EMENTA: APELAÇÃO. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. CRIME CONTRA A HONRA. DATA DO FATO POSTA NO TCO JUNTADO COM A INICIAL. ANIMUS DIFFAMANDI NÃO CONFIGURADO. DOLO ESPECÍFICO NÃO DEMONSTRADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Admissibilidade. Conforme dispõe o art. 82 , § 1º da Lei nº 9.099 /95 a apelação será interposta no prazo de dez dias. A intimação da apelante se dera em 27 de maio de 2022 (evento 9). É tempestivo o recurso interposto no dia 6 de junho de 2022 (evento 12). Comprovante de preparo no mesmo evento. Contrarrazões no evento 21. Recurso conhecido. 2. Os fatos conforme a queixa-crime ? evento 1. [?] o querelado tem propagado à população das comunidades próximas, bem como aos proprietários dos imóveis contíguos ao que hoje possui a CGH Diamantino edificada, fatos específicos, falsos e danosos à honra objetiva da querelante. Em primeiro lugar, o querelado fixou cartazes em locais próximos à CGH, implicando que a edificação desta pela querelante teria causado danos às belezas naturais da região. [?] Além disso, conforme consta no TCO anexo a esta queixa-crime (doc. 3), o querelado narrou a terceiros que a edificação das CGH Diamantino levaria à extinção do fluxo de água de uma cachoeira do Rio Diamantino. [?] Contudo, as práticas do querelado, demonstradas acima, foram consumadas e não cessaram, com claro intuito de difamar a imagem da querelante perante a comunidade local, da qual a querelante depende para a continuidade da prestação de serviços de eletricidade pelas próximas décadas, diante da instalação da CGH Diamantino, lesando dolosamente sua honra objetiva, como será pormenorizado a seguir. [?] Diante do exposto, a querelante requer: 1. Que a presente ação penal privada seja recebida e que o querelado, Sávio Roberto Resende seja citado, processado e, ao final, condenado como incurso no art. 139 do CP , com causa de aumento de pena de um sexto a um terço nos moldes do art. 71 do CP ; 2. A produção de todas as provas em direto admitidas, nos moldes do art. 369 do CPC . 3. A decisão recorrida ? evento 8. O juízo de origem julgara rejeitando a queixa-crime. Asseverara o magistrado que uma vez que a queixa-crime não informara as datas das condutas do querelado tidas como ofensivas, haveria óbice para a análise do prazo decadencial. Ademais, não vislumbrara o animus diffamandi nas condutas do querelado descritas na queixa, tratando-se de mero protesto ou crítica à implantação do projeto hidrelétrico por supostamente causar danos ao meio ambiente. Prosseguira afirmando que é questão para ser resolvida no âmbito do direito civil e não na esfera criminal, existindo processo neste sentido na 3ª Vara Cível daquela comarca. 4. Da apelação ? evento 12. Inconformado a querelante interpusera recurso de apelação arguindo que as datas restaram claras na queixa-crime, mais especificamente, o dia 16 de julho de 2021, às 18h30 e o dia 17 de julho de 2021, às 11h00. Asseverara que também no TCO constaria a data de 16 de julho como da prática do ato ilícito. No que respeita à tipicidade da conduta aduzira que não merece prosperar a conclusão de inexistência de animus diffamandi já que, conforme suas palavras, os fatos narrados no caso concreto, por si só, possuem o potencial danoso, como já discutido na queixa -crime. Ou seja, a sua divulgação é meio através do qual o apelado poderia causar danos ? quiçá irreparáveis ? à imagem da apelante, sendo que a ocorrência desses danos é questão que foge ao efeito devolutivo do presente recurso. 5. Das contrarrazões ? evento 21. De seu turno o querelado sustentara que a queixa-crime não atende aos requisitos de exigência legal do artigo 44 do Código de Processo Penal , vez que não informara a data do cometimento das condutas ofensivas supostamente praticadas. Sustentara correto o entendimento sentencial de não configuração do animus diffamandi, tratando-se de mero protesto ou crítica à implantação do projeto hidrelétrico. 6. Do parecer ministerial nas turmas recursais ? evento 30. De seu turno o órgão ministerial com assento nas turmas recursais apresentara parecer afirmando que, analisando a queixa-crime é possível verificar com nitidez que não há precisão de data da ocorrência dos fatos. Em que pese o apelante afirmar que as datas das práticas das condutas estão claras na queixa-crime, observa-se que há tão somente a menção das datas registradas no Termo Circunstanciado de Ocorrência ? TCO. Ademais, a exigência de indicação exata do fato imputado, com precisão de data da sua ocorrência, encontra-se na linha de aplicação do princípio constitucional da ampla defesa, caracterizando cerceamento de defesa sua ausência. Neste prumo, restaria evidente a inépcia da inicial. No que concerne ao animus diffamandi, arguira o órgão ministerial que o apelado agira com intenção de criticar e protestar contra a obra de grande impacto ambiental, cuja relevância social é expressamente determinada pela lei ao condicionar as licenças estatais à prévia realização de audiências públicas. 7. Da inépcia da inicial. Determina o art. 41 do Código de Processo Penal ? CPP : A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. É certo que a indicação da data dos fatos é circunstância importantíssima para o processo penal, seja pela possibilidade da defesa apresentar algum álibi seja para a contagem de prazo decadencial/prescricional. No caso em exame verifica-se que a notícia de datas somente existe em trechos transcritos do TCO, não havendo na peça acusatória qualquer menção. De outra via o TCO juntado com a exordial deixara claro: Data/Hora do Fato: 16/07/2021 18h30. Não se olvide que o acusado se defende dos fatos a ele imputados. Uma vez havendo expressa referência da data dos fatos no TCO, não há que se falar de inépcia da inicial neste aspecto. Na esteira deste entendimento: QUEIXA-CRIME - EMENDA DA INICIAL - AMPLA DEFESA DO QUERELADO. A queixa-crime deve ser recebida quando atendido os requisitos do art. 41 do CPP . Não há que se falar em emenda da inicial em face da ausência da data do fato delituoso, quando esta data se encontra consignada no termo circunstanciado que instrui a inicial. A ampla defesa do querelado não resta prejudicada ante a ausência da data do fato delituoso na peça inicial. Sentença reformada (TJ-DF AC XXXXX). 8. Do animus diffamandi. Para a configuração dos crimes contra a honra, exige-se demonstração mínima do intento positivo e deliberado de ofender a honra alheia (dolo específico). Note-se que o resultado esperado pelo agente é afetar a boa reputação da pessoa. De outra banda, não incorre no crime ? por falta de dolo ? aquele que age com intenção de brincar (animus jocandi), aconselhar (animus consulendi), narrar fato próprio da testemunha (animus narrandi), corrigir (animus corrigendi) ou defender direito (animus defendendi). No caso em julgamento fora imputada ao querelado a prática da conduta tipificada no art. 139 do Código Penal , qual seja, difamação, isto em razão do inconformismo deste (querelado), com a construção de obra civil que, no seu entender, estaria a comprometer o meio ambiente e o fornecimento de água à população. Não se constata aqui o animus diffamandi mas sim o animus defendendi, o que seria suficiente para afastar a conduta delituosa, elementar do crime na medida em que o contexto em que foram praticadas as condutas levam à conclusão de que o objetivo era de obstar o prosseguimento de obra e não de atentar contra a honra da pessoa jurídica. Em assim sendo, uma vez não constatado o dolo específico inerente ao tipo penal, a conduta não tangencia a esfera penal. Na esteira deste entendimento julgados do STJ: [?] IV - É jurisprudência firme desta eg. Corte Superior de Justiça que 'Nos crimes contra a honra, além do dolo, deve estar presente um especial fim de agir, consubstanciado no animus injuriandi vel diffamandi, consistente no ânimo de denegrir, ofender a honra do indivíduo [...] ( HC XXXXX/AL , Quinta Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho , DJe de 22/6/2009). V - Na denúncia oferecida não há elementos que evidenciem a intenção de ofender a vítima. Nesse caso, afigura-se a atipicidade da conduta com a conseqüente falta de justa causa para a ação penal. VI - Na espécie, ainda que se reconheça a existência de críticas (animus criticandi) à atividade desenvolvida pelo magistrado, não se pode perder de perspectiva a orientação desta eg. Corte de que a prática do delito de calúnia pressupõe a existência de um objetivo próprio, qual seja, a intenção de ferir a honra alheia (animus diffamandi vel injuriandi). 'A denúncia deve estampar a existência de dolo específico necessário à configuração dos crimes contra a honra, sob pena de faltar-lhe justa causa, sendo que a mera intenção de caçoar (animus jocandi), de narrar (animus narrandi), de defender (animus defendendi), de informar ou aconselhar (animus consulendi), de criticar (animus criticandi) ou de corrigir (animus corrigendi) exclui o elemento subjetivo e, por conseguinte, afasta a tipicidade desses crimes"( HC XXXXX/MT , Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz , DJe de 16/11/2012)... omissis... ' ( RHC XXXXX/SC , Rel. Ministro Felix Fischer , Quinta Turma, DJe de 15.5.2015.). No caso dos autos a queixa-crime não lograra demonstrar o dolo específico no intuito de denegrir, razão pela qual não merece reparos a sentença que não reconhecera o animus diffamandi, rejeitando a peça acusatória. 9 Dispositivo. Recurso conhecido e desprovido. Sem honorários de sucumbência.