EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO DE FAMÍLIA - RECONHECIMENTO DE UNIÃO ESTÁVEL "POST MORTEM" C/C DIREITO REAL DE HABITAÇÃO - PRELIMINARES - SENTENÇA "EXTRA PETITA" E NECESSIDADE DE SUSPENSÃO DO FEITO - REJEIÇÃO - MÉRITO - RELACIONAMENTO PÚBLICO, CONTÍNUO E DURADOURO, QUE PERDUROU ATÉ O FALECIMENTO DO COMPANHEIRO, DO QUAL ADVEIO UM FILHO - BRIGAS E DESENTIMENTOS QUE NÃO INDUZEM À DESCONTINUIDADE DA RELAÇÃO - IMÓVEL QUE SERVIU DE RESIDÊNCIA AO CASAL ATÉ A DATA DO ÓBITO - DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DA COMPANHEIRA SOBREVIVENTE - INEXISTÊNCIA DE CO-PROPRIEDADE EM MOMENTO ANTERIOR AO FALECIMENTO DO PROPRIETÁRIO - REGULARIDADE NA LIMITAÇÃO DO DIREITO DOS TERCEIROS HERDEIROS - RECURSO DESPROVIDO. 1 - Em consonância com o disposto no § 2º , do art. 322 , do Código de Processo Civil , a interpretação do pedido deverá considerar o conjunto da postulação e observar o princípio da boa-fé, motivo pelo qual se a petição inicial versa sobre o reconhecimento do direito real de habitação em favor da companheira sobrevivente, requerendo, ainda, o seu deferimento em sede de tutela de urgência, afigura-se descabido falar que a sentença que o defere tenha desgarrado dos limites objetivos e subjetivos da demanda, unicamente pela ausência de reiteração do expressa do pedido em sede de tutela definitiva. 2 - A existência de outras demandas pleiteando o reconhecimento de uniões estáveis protagonizadas pelo falecido, relativa a períodos anteriores àquele vivenciado pela parte autora, não configura questão prejudicial passível de subordinar a sorte do presente feito, a ponto de impor a paralisação do processo, especialmente quando a questão atinente à alegada (co) propriedade do imóvel sobre o qual recai o pleito do direito real de habitação, pode ser equacionada, sem maiores dificuldades, no presente feito. 3 - A união estável enquanto entidade familiar constitucionalmente reconhecida e, como tal, protegida pelo Estado, pressupõe a existência de um relacionamento atestado por convivência pública, contínua e duradoura, cuja finalidade seja a constituição de família, marcada pelo cuidado mútuo, pelo intuito de constituir um lar onde o casal compartilhe os bônus e os ônus do cotidiano. 4 - A existência de brigas e desentendimentos entre o casal, ainda que na véspera do falecimento do companheiro da parte requerente, configura circunstância insuficiente para infirmar a convivência "more uxório", que perdurou por cerca de dez anos e da qual adveio um filho, especialmente quando, além da continuidade da convivência restar demonstrada pela prova dos autos, com destaque para a testemunhal e a documental, a requerente, assim como seu filho, foram reconhecidos como dependentes do falecido junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social. 5 - O direito real de habitação sobre o imóvel em que residia a família, ainda que integrante do patrimônio particular de um deles, configura instituto de viés social e humanitário vocacionado à promoção do direito fundamental à moradia da companheira sobrevivente, que, em consonância com disposto no art. 1.831 , do Código Civil , implica em limitação do direito de propriedade de terceiros que, na condição de herdeiros do falecido, fazem jus à (co) propriedade da coisa. 6 - A existência de contratos de arrendamento mercantil e de alienação fiduciária em garantia, celebrados no bojo de uniões estáveis protagonizadas pelo falecido em momento anterior àquela vivenciada pela parte autora, não é suficiente para obstar a titularidade exclusiva do imóvel pelo "de cujus", especialmente quando a quitação do financiamento, com a aquisição efetiva, livre e desembaraçada da propriedade pelo devedor, somente ocorreu no curso do último relacionamento, justamente aquele cujo reconhecimento se pretende na demanda ajuizada. Inexistência de co-propriedade do imóvel em momento anterior ao falecimento do titular do domínio, que pudesse obstar o reconhecimento do direito real de habitação em favo