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16 de Junho de 2024

Crítica à ação penal pública condicionada como regra ao crime de estupro

Publicado por Consultor Jurídico
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A Constituição de 1988, como expressão de Estado Democrático de Direito, estabelece como fundamento primordial a dignidade da pessoa humana, a qual, muito mais que um imperativo constitucional, traduz-se em princípio regente do ordenamento jurídico.

Em consonância com o referido dispositivo, o Código Penal brasileiro, tutela, dentre outros bens jurídicos, a dignidade e a liberdade sexual, sem as quais não poder-se-ia falar em dignidade da pessoa humana. É o caso do crime de estupro, tipo penal alterado pela Lei 12.015/09, e que incorporou o antes denominado “atentado violento ao pudor”:

Art. 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

A mencionada lei não apenas deu nova descrição ao tipo, mas também alterou a espécie de ação penal aplicável ao caso, como se observa:

Artigo 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.

Antes da Lei 12.015/09, a norma anterior estabelecia que para os crimes previstos no Título VI do Código Penal, denominados à época “crimes contra os costumes”, a ação penal aplicável, como regra, seria a privada.

Entretanto, o artigo excepcionava o cabimento de ação penal pública condicionada à representação se a vítima ou seus pais não pudessem prover as despesas do processo sem que houvesse privação de recursos indispensáveis à manutenção da própria família, bem como previa ação penal pública incondicionada se o crime fosse cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador.

Deste modo, observa-se que a Lei 12.015/09 trouxe alterações significativas para o cenário dos crimes sexuais, tornando-se regra a ação penal pública condicionada à representação. E, excepcionalmente, em casos de crimes sexuais praticados contra vítima menor de dezoito anos ou pessoa vulnerável, a lei prevê o cabimento da ação penal pública incondicionada.

Acertou o legislador ao notar que a ação penal privada não seria a mais adequada ao tipo penal em estudo pois, “constituía uma verdadeira punição à vitima a legitimação exclusiva para ver seu agressor ser processado. Afinal, além de se recuperar física e psicologicamente do abuso sexual sofrido, via-se na obrigação de, ainda, propor a ação penal e acompanhá-la, sob pena de perempção.” (PIERANGELI;2010)

Importante é informar que, antes da alteração trazida pela Lei 12.015/09, vigorava a súmula 608 do STF que defendia o cabimento da ação penal pública incondicionada em casos de estupro mediante violência real.

Com a criação da nova lei o legislador eliminou por completo a aplicação da referida súmula do STF, e atualmente o estupro do maior capaz, ainda que cometido com violência, deverá ser condicionado à representação.

De acordo com a doutrina pátria, a escolha do legislador pela ação penal pública condicionada à representação foi determinada pelo mal que a publicidade de um processo, nos casos de estupro, pode acarretar ao particular. Nesse sentido, TOURINHO FILHO:

Algumas infrações penais afetam tão profunda e assinaladamente a esfera íntima do cidadão que, em face do conflito de interesses, entre a necessidade de reprimi-las e o respeito à incolumidade pessoal da vítima e de sua família, o Estado prefere deixar ao arbítrio do ofendido a apreciação dos interesses familiares, íntimos e sociais que podem estar em jogo.

Ao que parece, tanto o legislador, quanto os doutrinadores priorizaram o direito à intimidade, em detrimento ao direito da autonomia estatal e, até mesmo, à segurança da sociedade.

É inquestionável que o indivíduo tem resguardada sua intimidade, um dos principais direitos da personalidade, os qu...

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