PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PORTE ILEGAL DE MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO. ART. 14 DA LEI N. 10.826 /2003. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. ATIPICIDADE MATERIAL EVIDENCIADA. PEQUENA QUANTIDADE DE MUNIÇÕES. DESACOMPANHADAS DE ARMA DE FOGO. DELITO NÃO PRATICADO NO CONTEXTO DE OUTRO CRIME. RÉU PRIMÁRIO. NÃO OSTENTA MAUS ANTECEDENTES. PENA-BASE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. VIDA PREGRESSA DELITUOSA NÃO CONFIGURADA. OFENSA À INCOLUMIDADE PÚBLICA. INOCORRÊNCIA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. É firme a jurisprudência deste Superior Tribunal no sentido de que "o crime de posse ou porte irregular de munição de uso permitido, independentemente da quantidade, e ainda que desacompanhada da respectiva arma de fogo, é delito de perigo abstrato, sendo punido antes mesmo que represente qualquer lesão ou perigo concreto de lesão, não havendo que se falar em atipicidade material da conduta" ( AgRg no RHC n. 86.862/SP , Relator Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 20/2/2018, DJe 28/2/2018). Assim, via de regra, inaplicável, o princípio da insignificância aos crimes de posse e de porte de arma de fogo ou munição, sendo irrelevante inquirir a quantidade de munição apreendida. 2. Não obstante, o Supremo Tribunal Federal, analisando as circunstâncias do caso concreto, reconheceu ser possível aplicar o princípio da insignificância na hipótese de apreensão de quantidade pequena de munição de uso permitido, desacompanhada de arma de fogo, tendo concluído pela total inexistência de perigo à incolumidade pública ( RHC n. 143.449/MS , Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe 9/10/2017; HC n. XXXXX , Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 17/4/2018, DJe 7/5/2018). 3. Alinhando-se ao entendimento do STF, ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção desta Corte Superior passaram a admitir o reconhecimento da atipicidade da conduta perpetrada por agente, pela incidência do princípio da insignificância, nas hipóteses de ausência de afetação do bem jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. Precedentes. 4. A Quinta Turma deste Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que "para que exista, de fato, a possibilidade de incidência do princípio da insignificância, deve-se examinar o caso concreto, afastando-se o critério meramente matemático" ( AgRg no HC XXXXX/SC , Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 12/5/2020, DJe 18/5/2020), de forma que deve ser considerado todo o contexto fático no qual houve a apreensão da munição, a indicar a patente ausência de lesividade jurídica ao bem tutelado. 5. Nesse mesmo diapasão, a jurisprudência desta Corte Superior se consolidou no sentido de não admitir a aplicação do princípio da insignificância quando as munições, apesar de em pequena quantidade, tiverem sido apreendidas em um contexto de outro crime, circunstância que efetivamente demonstra a lesividade da conduta. 6. Na hipótese dos autos, consta do acórdão recorrido que, durante abordagem policial em uma blitz de rotina, foram apreendidas em poder do réu 8 munições de uso permitido, calibre .38 SPL, intactas, desacompanhadas de dispositivo que possibilitasse o disparo dos projéteis (e-STJ fl. 357). Não há nos autos notícias de que o delito tenha sido praticado no contexto de outro crime. E, em que pese o Tribunal local tenha consignado que o agravado "declarou em seu interrogatório já ter cometido o crime de furto" (e-STJ fl. 365), extrai-se da sentença condenatória que esse não possui condenações criminais transitadas em julgado por fatos anteriores aos apurados na presente ação, tratando-se de réu primário e que não ostenta maus antecedentes, tanto que a pena-base foi fixada no mínimo legal (e-STJ fl. 153), razão pela qual não há que se falar em vida pregressa delituosa. 7. Nesse contexto, com base nas particularidades do caso concreto, foi reconhecida a inocorrência de ofensa à incolumidade pública e aplicado o princípio da insignificância, para afastar a tipicidade material do fato, conquanto seja a conduta formalmente típica, absolvendo o ora agravado da prática do delito do art. 14 , da Lei n. 10.826 /2003, o que não merece reparos. 8. Agravo regimental não provido.