ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. NEPOTISMO. NOMEAÇÃO DE PARENTES, ENTRE OS QUAIS A SOBRINHA DO PREFEITO. ART. 11 DA LEI DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 11.429/1992). MATERIALIDADE E ELEMENTO SUBJETIVO AFIRMADOS PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA À LUZ DA PROVA DOS AUTOS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO QUE NÃO ADMITIU O APELO. NÃO CONHECIMENTO HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Ao confirmar a sentença condenatória, o Tribunal de origem reconheceu a prática de improbidade administrativa, aduzindo não ser possível afastar a ilicitude do ato impugnado quando "o gestor, sabendo do dever que lhe fora conferido, faz nomeações de parentes entre si, e ainda de uma sobrinha, para o exercício de cargo ou função pública que não exigem a regra geral do concurso público para provimento". Concluiu o acórdão recorrido, na linha da decisão de primeira instância, asseverando que "a existência material e a autoria dos atos ímprobos descritos na exordial restaram sobejamente comprovadas através das cópias dos documentos". CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE NEPOTISMO 2. Antes mesmo da análise dos recursos em questão, importa realçar que incumbe ao Poder Judiciário, com olhos assaz atentos, zelar firmemente para que todas as esferas e órgãos estatais, ao escolherem seus integrantes, cumpram sem deslize o princípio da igualdade, o princípio da impessoalidade e o princípio da moralidade administrativa, assim como o princípio da qualificação técnica e de caráter dos colaboradores estatais, pilares principiológicos da ordem pública da boa gestão administrativa, entoada na forma de direitos e obrigações indisponíveis .3. No rol das mais graves e danosas enfermidades que corroem a espinha dorsal do Estado - modalidade do gênero favoritismo, a patologia do serviço público caracterizada pela escolha, não por mérito objetivo, mas por preferências subjetivas emanadas de conexões privadas e participação em certos grupos, castas ou "panelinhas" -, destaca-se o nepotismo. Trata-se de expediente que atenta contra o bem comum, ameaça o patrimônio da nação, enfraquece a meritocracia e solapa o sentimento popular de justiça, seja aberto ou disfarçado, seja individual ou cruzado, seja com ou sem subordinação entre os parentes, seja finalmente no Executivo, Legislativo ou Judiciário. Nada o justifica, nada o legitima, nada apaga a sua maléfica essência de perversão do arquétipo constitucional e legal de governo para todos e de oportunidades iguais para todos .4. A repulsa hodierna ao nepotismo - fonte de crescente conotação deletéria, com ares de tabu e opprobrium social - assenta-se em vários valores e postulados ético-políticos, e também jurídicos, entre as quais vale citar erradicar a confusão entre status público e status familiar ou privado; impedir que pessoas com conhecimento, experiência ou aptidão inferiores venham a ocupar cargos públicos usurpando a vez dos mais habilitados; garantir elevado padrão de isenção e justiça no recrutamento, lotação, promoção, movimentação e remuneração de servidores; evitar potenciais conflitos de interesse decorrentes de laços familiares, por afinidade ou afetivos, em especial corrupção; prevenir excesso, desvio ou omissão de poder;aumentar a eficiência dos serviços públicos; preservar um nível mínimo de confiança da comunidade na integridade e imparcialidade do processo decisório administrativo, afastando impressão inevitável de influências impróprias, imputadas ao pedigree conjugal, consanguinidade e cognação, visto que, por óbvio, o maior capital do Estado não é o poder das armas, mas a confiança dos seus cidadãos .5. O fenômeno do nepotismo adota múltiplas faces e, diante da diversidade, criatividade e nuances das maquinações, impossível descrição cabal de sua taxonomia, embora se possa mencionar quatro grandes classes: nepotismo de nomeação, nepotismo de supervisão, nepotismo contratual e nepotismo situacional. Irrelevante se o familiar é qualificado para o cargo, até o melhor qualificado para o cargo. A carreira de pessoas supercompetentes e vocacionadas não requer alavanca de credenciais elitistas de parentela: precisamente para tais candidatos dotados de méritos tão evidentes, o ordenamento jurídico prevê algo que se chama concurso público, caminho isento, isonômico e não discriminatório para identificação e seleção dos mais preparados. JULGAMENTO DOS RECURSOS: SÚMULA 7 /STJ E IMPUGNAÇÃO DEFICIENTE 6. Quanto aos recursos em si, inviável analisar as teses defendidas no Recurso Especial pelo ex-prefeito, pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos para afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido. Aplica-se, portanto, o óbice da Súmula 7 /STJ. Além disso, o Recurso Especial de Patrícia Pereira Andrade Alencar, João Paulo Essado Maya e Marcélio Bezerra Maya não foi admitido com fundamento na Súmula 282 /STF, na Súmula 7 /STJ e na incompetência do STJ para verificar, na via do Recurso Especial, alegação de ofensa a dispositivos constitucionais. Contudo, os agravantes apenas impugnaram a aplicação da Súmula 7 /STJ e, ainda, de forma extremamente genérica. Diante desse quadro, a irresignação não pode ser conhecida, pois a Corte Especial - no julgamento dos EAREsps XXXXX/SC, 746.775/SC e 831.326/SC - firmou entendimento de que no Agravo em Recurso Especial devem ser impugnados todos os fundamentos, autônomos ou não, da decisão que não admitiu o Recurso Especial na origem, sob pena de não conhecimento. CONCLUSÃO 7. Recurso Especial de Otoniel Andrade Costa parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. Agravo em Recurso Especial dos demais recorrentes não conhecido.