Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 1ª TURMA RECURSAL CÍVEL E CRIMINAL PROCESSO Nº.: XXXXX-65.2020.8.05.0223 RECORRENTE: RAIMUNDO EVANGELISTA DOS SANTOS RECORRIDO: BANCO BRADESCO S A RELATORA: JUÍZA SANDRA SOUSA DO NASCIMENTO MORENO EMENTA RESPONSABILIDADE CIVIL DE BANCOS E RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RISCO INERENTE A ATIVIDADE BANCÁRIA. EMPRÉSTIMO FRAUDULENTO E SAQUES REALIZADOS NA CONTA BANCÁRIA DA PARTE AUTORA MEDIANTE CARTÃO ELETRÔNICO E SENHA PESSOAL. CONTESTATAÇÃO DA AUTORIA DAS TRANSAÇÕES MENCIONADAS. SENTENÇA DE IMPROCEDENCIA. POSSÍVEL FRAUDE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS CONSISTENTE NA DEVOLUÇÃO DOS VALORES SUBTRAÍDOS DA CONTA DA PARTE AUTORA. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E DANOS MORAIS. PROVIMENTO DO RECURSO. RELATÓRIO Trata-se de recurso Inominado interposto pela parte autora contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos de desconstituição de débito e danos morais formulados na queixa. VOTO Presentes as condições de admissibilidade do recurso uma vez que foi interposto e deferida a justiça gratuita, dentro do prazo legal, consoante dispõe o artigo 42 da lei 9099 /95, conheço do recurso. A lide versa sobre pedido de desconstituição de débito e de indenização por danos materiais e morais, diante da existência empréstimo e saques realizados na conta corrente do autor e por este negada a autoria. Em decorrência das operações bancárias não reconhecidas, foi subtraído da conta do autor o valor de R$ 4.000,00 até a data da queixa, e o mesmo encontra-se com uma dívida decorrente do empréstimo realizado por terceiro. É fato comprovado por documentos a realização do empréstimo com o depósito do valor na conta bancária do autor e posteriormente foi realizado vários saques e transferências na mencionada conta, restando a mesma deficitária. A parte autora contesta as operações bancárias, tanto o empréstimo como os sucessivos saques realizados nos dias que se seguiram ao depósito do valor advindo do empréstimo. A parte autora alega que não efetivou a operação, e que nunca emprestou seu cartão ou informou a senha para outras pessoas. Ou seja, o caso sub judice se restringe a indenização por danos matérias e morais decorrente de operações bancárias efetivado na conta da parte autora, sem o seu consentimento. A não realização das operações bancárias é fato negativo, portanto, impossível a prova pelo autor, que é cliente do banco acionado desde XXXXX-05-2011, não havendo qualquer evidência de que não seja pessoa honesta e cumpridora de suas obrigações, até porque, a única anatoção nos órgãos de restrição ao crédito se refere ao débito impugnado nos autos. Diante da hipossuficiência do consumidor e da impossibilidade de comprovar fato negativo é caso de inversão do ônus da prova, contudo, no caso sub judice, o acionado alega que os saques e empréstimos foram feitos com o cartão e senha do autor, contudo, nenhuma prova foi produzida nesse sentido, nos termos do artigo 373 , II , do CPC . O réu na qualidade de fornecedor de serviço responde independentemente de culpa pelos danos causados, art. 14 do CDC , que estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor em decorrência do risco do empreendimento, consoante entendimento jurisprudencial abaixo : ¿Civil e processual - Saque indevido em conta corrente- Cartão bancário- Responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços- Inversão do ônus da prova- Debate referente ao ônus de provar a autoria do saque em conta corrente, efetuado mediante cartão bancário, quando o correntista, apesar de deter a guarda do cartão, nega a autoria dos saques. Reconhecida a possibilidade de violação do sistema eletrônico e, tratando-se de sistema próprio das instituições financeiras, ocorrendo retirada de numerário da conta corrente do cliente, não reconhecida por este, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade objetiva do fornecedor de serviço, somente passível de ser ilidida nas hipóteses do § 3º. Do art. 14 do CDC . Inversão do ônus da prova igualmente facultada, tanto pela hipossuficiência do consumidor, quanto pela verossimilhança das suas alegações de que não efetuara o saque em sua conta corrente. Recurso não conhecido (STJ-3ªT. REsp XXXXX/RJ - rel. Min. Nancy Andrighi-j. 16.12.2004). Assim, a responsabilidade do recorrente só poderia ser afastada com a comprovação de que houve culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, pois a realização de empréstimos e saques fraudulentos é risco inerente a atividade bancária, devendo o acionado arcar com responsabilidade , reparando danos matérias e morais suportados pela vítima, salvo se comprovar a culpa exclusiva desta. No caso presente não está comprovada a culpa exclusiva da vítima, observamos que não existe qualquer prova nos autos de que a parte autora tenha concorrido para o resultado. O Banco acionado não trouxe aos autos prova de que teria cedido seu cartão e fornecido a senha ao terceiro fraudador. Assim, não há como excluir a responsabilidade do acionado pelo evento danoso, conforme art. 14 § 3º do CDC . Não comprovada a contratação do empréstimo e saque realizados , deve ser considerado inexistente o débito. Os danos materiais restam comprovados nos autos e se resumem aos valores retirados da conta bancária do autor , no valor de R$ 4.000,00, que devem ser devolvidos , incidindo juros de mora desde a citação e correção monetária desde a inicial. A indenização por danos morais é pertinente, diante da falha na prestação do serviço, assim, fixo o valor da indenização em R$4.000,00, que se mostra condizente com a extensão do dano . Diante do exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso da parte autora para: 1. Declarar a inexigibilidade do contrato de empréstimo objeto desta lide, obrigando a parte acionada a interromper as parcelas, caso ainda persistam, no prazo de 30 dias, sob pena da incidência de multa mensal de R$500,00 (quinhentos reais), em conformidade com o disposto no art. 461 , § 4º, do Código de Processo Civil , sem prejuízo da restituição dos descontos realizados após esta sentença, acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e de correção pelo INPC desde a sua ocorrência; 2. condenar a parte acionada a restituir à autora os valores descontados (R$ 4.000,00 ¿ quatro mil reais) referente ao empréstimo declarado inexigível, na forma dobrada, acrescida de juros de mora da ordem de 1% ao mês a partir da citação e de INPC desde o ajuizamento; 3. condenar o réu a pagar à autora a quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a título de danos morais, acrescida de juros de mora da ordem de 1% ao mês a partir da citação e de correção monetária conforme o INPC a partir desta data ( Súmula/STJ 362 ); Deixo de condenar em custas e honorários. Salvador/BA, 28 de março de 2022. Sandra Sousa do Nascimento Moreno JUÍZA RELATORA