APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AÇÃO DE ANULAÇÃO C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES PAGOS. CONTRATO DE CESSÃO DE DIREITO E USO DE IMÓVEL. DESFAZIMENTO DO NEGÓCIO À PEDIDO DO CESSIONÁRIO. ABUSIVIDADE DAS CLÁUSULAS PARA DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS. ADMITIDA RETENÇÃO DE 10%. PRECEDENTES STJ. NÃO HOUVE TRADIÇÃO, UTILIZAÇÃO OU DEPRECIAÇÃO DO BEM IMÓVEL. OS CEDENTES PODERÃO USAR E DISPOR LIVREMENTE DO BEM IMÓVEL. RESTITUIÇÃO DEVE SER IMEDIATA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. TEMA REPETITIVO Nº 1002 STJ. PRECEDENTES DO STJ. RECURSOS CONHECIDOS. PROVIDO O APELO DO AUTOR E DESPROVIDO O DO RÉU. SENTENÇA REFORMADA. 1. Trata-se de Apelações Cíveis interpostas por ambas as partes, a fim de reformar a sentença de improcedência exarada pelo MM. Julgador da 3ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza nos autos da Ação de Anulação c/c Restituição, proposta por Erasmo Martins dos Santos em desfavor de MVC Ferias e Empreendimentos Turísticos e Hotelaria Ltda. 2. Insta ratificar que o vínculo estabelecido entre o autor e a parte ré é regido pelas normas da Lei Consumerista, vez que se trata de relação de consumo, conforme dispõem os artigos 2º e 3º do CDC , sendo plenamente aplicáveis ao presente caso as normas protetivas da referida lei. O Código de Defesa do Consumidor , em seu art. 6º , inciso V , assegura como direito básico do consumidor "a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas". 3. É cediço que o contrato de cessão de direitos e obrigações, subscrito pelas partes, implica a transferência dos direitos e deveres relacionados a determinado bem imóvel, no contexto que se insere cada caso concreto. Outrossim, para a cessão de contrato, se faz necessário o preenchimento de determinadas condições, exemplificando o seguinte: (i) a bilateralidade contratual (obrigações recíprocas); (ii) contrato suscetível de ser cedido globalmente; (iii) transferência ao cessionário dos direitos e deveres do cedente e (iv) anuência do cedido associada à observância dos requisitos do negócio jurídico. 4. No caso entabulado, verifica-se que a cessão de direitos pactuada entre as partes, em casos de desfazimento contratual por ato do cessionário (requerente), previa, nas Cláusulas 7.2.5 e 7.2.6, à fl.27, a cobrança de diversas taxas a serem deduzidas do valor pago. À fl. 40, repousa memória de cálculo da requerida, na qual esta discrimina os valores devidos com a rescisão do negócio, evidenciando que do valor pago, com os descontos efetuados, ainda resta saldo devedor por parte do autor. Ou seja, com o desfazimento da cessão, o autor ainda ficaria devendo à demandada. Com efeito, verifica-se que, mesmo que prevista em contrato, tais cláusulas revelam-se abusivas, uma vez que a cedente insere no preço do objeto do contrato as despesas administrativas, na qual se incluem os trâmites para a cessão de direitos. 5. Em realizando um paralelo do caso em exame aos contratos de promessa de compra e venda de imóveis, mediante acordo de pagamento em prestações, quando a parte não tem mais condições econômicas de suportar o pagamento das obrigações avençadas, ou mesmo por sua própria iniciativa, sem qual for a justificativa, é admitida a rescisão contratual. Nesses casos, tendo em vista o promitente comprador ter dado causa à resolução do contrato, é possível a retenção pela promitente vendedora de parte das parcelas pagas, a título de ressarcimento pelas despesas operacionais, sendo nula a cláusula que prevê a perda de valores acima do permitido legalmente ou o total dos valores já pagos. 6. In casu, considerando a possibilidade de novos contratos de cessão da unidade imobiliária, bem como ausente o uso e depreciação do imóvel, em face do desfazimento contratual, não é razoável definir a alíquota de retenção superior a 10% sobre o valor total efetivamente pago pelo cessionário. 7. Os juros de mora incidem a partir do trânsito em julgado da decisão de resolução do contrato e a correção monetária das parcelas pagas, para efeito de restituição, incide a partir de cada desembolso. Ademais, a jurisprudência é firme no sentido de que a restituição deve ser imediata, afastando, portanto, a previsão contratual da cláusula 7.2.6 em sentido diverso. 8. Quanto ao recurso da demandada, nenhum dos pedidos merece acolhimento, pois diante do reconhecimento da nulidade da cláusula contratual de retenção dos valores pagos com o provimento do recurso autoral, não subsiste as razões recursais de majoração dos honorários advocatícios e afastamento da suspensividade da cobrança ao autor, vez que tornou-se sucumbente na demanda. 9. Apelações conhecidas para dar provimento ao apelo do autor e desprover o recurso da demandada, reformando a sentença in totum. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer das apelações para dar provimento ao apelo do autor e desprover o recurso do réu, nos termos do Voto do Eminente Relator. Fortaleza, . JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Presidente do Órgão Julgador DESEMBARGADOR JOSÉ EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO Relator