ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. AÇÃO DE IMPROBIDADE AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE ALAGOAS EM DESFAVOR DO ENTÃO PREFEITO DO MUNICÍPIO DE MATRIZ DE CAMARAGIBE/AL, POR TER CONTRATADO DIRETAMENTE QUATRO AGENTES PARA SERVIÇO TEMPORÁRIO, MAS COM BASE EM AUTORIZAÇÃO DA LEI MUNICIPAL 328 /1997. CONDENAÇÃO ADVENIENTE DA CORTE ALAGOANA COM ESTEIO EM DOLO GENÉRICO, EM REVERSÃO À SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CONDENAÇÃO INSUSTENTÁVEL, POR NÃO SER POSSÍVEL, EM CASOS TAIS, DESSUMIR O DOLO ESPECÍFICO DO GESTOR PÚBLICO NAS CONTRATAÇÕES, NOS TERMOS DO TEMA 1.108 JULGADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA RESTABELECIDA. 1. Trata-se, na origem, de ação civil pública por ato de improbidade administrativa apresentada pelo Ministério Público do Estado de Alagoas em desfavor do então prefeito do Município de Matriz de Camaragibe/AL, em razão de suposto ato ímprobo, consistente na nomeação irregular de agentes públicos sem prévio certame. Cuidou-se de contratação direta de quatro agentes que remonta aos anos de 1997 a 2001, sendo um para a função de censor escolar, dois para servente de pedreiro e uma para agente de limpeza urbana. A questão prendeu a atenção do órgão acusador quando os referidos agentes foram buscar, na Justiça do Trabalho, verbas alusivas à rescisão dos contratos, operada em 2005 e 2006. 2. A imputação se deu no tipo do art. 11 , V , da Lei 8.429 /1992, alusiva à ofensa a princípios reitores administrativos por frustração de licitude de concurso público. Houve sentença absolutória, na qual o douto magistrado de primeiro grau entendeu que eventual realização de concurso público para ocupação de apenas quatro vagas, sendo uma de censor escolar, duas de servente de pedreiro, e uma de gari, pelo Município de Matriz de Camaragibe/AL, já carente de recursos, implicaria em real afronta ao Princípio da Eficiência (fl. 532). 3. Lado outro, o acórdão do egrégio TJAL reformou a sentença, para aplicar, ao ex-gestor, a Lei 8.429 /1992, ao entendimento de que a contratação sem determinação de tempo, perdurando-se por longo período e sem qualquer demonstração da real excepcionalidade daquela necessidade, é apta a demonstrar o dolo genérico como integrante da conduta administrativa, tendo em vista que o Recorrido, deliberadamente, frustrou a licitude do processo licitatório diante da não observância das regras legais e morais que lhe são ínsitas, ainda que não se tenha efetivamente demonstrada a lesão aos cofres público (fl. 599). 4. Ao receber o recurso especial do então prefeito, solução unipessoal desta Corte Superior manteve o juízo condenatório, ao anotar que a Corte local reconheceu o dolo apto a justificar a condenação, no presente caso. Entendimento diverso, conforme pretendido, implicaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos (fl. 719). Persiste o então alcaide, na insurgência dirigida ao colegiado, em argumentar a ausência do fato típico ímprobo. 5. De fato, a questão acerca das contratações diretas e temporárias efetuadas por gestores da coisa pública, especialmente os mandatários do poder político, têm sido prodigamente analisada pelo Superior Tribunal de Justiça, sobretudo nas situações em que ronda a narrativa factual a existência de lei municipal que autorize o administrador a efetuar as contratações. 6. Em casos tais, tradicionalmente, o Tribunal da Cidadania tem entendido que não é possível identificar a presença do chamado dolo genérico, justamente por haver chancela legal que aparta a exigência de prévio concurso público para o ato administrativo de contratação. Dada a multiplicidade de casos símiles, e frente à já conhecida compreensão da Corte Superior, a Primeira Seção do STJ afetou, para julgamento repetitivo, os REsp XXXXX/TO , REsp XXXXX/SE , e REsp XXXXX/MA , todos de relatoria do Ministro GURGEL DE FARIA, que deram origem ao Tema 1.108. 7. No aludido tema repetitivo, julgado em 11.05.2022 e com publicação de acórdão em 24.05.2022, proclamou-se a tese de que a contratação de servidores públicos temporários sem concurso público, mas baseada em legislação local, por si só, não configura a improbidade administrativa prevista no art. 11 da Lei 8.429 /1992, por estar ausente o elemento subjetivo (dolo) necessário para a configuração do ato de improbidade violador dos princípios da administração pública. 8. Como ratio decidendi, o condutor do voto, Ministro GURGEL DE FARIA, registrou que o afastamento do elemento subjetivo de tal conduta dá-se em razão da dificuldade de identificar o dolo genérico, situação que foi alterada com a edição da Lei n. 14.230 /2021, que conferiu tratamento mais rigoroso para o reconhecimento da improbidade, ao estabelecer não mais o dolo genérico, mas o dolo específico como requisito para a caracterização do ato de improbidade administrativa. 9. No caso concreto, observa-se que a condenação do então prefeito levou em consideração que o agente público, mesmo lançando mão da Lei 328 /97, editada pela municipalidade alagoana, teria pautado suas providências sob o móvel do dolo genérico. Porém, cuida-se elementar que já não era aceita pelo entendimento do STJ na situação analisada (contratação direta com esteio em lei municipal autorizadora), circunstância realçada pelo advento das alterações na Lei 8.429 /1992, processadas pela Lei 14.230 /2021. 10. Sobreleva perceber que a modificação legal passou a exigir, para qualquer demanda de improbidade, o dolo específico do agente, no intuito de reforçar a necessidade de ser identificada a especial nota de má-fé do administrador público como causa material de condenação às sanções da Lei 8.429 /1992, evitando-se implicar o agente público em somenos. 11. Por razões tais, incide inteiramente à espécie o desfecho do julgado repetitivo do Superior Tribunal de Justiça, para ser proclamada a absolvição do então alcaide da urbe alagoana. 12. Agravo interno provido para conhecer do agravo e prover o recurso especial da parte ré.