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6 de Maio de 2024

Como as redes sociais vão interferir na próxima eleição?

Até 5 de outubro sua timeline vai ser invadida por mensagens políticas, em busca de curtidas, comentários – e seu voto, goste você ou não de política

Publicado por Fernanda Favorito
há 10 anos
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Se nunca antes na história deste país tanta gente passou tanto tempo conectada à internet, também se pode dizer que nunca antes na história das eleições nacionais a disputa será tão influenciada pelas redes sociais. Só que entender as sinuosidades dessa influência pode ser mais complicado do que distinguir entre esquerda e direita nas esquizofrênicas alianças partidárias apresentadas pelos candidatos.

Para o pesquisador da área de engenharia de software Silvio Meira, professor da Universidade Federal de Pernambuco e cientista-chefe do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C. E. S. A. R), esta vai ser a primeira campanha em que as redes sociais vão interferir no comportamento do eleitor. Graças à popularização dos smartphones, um contingente inédito poderá interagir de forma instantânea com a discussão política, compartilhando ou contestando mensagens. Mas ele faz uma ressalva: essa interferência muda comportamentos, não necessariamente a escolha do candidato.

– Tem um bocado de gente querendo chegar na minha timeline e querendo dizer um monte de coisa. E eu posso interferir diretamente. Eu posso comentar, gostar ou não. Não estou dizendo que vai influenciar o voto, mas pode interferir de forma direta e em tempo real na conversa sobre a eleição – analisa Meira.

Parte desse poder vem do crescente engajamento nacional às redes, que faz com que o tempo de utilização dos smartphones pelos brasileiros já supere a média global (com média de 84 minutos no uso diário dos aparelhos, contra 74 no mundo).

Por outro lado, é preciso lembrar que o acesso ainda é limitado. A 1ª Pesquisa Brasileira de Mídia 2014 aponta que 47% da população costuma acessar a internet – e desses só 26% o fazem diariamente. Ainda assim, a força das redes é amplificada pelo seu potencial de reverberação. Um dos organizadores do livro Do Clique à Urna: Internet, Redes Sociais e Eleições no Brasil (Edufba, 2013), o professor da Universidade Federal do Ceará Jamil Marques chama atenção para o fato de que mesmo os que não estão na rede são influenciados por ela.

Denominado "remediação", o fenômeno é caracterizado por uma espécie de contaminação, em que uma plataforma influencia a outra. Um exemplo seria o caso do menino de Santa Catarina que ficou famoso com o bordão "tácale pau".

– Muitas pessoas não assistiram ao vídeo na internet, mas ficaram sabendo porque isso foi para a TV. Também ocorre o contrário, quando os exercícios de fono da Patrícia Poeta na TV vão parar no YouTube. Isso também acontece na política – compara Jamil.

Em meio ao tráfego incessante de informações, ganham espaço as chamadas guerrilhas de internet, alimentadas por blogs anônimos que difundem ataques contra adversários. A estratégia, explica Jamil, é produzir tantos links e compartilhamentos a ponto de iludir a indexação do Google, para que os boatos apareçam nas primeiras páginas de pesquisa, como se fossem fatos.

– Esses militantes são treinados e remunerados para espalhar mentiras, e isso reverbera. Mas do mesmo jeito que há perfis voltados para atacar, surgem outros para defender. Isso faz parte do jogo. Campanha negativa sempre vai existir, mas o eleitor também está cada vez mais atento – pondera Jamil.

Professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e presidente da Associação Brasileira de Ciência Política, Leonardo Avritzer observa que a dubiedade na legislação eleitoral favorece os ataques na internet.

– O Brasil tem optado por hiper-regular a TV e não tem quase nenhuma regulação da internet. Na TV existe o exercício do direito de resposta. Se um candidato ataca outro, no dia seguinte o outro tem direito de resposta. Na internet, já temos o Marco Civil, que ajuda a tomar atitudes legais, mas a retirada do conteúdo é lenta. Numa eleição, se demorar 24 horas para tirar do ar pode ser muito tempo, porque a grande característica é o poder de replicar rapidamente uma mensagem – analisa Avritzer.

Na avaliação do pesquisador, o ideal seria que nem a TV fosse tão regulada, nem a internet tão desregulada. Estudioso da democracia, Avritzer considera que as redes trazem um ganho importante de pluralidade e difusão de informações, mas salienta que não pode haver idealização, porque "expressam a sociedade tal qual ela existe". Assim, são inevitavelmente novos canais para expressões de radicalização e partidarização.

Embora os candidatos estendam suas batalhas para as redes, o professor Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e coordenador do Laboratório de estudos sobre Imagem e Cibercultura (Labic), concorda que a forma de disputa não mudou em sua essência.

– Essa história de guerrilha de internet é uma paranoia, tudo artificial. A estratégia é culpar a internet por questões que têm a esconder. Os candidatos deveriam contrapor com verdades o que consideram mentira. Porque a verdade também pode se propagar rápido. Existem grupos em todos os partidos que espalham boatos. É como antes o cara que chegava e começava a falar mal de um candidato para que aquilo se propagasse. Isso não é originário da internet – contesta.

Enquanto os os blogs anônimos espalham trevas para dar ares de vilão de novela aos adversários, os perfis chapa-brancas trabalham para tentar colar todas as virtudes de herói no seu candidato, ecoando seu discurso.

– Os robôs com função de retuitar reproduzem aquela ideia de ônibus lotados que levavam para os comícios para dar audiência. É a reprodução da política da bajulação – analisa Malini.

Nem sempre as táticas funcionam. À medida que todas as candidaturas se apropriam das ferramentas tecnológicas, tendem a repetir fórmulas semelhantes. Tanto que o cientista político Emerson Cervi, professor do programa de pós-graduação em ciência política da Universidade Federal do Paraná (UFPR), enxerga uma contradição: quanto mais utilizados por todas as candidaturas, os dispositivos passariam a fazer menos diferença do ponto de vista eleitoral.

– Num ambiente em que todas as candidaturas usam as mesmas estratégias, os efeitos se anulam – reflete.

Da mesma forma, Cervi considera que as ditas guerrilhas travadas nos porões das campanhas são parte de um jogo calculado. Que pode ser temido, mas não superdimensionado.

– Não se pode transferir difusão de conteúdo à decisão de voto, nem fazer a relação direta. Senão volta-se à teoria da agulha hipodérmica, como se a mídia inoculasse algo sobre a pelé e estaria limitado a agir ali. O comportamento das pessoas é muito mais complexo – lembra.

OS CANDIDATOS NA REDE

Crédito imagens: LABIC/UFES/ Divulgação

632.750 tuítes na semana mencionaram Dilma. Foram 72.967 usuários diferentes, com 194.773 retuítes. O volume de citações a Dilma foi fortemente influenciado pela Copa _ e pela derrota de 7 a 1. Foram tantas as sátiras que os pesquisadores identificaram a formação de uma "rede da zoeira" (em vermelho, com 59,91% das menções), que envolveram seu nome em piadas. Outro grupo (azul, com 26,64%) foi caracterizado por um humor mais ácido, com conotação política. Os tuítes de discurso oposicionista (em verde), somaram 8,61% das menções a Dilma, enquanto a rede de apoio à candidata (em amarelo), produziu 6,85% delas.

Aécio na rede

53.885 tuítes na semana mencionaram Aécio. Foram 11.254 usuários, com 21.092 retuítes. Sem tanto impacto da Copa, o tucano apresentou uma rede bipolarizada. O curioso é que o bloco oposicionista citou mais seu nome do que sua própria base. Os apoiadores de Dilma (em vermelho) produziram 27% das mensagens, enquanto a rede tucana (em azul) somou 15,93%. O grupo amarelo (com 13,35%) aglutina os veículos de imprensa, que ficaram em uma posição intermediária. Em verde, se destacam dois perfis que foram tão retuitados a ponto de criarem uma comunidade em seu entorno: o perfil Dilma Bolada (DilmaBR) e o do jornal Estadão.

Eduardo e Marina na rede

57.769 tuítes na semana mencionaram Eduardo Campos e Marina Silva (o nome de Marina foi incluído para facilitar a identificação desta rede, o que explica um volume de tweets maior do que o acumulado sozinho por Aécio) Foram 10.093 usuários diferentes, com 10.335 retuítes. A rede de Eduardo e Marina é descrita pelos pesquisadores do Labic como a mais rarefeita. Quem mais cita a candidatura é a rede de Dilma, que aparece em azul, com 13,61% das mensagens. Em laranja, com 8,81%, são aglutinadas menções de sátira e humor envolvendo a candidatura. A rede de apoio a Eduardo e Marina, em vermelho, soma 6,69%. Em verde aparecem os sites de notícias, com 6,19%. (o polo azul forte reúne notícias de um lançamento em uma livraria em São Paulo com participação de Campos).

PALAVRAS-CHAVES

A análise feita pelo Labic/Ufes também mostra quais são as palavras-chaves que mais aparecem nos tuítes que mencionam os candidatos:

Dilma

Entre as palavras mais citadas estão Brasil, Copa e Comprou. Segundo o professor Fábio Malini, coordenador do Labic, o vocabulário está em boa parte contaminado por sátiras relacionadas à derrota da seleção após a derrota de 7 a 1, como a piada de que Ângela Merkel teria pago mais pela Copa do que Dilma para comprar a vitória.

Aécio

Uma das palavras em destaque é Patrimônio, além de Brasil, Copa, Campanha e Dilma. A divulgação dos bens dos candidatos pelo TSE durante o período do levantamento, mostrando que o patrimônio do tucano cresceu 303% desde 2010 (e a de Dilma 64%) é uma das razões que explicam a referência. O PSDB disse que a elevação se deve a uma herança deixada pelo pai de Aécio, que faleceu em 2010.

Eduardo Campos

Nas mensagens que o citam se destacam palavras como Dilma, Aécio e Brasil, além da referência a seu próprio nome. O coordenador do Labic observa que, como a rede é mais difusa, é influenciada por notícias de veículos e alvo de críticas de apoiadores de outros candidatos. "Ele ainda não conseguiu criar uma rede da campanha dele", avalia Malini.

VERDADES E MITOS

A INTERNET É PARA TODOS

NÃO É BEM ASSIM: 53% da população brasileira nunca usa internet, segundo a Pesquisa Brasileira de Mídia 2014, realizada pela Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República com pesquisa do Ibope e Inteligência junto a 18.312 brasileiros em 848 municípios. Dos 47% dos brasileiros que costumam acessá-la, 26% o fazem todos os dias. A intensidade média dos usuários diários é de 3h39min de 2ª a 6ª feira e de 3h43 no final de semana. Ainda assim, especialistas apontam que as redes acabam atingindo a todos porque seu conteúdo reverbera em outras mídias.

SÓ A ELITE TEM SMARTPHONE

MITO: a venda de aparelhos no país cresceu 101% em 2013 em relação ao ano anterior e boa parte dos usuários vem das classes populares, segundo o estudo ComTech, realizado pela Kantar Worldpanel. Na classe D e E, o consumo subiu de 5% para 12% entre 2012 e 2013. Na Classe C, de 8% para 17. Na Classe A, passou de 16% para 26%.

TV É PREFERÊNCIA NACIONAL

VERDADE: além de vista por 97% dos brasileiros, é apontada como preferida por 76,4% deles, conforme a Pesquisa Brasileira de Mídia 2014. A internet está em terceiro lugar em acesso, atingindo 47% da população, (atrás do rádio, com 61%), mas aparece em segundo lugar como mídia preferida, com 13%, enquanto o rádio tem 7,9% da preferência. Jornais impressos são lidos por 25% da população e apontados como preferidos por 1,5%.

INTERNET É A MÍDIA FAVORITA ENTRE OS JOVENS BRASILEIROS

NÃO É BEM ASSIM: embora os jovens liderem o acesso à rede e os níveis de preferência pela TV sejam menores nessa faixa etária, a telinha ainda lidera. Na faixa de 16 a 25 anos, a preferência pela TV é de 70% e a citação à internet atinge 25%, ficando o rádio com 4% e os demais com menções próximas de 0%. Para os organizadores da 1ª Pesquisa Brasileira de Mídia, os números indicam uma tendência de adesão aos meios digitais.

JOVENS SÃO MAIORIA NA REDE

VERDADE: 77% dos brasileiros com menos de 25 anos têm contato com a rede, pelo menos, uma vez por semana. Esse percentual cai para 3% entre os respondentes com mais de 65 anos. Na média geral, 47% dos brasileiros usam a rede - e 70% dos usuários apontam as redes sociais como os sites mais acessados. O Facebook fica em primeiro lugar. Os dados são da Pesquisa Brasileira de Mídia 2014.

BRASILEIRO CONFIA EM TUDO O QUE LÊ

MITO: apesar de populares, redes sociais e blogs ficam em últimos lugares no quesito confiança. Os jornais são apontados como os mais confiáveis pelos usuários, com 53%, seguidos pelo Rádio, com 50%, e pela TV, com 49%. Sites têm 28% de confiança, à frente de redes sociais, com 24%, e de blogs, com 22%.

OS CANDIDATOS PRECISAM ESTAR NA INTERNET

VERDADE: a possibilidade de abrir mão é malvista por eleitores. "Se não usa, parece que está fugindo, não é transparente ou não tem o que mostrar", afirma o professor Jamil Marques, um dos organizadores do livro Do Clique à Urna: Internet, Redes Sociais e Eleições no Brasil (EDUFBA, 2013).

FACEBOOK E TWITTER AJUDAM NA POPULARIDADE

NÃO É BEM ASSIM: as ferramentas ajudam, mas o que determina a eficiência é o modo como se usa as contas. Uma frase mal postada pode representar um dano incalculável. E apagar o passado na rede é difícil, porque sempre ficarão rastros. Candidatos também são criticados por fazer um uso proforma das redes, sem interação real. Rede pressupõe diálogo, não é um palanque para discursos unilaterais.

Fonte: Letícia Duarte - http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2014/07/como-as-redes-sociais-vao-interferir-na-pr...

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