APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONTRATO DE CONSÓRCIO. DEMANDA JULGADA PROCEDENTE. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE PROMOVIDA. POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DA VALIDADE DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS TÃO SOMENTE PARA AFASTAR A MORA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE NO PERÍODO DA NORMALIDADE CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE JUROS CAPITALIZADOS NESTA ESPÉCIE DE CONTRATO. MORA NÃO DESCARACTERIZADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Insurge-se a parte ré contra a sentença de procedência da ação de busca e apreensão, arguindo, em suma, o excesso de cobrança, visto que estaria majorada indevidamente com juros capitalizados, o que leva à descaracterização da mora e consequente improcedência da ação; a necessidade de adequação dos juros de mora cobrados; a não incidência dos juros nas parcelas vincendas; e a possibilidade de discussão no bojo da ação de busca e apreensão da validade das cláusulas contratuais. 2. Com efeito, segundo entendimento pacífico no STJ, admite-se a discussão de cláusulas contratuais em ação de busca e apreensão, como tese de defesa, com o fim de descaracterizar a mora. Portanto, a apreciação das cláusulas contratuais, tratando-se de matéria de defesa, alegada em sede de contestação e em razões recursais, limita-se à verificação da existência da mora, pressuposto para a procedência do pedido em questão. Outrossim, o entendimento pacificado é no sentido de que a descaracterização da mora do devedor somente ocorrerá no caso de reconhecimento de abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização), e desde que não se refiram a encargos acessórios, não descaracterizando a mora se incidentes em período de inadimplência ( REsp XXXXX/RS e REsp XXXXX/SP ). 3. Dessa forma, não cabe aqui analisar a alegada inadequação dos juros de mora ou mesmo multa moratória, tampouco a não incidência dos juros nas parcelas vincendas, pois se tratam de encargos incidentes sobre o período de inadimplência, não tendo portanto o condão de descaracterizar a mora. 4. Em se tratando de contrato de consórcio não há a incidência de capitalização de juros ou mesmo juros remuneratórios, dada a natureza jurídica desse tipo de contrato. Ressalta-se que o valor das parcelas não é pré-fixado contratualmente, sendo apuradas mensalmente, calculadas sobre o percentual do valor do bem de referência, podendo esse valor sofrer variação, de modo a alterar o valor da parcela mensal. Diante dessa concepção, vislumbra-se que o reajuste das parcelas resta vinculado à variação do preço do bem objeto do plano de consórcio. 5. Assim sendo, considerando a inexistência de abusividade de encargos exigidos no período da normalidade contratual, não há que se falar em descaracterização da mora. Por sua vez, caracterizada a mora, correta se mostra a decisão do juízo de primeiro grau que julgou procedente a ação de busca e apreensão do veículo, ante a flagrante inadimplência do devedor e sua efetiva constituição em mora. 6. Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os desembargadores integrantes da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer do apelo para negar-lhe provimento, nos termos do relatório e do voto da relatora, que passam a fazer parte integrante do presente acórdão. Fortaleza (CE), 21 de junho de 2022. MARIA DO LIVRAMENTO ALVES MAGALHÃES Desembargadora Relatora