REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE RESPOSTA À REQUISIÇÕES DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ARTIGOS 129 , III , CONSTITUIÇÃO FEDERAL , 10 , LEI FEDERAL Nº 7.347 /1985, 8º, II, LEI COMPLEMENTAR Nº 75 /1993 E 26, I, B, LEI FEDERAL Nº 8.625 /1993. DEMORA EXCESSIVA E NÃO JUSTIFICADA. ELEMENTO SUBJETIVO CONFIGURADO. DOLO GENÉRICO. ATO DE IMPROBIDADE QUE ATENTA CONTRA OS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, MORALIDADE, DA BOA-FÉ E CONTRA A VEDAÇÃO DE RETARDAR, INDEVIDAMENTE, ATO DE OFÍCIO. ARTIGO 11 , CAPUT E II , LEI FEDERAL Nº 8.429 /1992. SANÇÃO. ARTIGO 12 , III , LEI FEDERAL Nº 8.429 /1192. MULTA CIVIL E PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO. PROVIMENTO. I - A despeito do silêncio do magistrado de origem, é sujeita ao reexame necessário a sentença que julga improcedente o pedido de condenação por ato de improbidade administrativa. A conclusão é recostada não só pelo artigo 496 , I , Código de Processo Civil , mas, principalmente, pela comunicação do microssistema de tutela coletiva, aqui regido pelo artigo 19 da Lei federal nº 4.717 /1965. II - A requisição é um dos principias instrumentos de atuação do Ministério Público, por ser o fundamento legal para a reunião de documentos que formarão o inquérito. É dizer, a requisição é a ferramento base para a convicção do órgão do Ministério Público sobre a existência de ato ilícito e/ou ímprobo e, consequentemente, para o ajuizamento da ação judicial, com expressa previsão nos artigos 129 , III , Constituição Federal , 10 , Lei federal nº 7.347 /1985, 8º, II, Lei complementar nº 75 /1993 e 26 , I , b , Lei federal nº 8.625 /1993. O respectivo desatendimento, além de poder caracterizar crime de prevaricação ou de desobediência (artigos 319 e 330 , Código Penal ), na perspectiva da Lei federal nº 8.429 /1992 enquadra-se na tipologia do artigo 11 , caput e II . III - No caso em exame, a Recomendação Ministerial nº 32/2014 e o Ofício Requisição nº 350/2015, ambos recebidos em mãos pelo réu, à época prefeito do município de Três Ranchos, requisitaram informações e documentos (dentre eles declaração de não parentesco de todos os servidores municipais), imprescindíveis ao Procedimento Preparatório nº 76/2014 (instaurado para apurar a suposta prática de ato de nepotismo naquele município), sendo ambos expressos em advertir que a ausência de resposta ensejaria o ajuizamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa e, possivelmente, a instauração de procedimento criminal por crime de desobediência. Já o réu informa que a resposta à Recomendação Ministerial nº 32/2014 e ao Ofício Requisição nº 350/2015 somente foi encaminhada ao Ministério Público mais de 6 (seis) meses depois do fim do último prazo a ele conferido, à justificativa de dificuldades administrativas para a colheita das informações requisitadas. IV - As dificuldades administrativas ou a ineficiência de seus servidores na gestão de documentos internos"cuja solução passa, exclusivamente, pela iniciativa da própria Administração"não pode servir à desobrigação quanto ao dever de responder às requisições expedidas pelo Ministério Público. É de se observar que essa ineficiência administrativa ou mesmo a recusa de determinados servidores ao preenchimento das declarações de não parentesco (documentos requisitados ao réu) seriam motivo razoável para o pedido de dilação de prazo, e não para o completo silêncio frente aos prazos fixados na requisição ministerial. V - O dolo, neste caso, é objetivamente visto na recalcitrância do réu que, mesmo recebendo os ofícios em suas próprias mãos em 2 (duas) oportunidades, permaneceu inerte. A má-fé também se exterioriza no fato de que tanto a Recomendação Ministerial nº 32/2014 quanto o Ofício Requisição nº 350/2015 foram expressos ao prevenir o réu de que a ausência de respostaria importaria o ajuizamento de ação civil pública por ato de improbidade administrativa e, além disso, a possível instauração de procedimento criminal por crime de desobediência. Todavia, livre e conscientemente, o réu decidiu, mais uma vez, submeter-se à desorganização administrativa interna e, assim, deixou de apresentar a resposta no tempo fixado, assim permanecendo durante mais de 6 (seis) meses, dificultando o retardando o procedimento preparatório da ação de improbidade em curso. VI - A gravosidade desse comportamento merece reprimenda. Em razão da desídia do réu, o inquérito civil instaurado pelo Ministério Público ficou paralisado durante mais de 6 (seis) meses, ensejando inclusive a expedição de ofício ao Conselho Superior do Ministério Público para informar sobre a prorrogação do prazo para a conclusão do procedimento preparatório. Os documentos requisitados, especialmente as declarações de não parentesco, eram imprescindíveis ao procedimento preparatório da ação de improbidade, a qual apurava notícias de nepotismo. Como afirmando pela Procuradoria Geral de Justiça, o recorrido acabou por criar uma blindagem em torno de seus atos, impedindo que a investigação pudesse avançar, escondendo da sociedade as possíveis ilegalidades investigadas, mormente levando-se em consideração o fato do Ministério Público estar averiguando casos de nepotismo naquele Município. Nesse sentido, subtrair a coercitividade da requisição significa, em última análise, privar o Ministério Público da possibilidade de ajuizar ações civis públicas e ações de improbidade administrativa, menoscabando a natureza constitucional das ferramentas judiciais de controle da Administração Pública. VII - De todo esse quadro, forçoso reconhecer que o silêncio diante das requisições do Ministério Público, as quais somente foram respondidas com mais de 6 (seis) meses de atraso, ao lado do dolo genérico na conduta omissiva, configura ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da legalidade, da moralidade e da boa-fé objetiva (artigo 11 , caput, Lei federal nº 8.429 /1992), além de, especificamente, incidir na vedação de retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício (artigo 11 , II , Lei federal nº 8.429 /1992). VIII - Quanto à sanção, considerando que a conduta não foi fonte de enriquecimento para o réu, que não gerou dano patrimonial ao erário ou a terceiro e que não se tem notícia de que o atraso no oferecimento das informações requisitadas tenha, de fato, resultado no arquivamento do inquérito civil antes instaurado, é razoável a fixação da pena de pagamento de multa civil de 1 (uma) vez o valor da remuneração percebida pelo réu à época em que ocupava o cargo de prefeito, além da proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 3 (três) anos, na forma do artigo 12 , III , Lei federal nº 8.429 /1992. IX - Remessa necessária e apelação cível conhecidas e providas.