E M E N T A PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO - SFI. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO PREVISTO PELA LEI 9.514 /97. PURGAÇÃO DA MORA ANTES DA ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL. IMPOSSIBILIDADE APÓS A LEI 13.465 /17. EXERCÍCIO DE PREFERÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE APÓS O REGISTRO DA ARREMATAÇÃO. APELAÇÃO IMPROVIDA. I - As razões pelas quais se considera regular a consolidação da propriedade pelo rito da Lei 9.514 /97 são semelhantes àquelas que fundamentam a regularidade da execução extrajudicial pelo Decreto-lei 70 /66. Ademais, o artigo 39 , I da Lei 9.514 /97 faz expressa referência aos artigos 29 a 41 do Decreto-lei 70 /66. No âmbito do SFH e do SFI, as discussões em torno da execução extrajudicial pelos referidos diplomas legais se confundem em larga medida. II - O procedimento próprio previsto pelo Decreto-lei 70 /66 garante ao devedor a defesa de seus interesses ao prever a notificação para a purgação da mora (artigo 31, § 1º), não sendo incomum, mesmo nessa fase, que o credor proceda à renegociação das dívidas de seus mutuários, ainda que não tenha o dever de assim proceder. No mesmo sentido é o artigo 26 , caput e §§ 1º , 2º e 3º da Lei 9.514 /97. III - Não é negado ao devedor o direito de postular perante o Poder Judiciário a revisão do contrato e a consignação em pagamento antes do inadimplemento, ou, mesmo com a execução em curso, o direito de apontar irregularidades na observância do procedimento em questão que tenham inviabilizado a sua oportunidade de purgar a mora. IV - A matéria é objeto de ampla e pacífica jurisprudência nesta Corte, em consonância com o entendimento ainda dominante no Supremo Tribunal Federal, segundo o qual o Decreto-lei nº. 70 /66 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. V - No tocante ao regramento do Decreto-lei 70 /66, é corriqueira a alegação de irregularidade na execução em virtude da escolha unilateral do agente fiduciário pela mutuante, a qual, todavia, não se baseia em previsão legal ou contratual. A exigência de notificação pessoal se restringe ao momento de purgação da mora, não se aplicando às demais fases do procedimento. Mesmo nesta hipótese, quando o devedor se encontrar em lugar incerto ou não sabido, é possível a notificação por edital, nos termos do artigo 31 , § 2º do Decreto-lei 70 /66 e artigo 26 , § 4º da Lei 9.514 /97. VI - E de se salientar que o pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional. VII - Em suma, não prosperam as alegações de inconstitucionalidade da execução extrajudicial e de descumprimento do procedimento previsto pelo Decreto-lei 70 /66 e pela Lei 9.514 /97. VIII - No tocante ao direito de purgar a mora posteriormente à consolidação da propriedade fiduciária em nome do credor, o STJ tem entendimento de que, mediante previsão do art. 39 da Lei 9.514 /97, é aplicável o art. 34 do Decreto-Lei 70 /66, de modo de que é possível a purgação até a realização do último leilão, data da arrematação. IX - Com a edição da Lei 13.465 /2017, o art. 39 , II , da Lei 9.514 /97 restou alterado, de modo que as disposições dos art. 29 a 41 do Decreto-lei 70 /66 passaram a ser aplicáveis “exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”. Diante da alteração legal, esta Primeira Turma adota o entendimento de que o novo dispositivo aplica-se tão somente aos contratos que tiveram a consolidação da propriedade fiduciária já sob a égide desta lei. X - Caso em que a intimação pessoal para a purgação da mora foi certificada na matrícula do imóvel pelo oficial do cartório, enquanto o registro da consolidação da propriedade deu-se em 14/12/2018 após o início da vigência da Lei 13.465 /17 em 06/09/2017, razão pela qual a parte Autora já não teria direito à purgação da mora. Como bem apontado em sentença, o ajuizamento da ação precedeu a realização do leilão do qual tinha ciência a parte Autora, o que denota que não foi frustrada a possibilidade de exercício do direito de preferência, tampouco demonstrou ter condições para tanto no curso da ação. XI - No tocante à alegação de preço vil, como bem apontado pelo juízo de origem, o imóvel foi avaliado em R$ 185.000,00 por ocasião de assinatura do contrato, enquanto, por ocasião de realização dos leilões foi avaliado em R$ 380.000,00, e arrematado pelo valor mínimo de R$ 200.778,03, que não é inferior a 50% do valor do imóvel. A parte Autora não logrou demonstrar que o imóvel foi subavaliado. XII - A inadimplência do devedor que passa por dificuldades financeiras, quando não há qualquer pedido que possa implicar na revisão da dívida, não é fundamento suficiente para obstar o vencimento antecipado da dívida ou a consolidação da propriedade fiduciária, razão pela qual o prosseguimento da execução prevista na Lei 9.514 /97 representa exercício regular de direito pelo credor, que não está obrigado a renegociar a dívida. XIII - A cessão de crédito não depende da anuência do devedor para ter validade, uma vez que o credor figura na posição jurídica ativa de poder exigir o cumprimento da obrigação, ressalvada a incidência de uma das hipóteses do art. 286 do CC , o que não ocorre no caso em comento. A cessão de crédito não terá eficácia em relação ao devedor até que este seja notificado, momento em que passa ter ciência do negócio jurídico realizado e tem oportunidade de adequar o cumprimento da obrigação, conforme prevê o art. 290 e art. 292 do CC . Para efeito de dar publicidade e obter maior segurança jurídica, o cessionário do crédito hipotecário tem o direito de fazer averbar a cessão no registro do imóvel nos termos do art. 289 do CC , norma que ganha especial relevância em financiamentos imobiliários. Na hipótese dos autos, não se cogita de irregularidade na cessão de crédito, uma vez que o apelante não alega ter sido prejudicado por ter realizado pagamentos ao credor cedente ao invés do cessionário. Não suficiente, a cessão de crédito foi registrada na matrícula do imóvel. XIV - O CDC se aplica às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ), mas as cláusulas dos contratos do SFH observam legislação cogente imperando o princípio pacta sunt servanda. A teoria da imprevisão e o princípio rebus sic standibus requerem a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual. Mesmo nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe a incidência dos termos do artigo 6º , V , artigo 51 , IV e § 1º do CDC , sendo o contrato de adesão espécie de contrato reconhecida como regular pelo próprio CDC em seu artigo 54 . XV - Apelação improvida. Honorários advocatícios majorados para 11% do valor da causa, nos termos do art. 85 , § 11 do CPC .