TJ-DF - XXXXX20178070016 DF XXXXX-23.2017.8.07.0016
JUIZADO ESPECIAL CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. RESTITUIÇÃO DE VALORES CONSIDERADOS NÃO DEVIDOS. CONTRATO DE TRATO SUCESSIVO. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA AFASTADA. PRETENSÃO DE RESSARCIMENTO POR ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. PRAZO PRESCRICIONAL DE TRÊS ANOS. PRESCRIÇÃO PARCIAL DA PRETENSÃO. PREJUDICIAL SUSCITADA DE OFÍCIO E ACOLHIDA. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. ALEGADA INTENÇÃO DE CONTRATAR EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AUSÊNCIA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL. DEVER DE INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA NÃO OBSERVADO. DISSONÂNCIA ENTRE A CONTRATAÇÃO EFETIVAMENTE REALIZADA E A VERDADEIRA INTENÇÃO DO CONSUMIDOR. DESCONTOS INDEVIDOS NO VENCIMENTO. RESTITUIÇÃO DEVIDA EM DOBRO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. NECESSIDADE. RECURSO CONHECIDO. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA AFASTADA. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO PARCIAL SUSCITADA DE OFÍCIO E ACOLHIDA. PROVIDO EM PARTE. I. Não merece acolhimento a prejudicial de mérito arguida (decadência), pois o que se tem no caso em análise é uma relação jurídica de trato sucessivo, por força da qual a parte recorrida ainda está a suportar os efeitos da avença (desconto do empréstimo tomado junto ao banco), pouco importando a data em que celebrado o contrato. Persiste intacta, portanto, a possibilidade de discutir em juízo a nulidade do instrumento. II. Prejudicial de prescrição parcial suscitada de ofício. Quando se trata de pretensão de restituição de valores indevidamente cobrados a prescrição é trienal, conforme o estatuído no art. 206 , § 3.º , IV do Código Civil . Aplicável o entendimento manifestado pelo c. STJ no REsp. XXXXX/RS , Rel. Ministro MARCO BUZZI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 10/08/2016, DJe 19/09/2016. Relata a recorrida que os descontos em seus proventos a título de RMC tiveram início em junho de 2005 (ID XXXXX) e requer a repetição em dobro de todas as quantias descontadas desde então. Todavia, a ação foi proposta em 19.05.2017, de forma que está prescrita a pretensão de reaver os valores descontados até 19.05.2014. III. A relação estabelecida entre as partes guarda natureza consumerista e o contrato aludido na inicial caracteriza-se como contrato de adesão, considerado pela lei como aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo ( CDC , art. 54 ). IV. Nos contratos de outorga de crédito é assegurado ao consumidor o direito de ser informado prévia e adequadamente sobre: preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional (valor contratado); montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros; acréscimos legalmente previstos; número e periodicidade das prestações; soma total a pagar, com e sem financiamento ( CDC , art. 52 ). Outrossim, é assegurado ao consumidor a liquidação antecipada do débito, total ou parcialmente, mediante redução proporcional dos juros e demais acréscimos (art. 52, § 2.º). V. Na hipótese dos autos, a parte recorrente não apresentou o contrato de cartão de crédito com ?reserva de margem consignável?. Logo, não se desincumbiu do seu ônus probatório ( CPC , art. 373 , II ), impondo-se, assim, a manutenção da sentença no que tange à rescisão do contrato e restituição dos valores descontados. Neste sentido: Acórdão n.941390, 20151410051128ACJ, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 10/05/2016, Publicado no DJE: 18/05/2016. Pág.: 370. VI. A cobrança indevida dirigida ao consumidor e não decorrente de erro justificável atrai a devolução em dobro, nos termos do art. 42 , parágrafo único , do CDC , ainda mais quando não é dado ao devedor optar pelo não pagamento, já que os descontos foram realizados diretamente em sua folha de pagamento. Neste sentido, confira-se precedentes desta E. Turma Recursal: Acórdão n.1019354, XXXXX20168070003 , Relator: JOÃO FISCHER 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento: 24/05/2017, Publicado no DJE: 29/05/2017. Pág.: Sem Página Cadastrada; Acórdão n.992776, 20150710048006ACJ, Relator: ARNALDO CORRÊA SILVA 2ª TURMA RECURSAL, Data de Julgamento: 08/02/2017, Publicado no DJE: 10/02/2017. Pág.: 597/610. VII. Os descontos indevidos no vencimento da parte recorrida, repetidos por mais de dez anos sem qualquer abatimento na dívida, caracterizam dano moral indenizável, pois o fato não se confunde com o mero dissabor cotidiano ou simples inadimplemento contratual, sendo devida a indenização pelos danos extrapatrimoniais. VIII. A indenização por danos morais possui três finalidades, quais sejam, a prestação pecuniária serve como meio de compensação pelos constrangimentos, aborrecimentos e humilhações experimentados pela parte requerente, punição para a parte requerida e prevenção futura quanto a fatos semelhantes. Outrossim, o valor da reparação deve guardar correspondência com o gravame sofrido, devendo o juiz pautar-se nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sopesando as circunstâncias do fato e as condições pessoais e econômicas das partes envolvidas, assim como o grau da ofensa moral e sua repercussão. IX. Atento às diretrizes acima elencadas, entendo o montante de R$ 3.000,00 (três mil reais), como suficiente para, com razoabilidade e proporcionalidade, compensar os danos sofridos pela parte recorrida, sem, contudo, implicar enriquecimento sem causa. Neste sentido, confira-se: Acórdão n.690433, 20120111208589ACJ, Relator: JOÃO LUIS FISCHER DIAS 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 11/06/2013, Publicado no DJE: 11/07/2013. Pág.: 249. X. Recurso conhecido. Prejudicial de decadência afastada. Prejudicial de prescrição parcial suscitada de ofício e acolhida. Sentença reformada em parte para determinar a restituição em dobro dos valores descontados relativos ao contrato referido na inicial, a partir dos três anos anteriores à propositura da ação, além daqueles descontados no curso do processo ( CPC , art. 323 ), bem como para reduzir o valor do dano moral para R$ 3.000,00 (três mil reais). Juros e correção monetária na forma determinada na sentença. Custas recolhidas. Sem condenação em honorários advocatícios ante a ausência de recorrido vencido.