Apelação Cível nº XXXXX-27.2018.8.08.0030 Apelante: Arthur Piol Grassi Apelado: Unimed Norte Capixaba Cooperativa De Trabalho Médico Relator: Desembargador Fábio Clem de Oliveira Relator Designado para Acórdão: Desembargador Ewerton Schwab Pinto Júnior ACÓRDÃO EMENTA: PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. TRATAMENTO DE SAÚDE. CRIANÇA. PLANO DE SAÚDE. MÉTODO ABA. AUSÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL QUE EXCLUA A COBERTURA DA DOENÇA. MÉDICO NÃO CREDENCIADO. PARTICULAR. REQUERIMENTO DE EXAME. NEGATIVA ABUSIVA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL QUE IMPOSSIBILIDADE CONSULTA PARTICULAR E REQUISIÇÃO DE EXAMES COBERTOS. ABUSIVIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. R$ 15.000,00. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O apelante, atualmente com 13 (treze anos) de idade, é portador de epilepsia de difícil controle cursando com retardo mental e transtorno comportamental que cursa com dificuldade e socialização, atraso de fala, tendência à movimentos estereotipados e manias, com enquadramento no CID G40.8 e F84.0. 2. Além disso, não obstante a criança já esteja se submetendo a tratamento medicamentoso (trileptal 6%, valpakine 200mg/dia, risperidona 10mg/1ml), prescrito por médico com especialidade em neurologia infantil neurofisiologista, se mostrou necessário a submissão a psicoterapia pelo método ABA, com as seguintes terapias: terapia comportamental pelo método ABA (Applied Behavior Analysis); fonoaudiologia; terapia ocupacional com integração sensorial; musicoterapia, equoterapia e atendimento por médico neuropediátrico. 3. Neste passo, encontra-se sedimentado há muito na jurisprudência pátria que, configurada a condição de beneficiário do plano de saúde, assim como a ausência de cláusula contratual que, de maneira destacada, exclua expressamente a cobertura da doença, não cabe ao plano de saúde negar autorização, sob pena de se caracterizar comportamento abusivo e, por conseguinte, ato ilícito. 4. A condição de credenciado ou não do médico que prescreve o tratamento não possui relevância para se apurar o dever de cobertura do plano de saúde, sobretudo porque a decisão agravada não determinou tratamento com médico não credenciado, mas apenas que se dê com profissionais habilitados para prestar o adequado tratamento. Isso porque, como já adiantado, os critérios para se estabelecer o dever do plano de saúde são outros. Caso assim não fosse, estaríamos criando um cenário no qual somente os médicos credenciados poderiam indicar tratamento médico adequado, o que, pela simples leitura de tal afirmativa, constata-se a sua inadequação lógico-jurídica. 5. Apenas por argumentar, não há no ordenamento jurídico, tampouco no contrato firmado entre as partes, a vedação de que o consumidor opte por efetuar consulta médica particular, ou seja, com profissional não credenciado desde que arque com os respectivos custos, quando tal escolha tenha se dado de maneira deliberada. O que não é cabível, por certo, em períodos de normalidade, é o beneficiário, deliberadamente optar por médico não credenciado do plano de saúde e almejar o reembolso de tal consulta particular. Mas ressalte-se, essa não é a hipótese. Nesse passo, não havendo vedação para consultas particulares, ainda que o paciente possua plano de saúde, por consequência, também não se pode haver quanto ao tratamento proposto pelo referido profissional, repita-se, especialmente quando inexiste limitação contratual expressa para tratamento da doença diagnosticada. O contrato não exclui o Transtorno do Espectro Autista. 6. Com o fim de exemplificar, seria o mesmo que permitir consulta com médico particular e, ao ser solicitado mero exame de sangue ou radiografia, o plano de saúde recusar a autorização sob o fundamento de que o médico não é credenciado. 7. Assim deve ser concedido o tratamento prescrito pelo médico que acompanha a criança, com a devida cobertura pelo plano de saúde nos exatos termos do laudo respectivo, se valendo, preferencialmente, da sua rede de profissionais ou arcando com os custos de profissionais não credenciados, na hipótese de impossibilidade da primeira opção. Indevida, portanto, a negativa de cobertura. 8. Quanto à prova do dano moral, apesar de reconhecer que o mero inadimplemento contratual não gere dano de índole moral, tenho que a negativa de cobertura do plano de saúde ao menor, considerando sua pouca idade e estado de saúde sensível, inegavelmente ultrapassou a barreira do mero dissabor e configurou hipótese que reclama compensação por danos morais. 9. Soma-se a isso o fato de não haver qualquer hipótese de dúvida justa quanto à interpretação do contrato, sobretudo porque a jurisprudência é farta no sentido de que, não havendo exclusão contratual de determinada doença, não pode haver recusa ao seu tratamento. 10. Portanto, com fundamento nos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, somados aos requisitos já expendidos, sempre evitando o enriquecimento sem causa, entendo que a quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) apresenta-se justa e suficiente, a título de indenização por danos morais, valor este, condizente com a gravidade da conduta da Unimed, com a extensão dos danos experimentados pelo consumidor e com a capacidade econômica das partes. 11. Recurso conhecido e parcialmente provido. VISTOS , relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Desembargadores que integram a Primeira Câmara Cível do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, de conformidade com a ata de julgamento e notas taquigráficas da sessão, por maioria de votos, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto do Relator. Vitória, ES, 13 de abril de 2021. PRESIDENTE RELATOR