E M E N T A PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. MILITAR DA MARINHA. PORTADOR DE HIV. ASSINTOMÁTICO. DIREITO À REFORMA EX OFFICIO RECONHECIDO. REMUNERAÇÃO DA PATENTE OCUPADA NA ATIVA. TEMA 1.088 DO STJ. ISENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA A PARTIR DA REFORMA. TEMA 1.037 DO STJ. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. No caso vertente, a ação foi ajuizada com o objetivo de que fosse reconhecido o direito do autor à reforma militar, com os proventos do grau superior imediato, e isenção de imposto de renda, tendo em vista ter sido diagnosticado como HIV positivo. 2. Na sentença recorrida, o MM. Juiz de primeira instância julgou improcedente o pedido, entendendo “que não basta ao militar ser soropositivo para fazer jus à reforma. Necessário que sobrevenha, em razão de ser portador do vírus HIV, incapacidade total e definitiva para o labor, conforme previsto no caput do artigo 108 da lei 6.880/1980” (ID XXXXX - Pág. 268). 3. O Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais nº 1.872.008/RS , 1.878.406/RJ e 1.901.989/RS , sob a sistemática dos recursos repetitivos, Tema 1.088, fixou a seguinte tese: “O militar de carreira ou temporário - este último antes da alteração promovida pela Lei 13.954 /2019 -, diagnosticado como portador do vírus HIV, tem direito à reforma ex officio por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas, independentemente do grau de desenvolvimento da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - SIDA/AIDS, porém, sem a remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediatamente superior ao que possuía na ativa, se não estiver impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho, na forma do art. 110 , § 1º , da Lei 6.880 /80."4. Colhe-se dos autos que é fato incontroverso que o apelante foi diagnosticado como portador do vírus HIV quando ainda se encontrava exercendo o serviço militar, o que se verifica em documentos oficiais da própria Marinha, ao conceder ao autor licença saúde. Por tal motivo, restou dispensado laudo médico oficial, conforme consignado na sentença vergastada. 5. Consoante os exames acostados aos autos, o diagnóstico do autor quanto ao vírus HIV positivo foi realizado em 2012. 6. Ademais, conforme o documento de ID XXXXX - Pág. 80, datado de outubro de 2012, a conclusão de inspeção de saúde foi no sentido de considerar o apelante incapaz temporariamente para o serviço militar. 7. No caso vertente, incide a norma prevista no artigo 1º , inciso I, alínea c, da Lei nº 7.670 /1988, que dispõe que a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - SIDA/AIDS é considerada, para os efeitos legais, como causa que justifica a reforma militar, conforme o artigo 108 , inciso V , da Lei nº 6.880 /1980. 8. Antes da alteração implementada pela Lei nº 13.954 /2019, o Estatuto dos Militares não trazia distinção de categoria de serviço (militar de carreira ou temporário) para fins de reforma por incapacidade (artigo 106, inciso II), considerando, à época, como incapacitantes “outras moléstias que a lei indicar” (artigo 108, V). O diagnóstico apresentado pelo autor, ora apelante, é considerado incapacitante, nos termos do artigo 1º , I, c, da Lei 7.670 /88. 9. A lei de regência não traz qualquer distinção entre pessoas “sintomáticas” ou “assintomáticas”, inexistindo discricionariedade para a Administração realizar ressalvas quanto a este ponto. 10. Na hipótese dos autos, o autor, militar da ativa da Marinha do Brasil, foi diagnosticado como portador do vírus HIV em 2012, antes da alteração promovida pela Lei nº 13.954 /2019. 11. Nesse panorama, conforme entendimento firmado pelo C. STJ, no julgamento do Tema Repetitivo 1.088, o autor faz jus à reforma ex officio por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas, mesmo que assintomático, independentemente do grau de desenvolvimento da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida - SIDA/AIDS. 12. Logo, cabível a reforma do autor a partir de 11/2012, conforme postulado, nos termos do artigo 106 , II , c/c o artigo 108 , V , ambos do Estatuto dos Militares , c/c o artigo 1º , I, c, da Lei nº 7.670 /1988. 13. No entanto, considerando que o autor permaneceu na ativa, com sucessivos licenciamentos para tratamento de saúde, deve ser feita a dedução dos valores recebidos a título de remuneração durante o período concomitante, a fim de evitar pagamento em duplicidade e enriquecimento sem causa do apelante. 14. Compulsando os autos, verifica-se que não restou comprovada a incapacidade laborativa do autor para qualquer trabalho. Com efeito, o fato de o autor ser portador do vírus HIV, por si só, não tem o condão de ensejar a sua incapacidade laboral total e permanente para toda e qualquer atividade, militar ou civil. 15. Portanto, à luz do que decidiu o C. STJ no julgamento do Tema 1.088, o autor não faz jus ao cálculo da remuneração com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediatamente superior, na medida em que, conforme se colhe dos autos, não está impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho, na forma do art. 110 , § 1º , da Lei 6.880 /1980. 16. Nesse contexto, o autor faz jus à reforma com a remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico que possuía quando estava na ativa em novembro de 2012. 17. Sobre o pleito de isenção de imposto de renda, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais Repetitivos nº 1.814.919/DF e REsp XXXXX/PI, Tema 1.037, firmou a tese de que a isenção do Imposto de Renda prevista no artigo 6º , inciso XIV , da Lei nº 7.713 /1988 não é aplicável aos rendimentos de portador de moléstia grave que esteja no exercício da atividade laborativa. 18. Portanto, o termo inicial para a isenção de Imposto de Renda deve ser a data em que o autor passar formalmente para a reserva, ou seja, novembro de 2012. 19. Destarte, é caso de provimento parcial da apelação do autor, para: (i) condenar a União a promover sua reforma desde novembro/2012, com os consectários legais, calculando-se a remuneração, porém, sem incidência do 110, §§ 1º e 2º, c, da Lei 6.880 /80, descontando-se os valores recebidos concomitantemente pelo autor enquanto esteve na ativa; (ii) reconhecer o direito do autor à isenção de Imposto de Renda sobre os proventos da reforma, a partir de 11/2012. 20. Condena-se a União ao pagamento de honorários advocatícios na base de 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação. 21. Considerando que a condenação judicial em tela refere-se a servidor público militar e envolve a Fazenda Pública, a incidência de juros de mora e de correção monetária deve observar os seguintes parâmetros: “(a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês (capitalização simples); correção monetária: índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês; correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção monetária: IPCA-E” (Tema Repetitivo 905 do STJ, Tese 3.1.1, e Tema 810 de Repercussão Geral do STF). A partir de 09/12/2021, conforme o art. 3º da EC113/2021, sobre o capital “haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente”. 22. Apelação parcialmente provida.