EMENTA/VOTO: AGRAVO INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA INDEFERIDO. CONDIÇÃO FINANCEIRA NÃO CONDIZENTE COM A GRATUIDADE JUDICIÁRIA. EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS. DESCONTROLE FINANCEIRO QUE NÃO INFLUENCIA NA ANÁLISE DA GRATUIDADE. REQUISITOS NÃO SATISFEITOS. ACERTO DA DECISÃO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Recurso conhecido porque adequado e tempestivo, estando satisfeitos os demais pressupostos de admissibilidade recursal. 2. Trata-se de Agravo interno interposto contra a decisão monocrática que anulou a decisão recorrida no sentido de não conhecer do recurso inominado interposto (artigo 932 , III , do CPC ), porém, manteve o indeferimento da gratuidade judiciária requestada pelo agravante, determinando que, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, aquele efetuasse e comprovasse o recolhimento do preparo recursal correlato (pp. 29/32 dos autos de origem). Em seu recurso, a parte recorrente pugnou pela reforma da decisão agravada, com o consequente deferimento da gratuidade judiciária em seu favor, sustentando, em suma, que possui diversos empréstimos vinculados a sua remuneração, de sorte que sua renda mensal era de R$ 1.027,04 (mil, vinte e sete reais e quatro centavos). Ainda, mencionou que, sem o abatimento dos citados mútuos, seu rendimento mensal somaria a quantia de R$ 3.458,15 (três mil, quatrocentos e cinquenta e oito reais e quinze centavos), o que autorizaria a concessão do benefício vindicado. 3. Exposta a insurgência recursal, o cerne da lide consiste em perquirir se fora acertada a decisão que indeferiu o benefício da justiça gratuita pleiteado pelo agravante/recorrente. 4. Pois bem. Infere-se que, para a concessão do benefício da justiça gratuita, é preciso que a parte autora colacione aos autos documentos comprobatórios de sua condição de pobreza e consequente impossibilidade de arcar com as custas processuais, sem comprometimento de seu sustento e de seus familiares que dela dependam. A propósito, a assistência jurídica integral e gratuita é assegurada àqueles que comprovarem insuficiência de recursos (art. 5º , LXXIV , CRFB/88 ). No mesmo sentido, o artigo 98 do CPC aduz que:a pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. 5. Nessa linha, José Cretella Júnior esclarece que: 'A 'miserabilidade', 'pobreza' ou 'insuficiência' de recursos não se presume. Prova-se. Provada, porém, por qualquer dos meios em Direito permitidos, a condição do requerente, passa ela a ter - ato vinculado ou predeterminado do Direito Administrativo - direito subjetivo público, oponível, em abstrato, ao Estado e, em concreto, ao juiz da causa, de exigir advogado gratuito e o não pagamento de custas, taxas, emolumentos, selos, não podendo o magistrado e, depois, o tribunal deixar de processar o feito' (Comentários à Constituição de 1988 , Forense Universitária, 1989, II/820). 6. Outrossim, dispõe o artigo 99 , § 2º do CPC/2015 : “o juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos”. Além disso, em que pese o artigo 99 , § 3º do CPC afirmar que 'presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural', reputo que essa presunção é relativa, de forma que o juiz não está vinculado àquela, nem depende de manifestação da parte contrária para afastá-la no caso concreto, desde que existam elementos nos autos ou, ao menos indícios, do abuso de concessão da assistência judiciária. 7. Dito isso, ao examinar cuidadosamente os autos, nota-se a manifestação de riqueza da parte agravante que é incompatível com a concessão de justiça gratuita em seu favor. Isso porque, conforme documento de p. 22, o recorrente é servidor estadual inativo, tendo ocupado o cargo de 2º Sargento do CBM/SE, percebendo, mensalmente, subsídio bruto de R$ 10.535,44 (dez mil, quinhentos e trinta e cinco reais e quarenta e quatro centavos) e líquido de R$ 6.126,36 (seis mil, cento e vinte e seis reais e trinta e seis centavos), haja vista o desconto de vultoso empréstimo bancário de R$ 3.129,75 (três mil, cento e vinte e nove reais e setenta e cinco centavos) (pp. 16/21). Sem embargo, conforme documentos coligidos às pp. 199/210, ainda possui empréstimo com o Banco do Brasil S/A, de modo que alega ter saldo salarial de apenas R$ 1.027,04 (mil e vinte e sete reais e quatro centavos) (pp. 14/15). 8. Demais disso, consoante contracheque de p. 13, no mês de junho/2022, recebeu subsídio equivalente ao valor bruto de R$ 7.554,20 (sete mil, quinhentos e cinquenta e quatro reais e vinte centavos), porém, ante o desconto de parcela de mútuo bancário no montante de R$ 3.129,75 (três mil, cento e vinte e nove reais e setenta e cinco centavos), sua remuneração líquida perfez a quantia de R$ 3.458,15 (três mil, quatrocentos e cinquenta e oito reais e quinze centavos). 9. Dito isso, como outrora salientado, apesar da existência de desconto de empréstimo vinculado à remuneração do agravante e do pagamento de outro empréstimo bancário, nota-se que eles possuem natureza voluntária e que é inequívoco que o valor mensal percebido por aquele se encontra em patamar muito superior à média recebida pelo trabalhador brasileiro, bem como ao parâmetro de 3 (três) salários mínimos utilizado por esta Julgadora para balizar o pedido de concessão da gratuidade judiciária. Ademais, o fato de possuir descontos de parcelas relativas a empréstimos não deve ser considerado para a análise da hipossuficiência, já que os recursos foram utilizados em benefício da própria parte e, demais disso, refletem não só a capacidade financeira do agravante, mas também a existência de crédito no mercado em seu favor.Nesse sentido: TJMS. Agravo Regimental Cível n. XXXXX-35.2013.8.12.0000 , Campo Grande, 3ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Marco André Nogueira Hanson, j: 21/05/2013, p: 28/05/2013. 10. Com efeito, não se pode considerar juridicamente necessitada a parte que, na administração do seu orçamento, assume voluntariamente despesas em larga monta que não são compatíveis com a sua saúde financeira. Outrossim, os descontos de empréstimos bancários contraídos não justificam o deferimento da gratuidade judiciária, uma vez que o superendividamento voluntário não pode ser entendido como hipossuficiência financeira ou miserabilidade a justificar a concessão daquela benesse. E, mais, o descontrole financeiro não pode ser confundido com a hipossuficiência financeira exigida para fins de gratuidade de justiça, benefício esse que somente pode ser deferido, como dito, àqueles que, de fato, percebam parcos recursos, o que não é o caso do agravante. 11. E mais: se é que a única renda mensal do recorrente é de R$ 1.027,04 (mil e vinte e sete reais e quatro centavos), como que ele consegue arcar com suas despesas básicas mensais, as quais sequer foram exaustivamente indicadas e comprovadas para justificar o pedido de gratuidade judiciária ora analisado. Deveras contraditória e duvidosa tal afirmação. Dito isso, em que pese o endividamento do recorrente, o certo é que seu vultoso subsídio representa óbice à concessão do benefício ora pretendido e revela a sua capacidade econômico-financeira para arcar com as custas e despesas processuais. 12. Diante disso, uma vez que não comprovada a insuficiência de recursos alegada pelo agravante, entende-se que esse possui condições financeiras para arcar com as custas, despesas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, motivo pelo qual deve ser mantida a decisão monocrática que não concedeu o benefício da gratuidade judiciária vindicado em seu favor, 13. Ante o exposto, o Agravo Interno deve ser CONHECIDO e DESPROVIDO, mantendo-se inalterada a decisão monocrática prolatada. Sem condenação da recorrente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, na forma do artigo 55 da Lei n.º 9.099 /95. 14 A súmula de julgamento servirá de acórdão, nos termos do art. 46 da Lei n.º 9.099 /95. (Agravo Interno Cível Nº 202200932890 Nº único: XXXXX-67.2021.8.25.0084 - 1ª TURMA RECURSAL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator (a): Rosa Maria Mattos Alves de Santana Britto - Julgado em 30/11/2022)