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8 de Maio de 2024

Dom Pedro II foi 1º a traduzir obra do árabe, diz pesquisa

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Dayanne Sousa

Já em idade avançada, o Imperador brasileiro Dom Pedro II foi o primeiro a traduzir a obra mais conhecida da literatura árabe direto para o português: as Mil e Uma Noites. E o fez com um rigor raro para a época, revela uma dissertação de mestrado da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A pesquisadora Rosane de Souza foi a primeira a ter acesso a parte de uma tradução assinada por Dom Pedro II, que não conseguiu concluir a obra antes de morrer.

Aos 62 anos, ele começou o processo. O último registro de texto traduzido é de novembro de 1891, um mês antes de sua morte.

Rosane destaca a preocupação com a fidelidade do texto em árabe. "Ele era um amante da cultura oriental e mantém tudo, até as características de linguagem do texto original", comenta. Uma surpresa, uma vez que até os dias atuais a versão mais conhecida do texto das Mil e Uma Noites no mundo ocidental é a que deriva de um texto francês, bastante modificado, trazido pelo orientalista Antonie Galland.

Dom Pedro II manteve até mesmo trechos eróticos que outros escondiam. "Quando viu-me riu-se no rosto de mim e apertou-me ao peito d'ella e a boca de mim sobre a boca d'ella", diz um dos trechos traduzidos. A tradução francesa do mesmo trecho fala apenas em "saudações".

O Imperador das Letras

A pesquisadora conta que vai continuar os estudos, tentando entender mais os fatos da vida pessoal do Imperador. Mas ela faz questão de destacar o lado intelectual de Dom Pedro II que era pouco conhecido no Brasil em sua época. "As pessoas o viam apenas como Imperador e o interesse por literatura não era valorizado", conta. Em cartas que trocava com escritores e autoridades estrangeiras, porém, era elogiado.

As traduções eram feitas por ele pessoalmente, embora a pesquisadora levante a hipótese de que por vezes seu professor estivesse ao lado. Pedro II não tinha qualquer ambição de publicar livros e escrevia por prazer, para treinar a fluência nos vários idiomas que falava:

"10h ½ Antes de jantar estudei árabe traduzindo As mil e uma Noites. Ainda traduzi a Odisséia e li provas da arte guarani de Restivo", conta em seu diário, também usado na pesquisa.

Rosane explica que Dom Pedro II sempre foi estimulado a estudar letras. Desde os 12 anos, sabia francês, inglês e latim. Do homem que ensinou árabe e levou ao Imperador o gosto pelo orientalismo, não se sabe muito. Nos diários, o aluno o chama de F. Seibold. Alguns autores, conta Rosane, dizem que seu nome seria Christian Friedrich Seybold. "Ele acompanhou o Imperador em suas viagens ao exterior e até sua morte, no exílio (após a Proclamação da República)", acrescenta. Ela ainda não sabe qual a influência do professor na qualidade das traduções, mas arrisca: "Mesmo estando presente, é possível verificar que ele não interferia muito na tradução, pela forma e por alguns erros de interpretação que estamos verificando".

Mil e Uma Noites

As Mil e Uma Noites são na verdade uma reunião de histórias encontradas em manuscritos de diferentes datas e origens. As histórias, divididas em número de noites, já foram reunidas de várias formas diferentes, o que dificulta a tradução e a fidelidade aos originais.

O ocidente conheceu a história pela tradução francesa de Galland, que faz muitos acréscimos e modificações. Pelo conteúdo, Rosane conseguiu identificar que Dom Pedro II não adotou a tradução de Galland, mas uma edição em árabe de 1825 chamada de edição de Breslau. Ela contou com a ajuda do professor de literatura árabe Mamede Jarouche, da Universidade de São Paulo, que assina uma tradução das Mil e Uma Noites para o português feita direto do árabe e publicada no Brasil.

Rosane identifica a tradução do Imperador brasileiro como bastante fiel. Para se aproximar da forma como o árabe usa os pronomes muito próximo dos nomes, ele usou formas como "esposa de mim" e "filhos de mim", o que para a pesquisadora mostra consciência da língua.

Dom Pedro II também traduziu vários outros textos e escrevia poesias de sua autoria. Três livros com traduções suas chegaram a ser publicados, um após sua morte, em 1907.


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