Direito de ser esquecido
“Disse-me: Mais lembranças tenho eu do que todos os homens tiveram desde que o mundo é mundo.” Funes o Memorioso, Ficções, Jorge Luis Borges, 1944.
Vamos imaginar que no passado, você foi acusado de um crime que não cometeu. Após uma audiência no tribunal você foi inocentado. Na época, antes do julgamento, alguns jornais noticiaram o crime afirmando que você era culpado. Anos depois, buscando pelo seu próprio nome no Google, você encontra estas notícias. Como você reagiria?
Google, este nosso Funes o Memorioso digital não esquece nada. Seus robôs incansáveis (googlebots), vasculham a internet buscando todas as informações publicadas no mundo e depois criam um arquivo de meta-dados sobre tudo o que foi encontrado, o Google Index. Quando você busca por alguma coisa na caixinha do Google, ele vai até o Google Index, localiza o apontador e apresenta a fonte da informação.
Mas e se a informação apresentada na página de resultados do Google é algo que não corresponde a realidade, falso ou incorreto? Para o Tribunal de Justiça da União Europeia, o Google precisa remover este link e foi exatamente isto que Mario Costeja, um espanhol de 56 anos, conseguiu. Sentindo-se prejudicado por uma notícia incorreta sobre uma dívida com o governo espanhol, Mario continuava a ter seu nome associado a notícia no Google. Entrou na justiça e ganhou o direito de ser esquecido ou right to be forgotten.
O direito de ser esquecido está na fronteira entre a liberdade de expressão e a luta por privacidade. Longe de ser ato de censura ou desejo de reescrever a história, o que está em jogo é a verdade dos fatos. Afinal, nesta era digital onde nossas informações pessoais valem ouro, devemos ter o direito de remover dos buscadores (não somente do Google) aquilo que não representa a verdade e possa vir a afetar nossa vida negativamente. O caso Mario Costeja é só o começo.
Referências
Bibliografia
BAUMAN, Z. (2008) Vida para Consumo – A transformação das pessoas em mercadorias. Zahar Editora, Rio de Janeiro.
BORGES, J. L. (2007) Ficções. Companhia das Letras. São Paulo.
LANIER, J. (2010) Your are not a Gadget. A Manifesto. Phaidon Press. New York, NY
Fonte: Ricardo Murer - http://info.abril.com.br/noticias/rede/eu-virtual/2014/05/25/direito-de-ser-esquecido/