voluntária e permaneceram no serviço público de receber o abono de permanência, após 30/12/2019 (data de publicação da Emenda Constitucional Estadual nº 65/2019), nos termos do estabelecido pelo art. 139 da Lei Complementar Estadual nº 77/2010.? 4.10. Após a denegação da segurança pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, o mesmo mandamus foi submetido a apreciação do Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Ordinário nº 69039-GO , que por sua vez, manteve a denegação da segurança dispondo: ?(?) Conforme bem delineado pelo Ministério Público Federal, a norma constitucional que previa a percepção do abono permanência passou a ter eficácia limitada ou restrita, de modo que sua eficácia plena passou a depender de complementação promovida pelo legislador ordinário, o que, entretanto, não ocorreu no caso, afastando, assim, o direito ao benefício. (?) Assim, não merece reforma o aresto recorrido. Ante o exposto, nos termos do art. 34, XVIII, ?b?, do RISTJ, NEGO PROVIMENTO ao recurso. (STJ ? RMS: 69039 , Relator: GURGEL DE FARIA, Data de Publicação: 18/10/2022). 4.11. O TJGO também já se manifestou em situações análogas. Confira-se: EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR ESTADUAL. CONCESSÃO DE ABONO DE PERMANÊNCIA. REGRA TRANSIÇÃO INAPLICÁVEL. REQUISITOS PREENCHIDOS APÓS EDIÇÃO DA EC Nº 65/2019. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. I. Em que pese o exposto no art. 40, § 1º, III, a, exigir a idade mínima de 60 (sessenta) anos para aposentadoria voluntária do servidor público ocupante de cargo efetivo, a EC n.º 47 /2005 estabeleceu regras de transição para a inatividade, dentre elas a que permite a redução etária àquela que contribuiu com a previdência por mais tempo que o necessário. II. Inexistindo excesso no tempo de contribuição, não se há falar em redução da idade do servidor para efeitos da aposentadoria, nos termos da EC nº 47/2007. III. Não se há falar em direito líquido e certo a ser amparado por mandado de segurança posto que o impetrante só implementou o direito à percepção do abono de permanência, quando já estava em vigor a EC nº 65/2019 e, até a edição da norma regulamentadora, o que ainda não ocorreu, não se vislumbra a prática de ato abusivo do Impetrado ao vedar sua concessão. SEGURANÇA DENEGADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Mandado de Segurança Cível XXXXX-92.2022.8.09.0000 , Rel. Des (a). ÁTILA NAVES AMARAL, 1ª Câmara Cível, julgado em 29/09/2022, DJe de 29/09/2022). EMENTA: AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. ABONO DE PERMANÊNCIA. REQUISITOS IMPLEMENTADOS APÓS A EDIÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL ESTADUAL Nº 65 DE 2019. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO VIOLADO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SEGURANÇA DENEGADA. (?) 3. O abono de permanência é um incentivo instituído por força da Emenda Constitucional nº 41 /2003, concedido ao servidor público no âmbito do regime Especial previdenciário, que ao preencher os requisitos para se aposentar voluntariamente, opte por permanecer na ativa até a aposentadoria compulsória. 4. Por sua vez, antes da Emenda Constitucional Federal nº 103 /2019, o artigo 40 , § 19 , da Constituição Federal , assegurava o abono de permanência aos servidores civis, observados os critérios ali inscritos e representava-se como norma autoaplicável e de eficácia plena (EC nº 41 /2003). 4. Com a nova redação dada pela Emenda Constitucional nº 103 /2019 ao artigo citado ( 40 , § 19 , da CF ), o fez norma de eficácia contida, que demanda para sua aplicabilidade, que a União, os Estados e os Municípios editem, de forma facultativa, lei específica para tratar do tema. 5. Em atenção ao que consta na Emenda Constitucional Federal nº 103/2019, o Estado de Goiás editou a Emenda à Constituição Estadual nº 65/2019, que fez constar o § 19, no artigo 97, da CE, estabelecendo a facultatividade na criação do abono de permanência. 6. A Emenda Constitucional Estadual nº 65 de 21/12/2019 foi publicada no Diário Oficial de 30/12/2019. Posteriormente, houve publicação de uma errata, no Diário Oficial em 02/01/2020, acrescentando-se o artigo 5º, com renumeração dos demais. 7. A situação mencionada não estendeu a data da vigência da ECE em comento, por não ter aplicação à espécie o contido no § 3º, do artigo 1º, da LINDB, em razão do artigo em referência disciplinar a organização de unidades gestoras, nada mencionando sobre o abono permanência. Portanto, à mingua de reforma total da Emenda Constitucional Estadual em comento, a sua vigência permanece sendo no dia 30/12/2019. 8. Ao ter o Impetrante implementado o direito à percepção do abono de permanência em 07/01/2020, data posterior à vigência da Emenda Constitucional Estadual nº 65/2019, que se deu a partir de 30/12/2019, ele já não tinha mais direito ao benefício, à mingua de edição de lei neste sentido, de modo que se mostra correta a anulação do deferimento ao pagamento do abono. 8. Não verificado nenhum abuso ou ilegalidade por parte da autoridade tida como coatora, a denegação da segurança é medida que se impõe, com revogação da liminar proferida nesta instância. 9. Sem condenação em honorários advocatícios, por serem incabíveis na espécie, de acordo com o artigo 25 da Lei federal nº 12.016 , de 07 de agosto de 2009, e Súmula nº 512 do excelso Supremo Tribunal Federal e Súmula nº 105 do colendo Superior Tribunal de Justiça. 10. SEGURANÇA DENEGADA. ( Mandado de Segurança nº XXXXX-14.2021.8.09.0000 ; relator Des. Gerson Santana Cintra; publicado em 26/11/2021) 5. Dispositivo. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Sentença reformada para julgar improcedente o pleito autoral. 6. Em razão do resultado do julgamento, inexiste condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios, conforme artigo 55 , caput, da Lei nº 9.099 /95. 7. Advirto que se opostos embargos de declaração com caráter protelatório, será aplicada multa com fulcro no art. 1.026 , § 2º do Código de Processo Civil , se houver nítido propósito de rediscutir o mérito da controvérsia. 8. Oportunamente, remetam-se os presentes autos ao juízo de origem.