RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. MÉRITO. FRACIONAMENTO INDEVIDO DE LICITAÇÃO DESTINADA À LOCAÇÃO DE VEÍCULOS. APELANTE MEMBRO DA COMISSÃO PERMANENTE DE LICITAÇÃO. IMPRESCINDIBILIDADE DO ELEMENTO SUBJETIVO CONSISTENTE NO DOLO ESPECÍFICO. AUSÊNCIA DE PROVA DO DOLO E DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. 1. Trata-se de apelação cível interposta contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Crateús, que julgou procedente o pedido da presente ação civil pública por ato de improbidade administrativa, proposta pelo Ministério Público do Estado do Ceará em desfavor da ora apelante e outros. 2. DA PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO. 2.1. Nas razões recursais, alega a apelante, preliminarmente, a ocorrência da prescrição, com fundamento no art. 23 , I , da Lei de Improbidade Administrativa , isso porque decorreram mais de 05 (cinco) anos entre a sua exoneração do cargo comissionado de Secretária Executiva da Comissão Permanente de Licitação do Município de Croatá e o ajuizamento da presente ação. 2.2. Nesse tocante, há de se observar que se trata de matéria preclusa, uma vez que a alegada prescrição foi afastada pelo juízo a quo por meio de decisão interlocutória saneadora e não por sentença, não havendo, por outro lado, a interposição do competente recurso de agravo de instrumento. 2.3. Sendo assim, não há como ser conhecida a preliminar de prescrição, dada a preclusão consumativa da matéria. Precedentes do STJ. 3. DO MÉRITO. 3.1. Quanto ao mérito, extrai-se dos atos que o juízo a quo, com fundamento no art. 10 , inciso VIII , da Lei de Improbidade Administrativa , entendeu que a apelante praticou atos de improbidade que importaram em prejuízo ao erário, isso porque, na qualidade de membro da Comissão Permanente de Licitação do Município de Croatá, não se opôs ao fracionamento de licitação destinada à locação de veículos, no valor de R$ 141.000,00 (cento e quarenta e um mil reais), o que equiparou à dispensa de licitação. Considerou o magistrado, ainda, que, para a configuração do ato ímprobo, basta o dolo genérico, sendo, ademais, presumido o dano ao erário (in re ipsa). 3.2. No caso em exame, deve-se atentar para o que disciplina a nova Lei nº 14.230 /2021, que introduziu profundas modificações na Lei de Improbidade Administrativa . Com efeito, atualmente a nova regra é no sentido da obrigatoriedade de prova do dolo em algumas situações, a exemplo da previsão do artigo 10 , VIII , da LIA , que trata da dispensa indevida de licitação. Anteriormente, para a configuração do artigo 10, bastava que a conduta, dolosa ou culposa, ensejasse algum prejuízo, mesmo que hipotético, ao erário, a exemplo de realização de compras sem o devido processo licitatório. Por sua vez, o inciso VIII preconizava que frustrar a licitude do processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente, seria suficiente para a configuração do ato ímprobo. 3.3. Ocorre que, hodiernamente, essa conduta deve acarretar ¿efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei¿ (art. 10, caput). Ademais, a atual redação do inciso VIII exige que tal dispensa acarrete ¿perda patrimonial efetiva¿, o que não ficou demonstrado nos autos. 3.4. A necessidade de prova da ocorrência de dano efetivo ao patrimônio público para a aplicação das sanções previstas na LIA , relativamente às condutas previstas no art. 10, também está expressa no art. 21, inciso I, da mesma lei. 3.5. Na espécie examinada, forçoso admitir que não há provas do dolo específico e nem da perda patrimonial efetiva, pelo que não se pode imputar à ora recorrente a conduta descrita no artigo 10 , VIII , da LIA . Esse, aliás, é o entendimento pacífico deste e. Tribunal de Justiça em situações análogas. 3.6. Assim, ante a modificação legislativa acima explicitada e a ausência de comprovação do dolo específico e do dano efetivo na hipótese ora examinada, impõe-se o provimento do presente recurso. 4. Apelo parcialmente conhecido e, nesta extensão, provido. Sentença reformada em parte. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer em parte do recurso de apelação para, nesta extensão, dar-lhe provimento, tudo nos termos do voto do Relator. Fortaleza, data e hora indicadas pelo sistema. Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR LUIZ EVALDO GONÇALVES LEITE Relator