PROCESSO Nº: XXXXX-74.2018.4.05.8300 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: FAZENDA NACIONAL APELADO: INSTITUTO DO FIGADO E TRANSPLANTE DE PERNAMBUCO - IFP ADVOGADO: Felipe Da Fonte Leal RELATOR (A): Desembargador (a) Federal Fernando Braga Damasceno - 3ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1º GRAU): Juiz (a) Federal Danielli Farias Rabelo Leitao Rodrigues EMENTA: TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. PARÁGRAFO 7º DO ART. 195 DA CRFB/88 . REQUISITOS INSTITUÍDOS PELA LEI Nº 12.101 /2009. CERTIFICADO DE ENTIDADE BENEFICENTE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL (CEBAS). NATUREZA DECLARATÓRIA. EFEITOS EX TUNC. RETROAÇÃO DOS EFEITOS ATÉ A DATA EM QUE DEMONSTRADO O CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) contra a sentença prolatada em sede de processo submetido ao procedimento comum pela Juíza Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária de Pernambuco, que julgou procedente o pedido, declarando a imunidade da autora com relação às seguintes contribuições sociais: INSS patronal, RAT, Terceiros e PIS sobre a Folha de Pagamento, bem como a inexistência de relação jurídico-tributária que a obrigue a se sujeitar ao recolhimento das referidas contribuições sociais entre 30/01/2016 a 11/05/2018 (período em que esteve sem o CEBAS), reconhecendo-se, por isso, o seu direito à imunidade com relação a tais cobranças. 2. Em suas razões, a UNIÃO (FAZENDA NACIONAL) defende, em breve síntese, a constitucionalidade formal dos artigos 29 , 31 e 32 da Lei nº 12.101 /2009 no tratamento da imunidade das entidades beneficentes de assistência social. Sustenta o caráter constitutivo (ex nunc) da concessão do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) sob a égide do art. 31 da Lei nº 12.101 /2009. Adverte que, tratando-se de requerimento de renovação intempestivo, não há previsão legal para a prorrogação de efeitos da certificação anterior. Aduz que a sistemática da Lei nº 12.101 , de 2009 foi criada de forma a não admitir o gozo da imunidade sem certificação válida, inexistindo espaço para pretender-se efeitos retroativos a período não acobertado pela certificação. Afirma, em seguida, que o prazo para pleitear a renovação do certificado é obrigatório para a continuação dos efeitos da certificação. 3. Por sua vez, o INSTITUTO DO FÍGADO DE PERNAMBUCO, em contrarrazões, afirma que obteve o seu primeiro certificado em 30/01/2013 com prazo final em 29/01/2016, conforme documento acostado na inicial. Em seguida, deu entrada no pedido de renovação do CEBAS em 12/04/2016. Aduz que, após idas e vindas, teve o seu pedido de emissão do CEBAS concedido, por meio da Portaria nº 583/2018 do Ministério da Saúde, sendo essa portaria clara ao modificar o entendimento anteriormente firmado, utilizado para negar a concessão. Sustenta que o certificado possui natureza declaratória para fins tributários e pode retroagir seus efeitos à data em que for demonstrado o cumprimento das condições estabelecidas por lei complementar para usufruir da imunidade. Assevera que o STF consolidou o entendimento de que, para regulamentar as imunidades, exige-se Lei Complementar, não sendo suficiente Lei Ordinária, sendo de rigor, em vista disso, reconhecer que a exigência do CEBAS tal como feita hoje (pela Lei Ordinária n.º 12.101 /09), é inconstitucional. Defende que, ainda que fosse exigível, não pode ser prejudicada pelo longo período que o Ministério da Saúde levou para conceder o seu CEBAS, que teve o pedido de renovação protocolado no dia 12/04/2016 e somente obteve o deferimento do pedido - após um longo e cansativo debate com o Ministério da Saúde - quando finalmente foi reconsiderada a decisão anterior do próprio Ministério e expediu-se o certificado no dia 11/05/2018. 4. A juíza sentenciante entendeu que os requisitos legais exigidos na parte final do § 7º do art. 195 da CF/88 , enquanto não editada nova lei complementar sobre a matéria, são somente aqueles previstos no art. 14 do CTN . Afirmou, ainda, que, mesmo considerando a exigibilidade da emissão do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social - CEBAS para o reconhecimento da imunidade, a jurisprudência entende que os efeitos do se estendem aos 3 anos anteriores à sua solicitação administrativa e até os 3 anos posteriores à publicação da resolução concessiva, dado o seu caráter declaratório. 5. Por conseguinte, a matéria devolvida ao conhecimento deste TRF da 5ª Região consiste em perquirir se a contribuinte faz jus à imunidade tributária prevista no art. 195 , § 7º , da CRFB/88 , sem precisar demonstrar o efetivo cumprimento dos requisitos instituídos pela Lei nº 12.101 /2009 e, em caso negativo, se a emissão do CEBAS tem caráter declaratório. 6. Após o julgamento das ADI's 2.028, 2.036, 2.228 e 2.621 e do RE XXXXX/RS , o STF fixou a tese segundo a qual "os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar" ( RE XXXXX/RS ), declarando, por outro lado, a inconstitucionalidade, por vício formal, de normas materiais contidas nas Leis 8.212 /91 e 9.732 /98, e Decretos 2.536 /98 e 752 /93 - dada a exigência de lei complementar, por força do art. 146 , II , da CF -, mantendo, não obstante, a constitucionalidade de normas procedimentais, como a exigência do CEBAS e sua temporalidade (ADI's 2.028, 2.036, 2.228 e 2.621). 7. Do inteiro teor dos julgamentos das ADIs acima aludidas também se extrai o reconhecimento de que o conceito de entidade beneficente de assistência social (art. 195, parágrafo 7º) não é equiparável ao de entidade de assistência social sem fins lucrativos (art. 150, VI, c), asseverando, outrossim, que a CRFB/88 não reúne elementos discursivos para dar concretização segura ao que se possa entender por modo beneficente de prestar assistência social, sendo a fixação do seu conceito indispensável para garantir que a imunidade do art. 195 , § 7º , da CF cumpra a finalidade que lhe é designada pelo texto constitucional . 8. Nesse contexto, a excelsa corte afirmou que a lei complementar é forma somente exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195 , parágrafo 7º , da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem observadas por elas, ressaltando, por outro lado, que o tratamento de aspectos meramente procedimentais pode ser estabelecido por meio de lei ordinária. 9. "Aspectos meramente procedimentais referentes à certificação, fiscalização e controle administrativo continuam passíveis de definição em lei ordinária". ( ADI 2028 , Relator (a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Relator (a) p/ Acórdão: Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 02/03/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-095 DIVULG XXXXX-05-2017 PUBLIC XXXXX-05-2017) 10. Por conseguinte, a interpretação consolidada pelo STF findou por afirmar que as regras procedimentais para o gozo da imunidade tributária, prevista no § 7º do art. 195 da CRFB/88 , são aquelas estabelecidas na legislação ordinária, qual seja a Lei nº 12.101 /09, pelo que a ausência do certificado (CEBAS) impede que o contribuinte desfrute das benesses relativas à qualificação de entidade beneficente de assistência social. 11. Registre-se, ademais, que a qualificação da autora como associação civil sem fins lucrativos não dispensa a apresentação do certificado (CEBAS) acima aludido, mormente tendo em vista o reconhecimento de que o conceito de entidade beneficente de assistência social (entidade filantrópica) não é idêntico ao de entidade sem fins lucrativos. É dizer, a qualificação da entidade não implica, por si só, o reconhecimento de que se trata de entidade beneficente de assistência social apta a fazer jus à imunidade do § 7º do art. 195 da CRFB/88 . 12. Em resumo, o CEBAS nada mais é que exteriorização do benefício da imunidade. Precedentes do STF. 13. O gozo da imunidade relativa às entidades de assistência social pressupõe o atendimento às exigências do art. 14 do CTN , bem como dos requisitos previstos na Lei nº 12.101 /2009, que dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social (CEBAS) e regula os procedimentos de isenção de contribuições para a seguridade social. 14. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência firmada no sentido de que as entidades beneficentes devem preencher as condições estabelecidas pela legislação superveniente para fins de renovação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social - CEBAS e consequente fruição da imunidade tributária (Súmula 352 /STJ), bem como reconhecendo que "O certificado de entidade beneficente de assistência social (CEBAS), no prazo de sua validade, possui natureza declaratória para fins tributários, retroagindo seus efeitos à data em que demonstrado o cumprimento dos requisitos estabelecidos por lei complementar para a fruição da imunidade" (Súmula 612 /STJ). 15. Significa dizer que as exigências estabelecidas pelo art. 14 do CTN atuam como dado antecedente ao fenômeno jurídico da imunidade (pressuposto), enquanto os requisitos da Lei nº 12.101 /2009 se reportam às circunstâncias necessárias e contemporâneas ao seu gozo. Ou seja, o atendimento do art. 14 do CTN pelo contribuinte (pressuposto) gera a presunção da qualidade de entidade beneficente de assistência social, devendo o seu efetivo gozo condicionar-se ao cumprimento dos requisitos estabelecidos pela Lei nº 12.101 /2009. 16. Disso resulta o reconhecimento de que os dispositivos da Lei nº 12.101 /2009, por atuar de forma meramente suplementar às exigências previstas no § 7º do art. 195 da CRFB (discriminadas no art. 14 do CTN ), não afrontam a diretiva constitucional, de modo que nada obsta a exigência de apresentação do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS) como requisito para fruição da imunidade. 17. Ainda assim, registre-se que a sentença recorrida também reconheceu que a autora possuía a certificação acima aludida desde 2018, assegurando, por outro lado, os efeitos retroativos do CEBAS. 18. Relativamente aos efeitos retroativos do CEBAS, conforme destacado acima, o STJ consolidou entendimento no sentido de que não se limitam à data do requerimento do certificado, mas sim à data do preenchimento dos requisitos legais para fruição da imunidade, em razão de sua natureza eminentemente declaratória. 19. Em outras palavras, a concessão do CEBAS produz efeitos "ex tunc", de forma a autorizar a sua retroação a partir do momento em que preenchidos os requisitos legais para a concessão do benefício, até mesmo porque o que se declara no ato é justamente o preenchimento de tais requisitos. 20. "Quanto à retroação de efeitos do certificado, o entendimento consolidado, no âmbito desta Corte Regional, do STJ e do STF, é de que o certificado que atesta a condição de entidade beneficente de assistência social sem fins lucrativos possui natureza declaratória, apenas reconhecendo situação já existente, donde se pode extrair a incidência de efeitos retroativos à data em que comprovado o preenchimento dos requisitos exigidos em lei complementar para o gozo da imunidade." Precedentes: PROCESSO Nº XXXXX-25.2017.4.05.8200 , Desembargador Federal Rogério Fialho, Terceira Turma, julgado em 20/05/2019; PROCESSO: XXXXX20174058300 , AC - Apelação Civel - , DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊLO JÚNIOR, 3ª Turma, JULGAMENTO: 28/09/2018, PUBLICAÇÃO. 21. No caso em tela, o apelado obteve o seu primeiro certificado em 30/01/2013, com prazo final em 29/01/2016. Após o seu vencimento, deu entrada no pedido de renovação do CEBAS em 12/04/2016. 22. Finalmente, em 11 de maio de 2018, teve o seu pedido de emissão do CEBAS deferido, por meio da publicação da Portaria nº 583/2018 do Ministério da Saúde, de modo a restar reconhecido que a apelada demonstrou o cumprimento dos requisitos legais para a concessão do benefício desde o exercício fiscal anterior ao do requerimento, ou seja, 2015, a teor do que dispõe o art. 3º do Decreto nº 8.242 /2014. 23. Assim, ao assegurar à autora, ora apelada, o gozo da imunidade no período de 30/01/2016 a 11/05/2018, a sentença recorrida não discrepou do entendimento consolidado neste TRF da 5ª Região e no STJ, razão pela qual a sua confirmação é medida que se impõe. 24. Apelação não provida. 25. Majoração em um ponto percentual dos honorários fixados na sentença recorrida, ante o que dispõe o § 11 do art. 85 do CPC .