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8 de Maio de 2024

Artigo: Afinal, qual será a regra do jogo?

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Por Leonardo Oliveira Soares, procurador do Estado de Minas Gerais

A indagação que dá título ao escrito volta-se para o futuro funcionamento do serviço público de distribuição de justiça nacional. Isso porque, como é de conhecimento da comunidade jurídica, em 17 de março de 2015, foi publicada a Lei 13.105/15, por intermédio da qual foi criado o novo Código de Processo Civil brasileiro, doravante NCPC.

No artigo 1.045 de referido código, previu-se vacatio legis de um ano após a respectiva publicação. Dessa maneira, a partir de 18 de março de 2016, novo diploma normativo irá reger a jurisdição brasileira, haja vista o disposto no artigo , § 1º, da Lei Complementar 95, segundo o qual: “A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral”.

A demarcação se justifica, pois o direito processual pátrio adota a teoria do isolamento dos atos processuais. Ou seja, as condutas – das partes, do juiz e, a rigor, de terceiros – no curso do procedimento seguem, ou devem seguir, a norma vigente ao tempo da prática do ato pertinente (artigo 1.211 do CPC/73, correspondente ao artigo 14 do NCPC). Ou melhor, tais condutas são regidas pela lei processual em vigor no momento em que surge o direito de praticar-se o ato apropriado da cadeia procedimental. Sirva de exemplo o direito de recorrer de decisão desfavorável no processo.

Assim, todas as demandas judiciais que, em 18 de março de 2016, estiverem em tramitação no país, e, atentando-se para os números atuais, pode dizer-se, com segurança, que não serão poucas, irão experimentar (conforme artigo 1.046 do NCPC), em alguma medida, a incidência dos novos comandos formais.

A fim de impedir discussões e controvérsias paralelas sobre quais regras do “jogo” deverão, em breve, ser observadas, apresenta-se de todo apropriado delimitar o alcance da incidência ora pontuada.

Notadamente, se se admitir que, com a criação de um NCPC, pretendeu-se oferecer (será mesmo?) mecanismos mais ágeis e eficientes para solucionar os tantos conflitos que eclodem – por uma série de fatores impossível de exame neste artigo – em sociedade a cada dia mais complexa, na qual expressiva parcela da população se encontra (até quando?) carente de toda sorte de direitos.

Ilustra-se o que se acaba de dizer com indagações passíveis de serem suscitadas, consideradas algumas das inovações presentes na Lei 13.105/15:

  1. a) uma vez que o NCPC, diferentemente do CPC/73, prevê, em seu artigo 219, a contagem de prazo em dias úteis, de que forma deverá ser computado o lapso temporal restante para apresentação de recurso cujo início de fluência venha a ocorrer antes de 18 de março de 2016?
  2. b) as decisões interlocutórias de que as partes sejam intimadas em momento anterior à vigência do NCPC irão desafiar agravo, na forma retida ou por instrumento, consoante artigo 522 do CPC/73, ainda que o recurso seja apresentado após cogitada vigência?
  3. c) as apelações interpostas antes da entrada em vigor do NCPC poderão, conforme o resultado do posterior julgamento, dar ensejo à aplicação da sucumbência recursal? Ou, por outras palavras, o instituto da sucumbência recursal, disciplinado, entre outros dispositivos, no artigo 85, § 11, do NCPC, alcançará, por hipótese, somente as apelações de sentenças de que as partes tenham sido intimadas a partir de 18 de março de 2016?
  4. d) o juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário interpostos em data anterior à vigência do NCPC permanecerá a cargo dos tribunais locais, conforme artigo 542, § 1º, do CPC/73, ou haverá de ser realizado pelas Cortes Superiores, segundo dispõe o artigo 1.030, parágrafo único, do NCPC?

Em suma, o êxito de qualquer atividade, aí, por certo, incluída a jurisdicional, reclama prévio estabelecimento de balizas para o agir de quantos se encontrem autorizados a desempenhá-la.

No particular, crê-se que aludida afirmação merece redobrada atenção por parte dos operadores do direito.

Dois motivos centrais levam a essa crença. De um lado, o caráter bilateral do processo, de que o direito à democrática participação em contraditório para a legitimidade das decisões jurisdicionais se constitui em pressuposto inafastável. De outro, as necessárias escolhas éticas esperadas de mencionados operadores.

Afinal, e vá a obviedade!, não se logrará, como ingenuamente se poderia supor, a melhoria do serviço público de distribuição de justiça brasileiro tão só em virtude da criação de um diferente (melhor?) conjunto de regras processuais.

Leonardo Oliveira Soares – Procurador do Estado de Minas Gerais, mestre em Direito Processual pela PUC Minas, membro da Academia Brasileira de Direito Processual e do Instituto dos Advogados de Minas Gerais (IAMG), professor de Teoria Geral do Processo e Processo Civil na Fadipa

Artigo publicado no caderno Direito & Justiça do jornal Estado de Minas, edição de 4 de setembro de 2015.

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