EMENTA: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SITE DE VENDA DE PASSAGENS. CANCELAMENTO DO VOO. INOCORRÊNCIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA AGÊNCIA DE TURISMO. CARACTERIZAÇÃO DA CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. ILEGITIMIDADE DECLARADA DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA REFORMADA DE OFÍCIO PARA O FIM DE DECLARAR A ILEGITIMIDADE PASSIVA DA RECLAMADA. 1. Na inicial os reclamantes contam que adquiriram passagens aéreas através do site da reclamada com destino ao Rio de Janeiro para uma festa de despedida de solteiro com data de embarque em 23/05/2019 em Goiânia as 14:55 com escala em Guarulhos e chegando no Rio de Janeiro-Galeão as 18:45; e o retorno em 26/05/2019 as 10:25 com escala em Guarulhos, e chegando em Goiânia as 14:05 do mesmo dia. Contam que após a compra a AVIANCA, companhia aérea contratada, cancelou vários voos em virtude do processo de recuperação judicial. Informa que tentou trocar as passagens através de contatos com a reclamada, mas não obteve êxito, sendo-lhe ofertada a possibilidade de estorno. Dizem que negaram receber o estorno em razão do valor ser insuficiente para aquisição de novas passagens em outra cia. Narram que em virtude do compromisso firmado naquela data não poderiam cancelar a viagem, foram, portanto, instruídos a chegar várias horas antes do embarque para tentar o remanejamento em outras companhias aéreas. Após insistência dos reclamados, foram reacomodados em outro voo, porém, com saída no Aeroporto de Brasília as 14:00, com distância aproximada de 200km do aeroporto de Goiânia. Nesse ponto se iniciou outra celeuma, pois as Rés se negaram em fornecer o transporte, sendo que o transfer entre os aeroportos ocorreu às expensas dos requerentes, no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), conforme recibo anexo. Já no retorno também foram ao aeroporto com antecedência ao horário do voo adquirido e foram reacomodados depois de muita insistência em voo com destino à Brasília as 17:05 diverso do originalmente contratado (Goiânia) novamente tiveram que contratar o serviço de táxi às suas expensas, este no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais), conforme recibo anexo, chegando na cidade de Goiânia. Informam que não receberam qualquer assistência em relação a alimentação. A vista disso pleiteiam a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais e materiais. 2. Na origem, em evento 26, o juiz singular julgou procedente a restituição na importância de R$ 800,00 atualizados monetariamente (pelo INPC) desde o ajuizamento da ação (Lei 6.899 /1981) e acrescidos de juros legais (1% ao mês) a partir da data da citação ( Novo CPC 240) e de outros R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de reparação moral, atualizados monetariamente (INPC) e acrescidos de juros legais (1% ao mês) a partir da data da publicação da sentença. Inconformados os reclamados apresentaram recurso inominado em evento 30. Pleiteiam a restituição dos valores gastos com alimentação e também a majoração da indenização por danos morais. 3. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, devendo a controvérsia ser solucionada sob o prisma do sistema jurídico autônomo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078 /1990), que, por sua vez, regulamenta o direito fundamental de proteção do consumidor (artigo 5º, inciso XXXII, da Constituição Federal). 4. A teoria do risco do negócio ou atividade é a base da responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor , devendo proteger a parte mais frágil da relação jurídica, o consumidor. Isso porque, como se sabe, a segurança dos serviços prestados constitui típico risco do empreendimento desenvolvido, não podendo ser transferido a terceiros. 5. Cabe mencionar que, a responsabilidade do fornecedor do serviço é objetiva, sendo responsável pelos danos causados aos consumidores, independentemente de culpa. Conforme o§ 3º do referido artigo 14 , do Código de Defesa do Consumidor , o fornecedor de serviço somente não será responsabilizado se provar ?que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste? ou ?a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro?. 6. É certo que a Recorrente participou do serviço prestado à Recorrida, intermediando a venda de passagens aéreas, no entanto, a responsabilidade da empresa de turismo cessou quando os bilhetes foram expedidos, não cabendo à Recorrente fiscalizar o cumprimento do contrato de transporte aéreo pela companhia aérea, mas sim ao ente público (art. 22 do CDC ) que concedeu a exploração. 7. Diferentemente de outros casos já tratados por esta relatoria em relação a cancelamento de voos por parte da empresa Avianca, neste estudo os recorridos narram que não tinham interesse no cancelamento da viagem ou o estorno dos valores, portanto foi opção dos consumidores não providenciar outra passagem através de outra companhia aérea mesmo com a ciência de que a Avianca não mais operava no Aeroporto de Goiânia. 8. A empresa recorrente foi diligente e tentou atuar dentro de suas possibilidades no momento, como remarcar para outra data ou estornar o valor pago pelas passagens. Contudo, os reclamantes por sua conta e risco não aceitaram nenhuma das propostas e resolvera arriscar comparecer no aeroporto no dia da viagem e embarcar, logo a Submarino Viagens não pode arcar com nenhum dissabor sofrido pelo reclamante, já que cumpriu com presteza a suas obrigações. 9. Analisando os presentes autos, entendo que não se constatou nenhum defeito na prestação de serviço contratada entre a as partes, posto que as passagens aéreas foram regularmente emitidas, cumprindo, assim, a empresa Recorrente com seu encargo de intermediação da compra dos bilhetes de passagem, não lhe incumbindo responsabilidade quanto ao cumprimento do contrato de transporte aéreo. 10. Nota-se que, o caso em apreço não se trata de venda de pacote turístico, hipótese em que a agência de viagens assume a responsabilidade de todo o roteiro da viagem contratada. A defesa do consumidor não pode ser tal que ultrapasse os limites do ponderável, implicando na não observação das regras que limitam ou que excluem a responsabilidade, como estabelecido no art. 14, § 3º, incisos I e II, do Código de Defesa ao Consumidor. 11. Insta salientar, por oportuno, que o Superior Tribunal de Justiça somente admite a responsabilidade solidária das agências de turismo quanto a comercialização de pacotes de viagens, no caso, o serviço prestado pela agência de turismo foi, exclusivamente, a venda de passagens aéreas, circunstância que afasta a sua responsabilidade pelo efetivo cumprimento do contrato de transporte aéreo. Portanto, a sentença de origem merece reforma. 12. Colaciono a seguir um dos julgados do Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRANSPORTE AÉREO. INEXECUÇÃO DOS SERVIÇOS PRESTADOS. NÃO OCORRÊNCIA DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA AGÊNCIA DE TURISMO. CARACTERIZAÇÃO DA CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. INCIDÊNCIA DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO § 3º , I , II , DO ART. 14 DO CDC . ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM RECONHECIDA. 1. No pleito em questão, os autores contrataram com a empresa de turismo a compra e venda de passagens aéreas Brasília - Fortaleza, sendo que tal serviço, como restou demonstrado, foi regularmente prestado. Comprovado, também, que os autores não puderam utilizar os bilhetes da empresa TRANSBRASIL, em razão desta interromper seus serviços na época marcada, não efetuando, assim, os vôos programados. 2. Não se tratando, in casu, de pacote turístico, hipótese em que a agência de viagens assume a responsabilidade de todo o roteiro da viagem contratada, e tendo, portanto, inexistido qualquer defeito na prestação de serviço pela empresa de viagens, posto que as passagens aéreas foram regularmente emitidas, incide, incontroversamente, as normas de exclusão de responsabilidade previstas no art. 14 , § 3º , I e II , do CDC . Reconhecimento da ilegitimidade passiva ad causam da empresa de viagens, ora recorrente. 3. Recurso conhecido e provido. ( REsp XXXXX/RR , Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI , QUARTA TURMA, julgado em 26/09/2006, DJ 06/11/2006, p. 332.13. A Ilegitimidade passiva pode ser declarada em qualquer grau de jurisdição de ofício por ser questão de ordem pública. Neste sentido entendimento do STJ: "RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. NATUREZA SIMILAR AO RECURSO DE APELAÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. DECRETAÇÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO SECRETÁRIO DE ESTADO DO PLANEJAMENTO E FAZENDA. IPESC. AUTARQUIA ESTADUAL. PERSONALIDADE PRÓPRIA. 1. Tendo em conta a devolutividade do recurso ordinário em mandado de segurança, cujo paradigma é a apelação, pode o Superior Tribunal de Justiça conhecer toda a matéria alegada na impetração, mesmo que não tenha sido apreciada pelo Tribunal de origem, principalmente aquela de ordem pública, que deve ser examinada de ofício, a qualquer tempo. 2. Cabendo, com exclusividade, ao Instituto de Pensão do Estado de Santa Catarina - IPESC, autarquia de previdência e assistência social, com personalidade jurídica própria que goza de autonomia administrativa e financeira, manter a aposentadoria do impetrante, não há, quanto a esta obrigação, solidariedade do Estado, restando caracterizada a ilegitimidade passiva do Secretário de Estado do Planejamento e Fazenda do Estado de Santa Catarina. 3. Diante da exclusão da relação processual da autoridade declarada ilegítima para figurar no pólo passivo da ação mandamental, resta manifesta a incompetência do Tribunal de Justiça Estadual para processar e julgar mandado de segurança contra ato do Presidente do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina. 4. Recurso parcialmente provido para, de ofício, anular o acórdão impugnado e determinar a remessa dos autos ao Juízo de primeiro grau competente para o julgamento do mandamus."( RMS 11771 / SC RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2000/XXXXX-0, Rel. Min. PAULO GALLOTTI , Data do Julgamento 10/02/2004) 14. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA reformar a sentença proferida, no sentido de reconhecer a ilegitimidade passiva ad causam da parte Recorrente, com fulcro no art. 14 , § 3º do Código de Defesa do Consumidor .15. Condeno a parte reclamante a pagar todas as custas do processo e honorários adocatícios que fixo em 10% sobre o valor dado à causa, corrigido monetariamente desde a data do protocolo da inicial e até a data do efetivo pagamento. Suspensa, entretanto a cobrança, nos termos do § 3º do art. 98 do CPC .