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20 de Junho de 2024

Prazo em dobro para Defensoria sem comunicação a juízo é uma vitória

Publicado por Justificando
há 9 anos
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Em decorrência de expressa previsão legal constante na Lei Complementar 80 de 1994 (Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública, ou simplesmente LONDP) os Defensores Públicos gozam da prerrogativa da contagem de prazos em dobro[1]. Não entrarei aqui no debate concernente à justeza (ou não) da previsão. Acerca disso, remeto o leitor, eventualmente interessado na temática, ao texto intitulado “A Defensoria Pública deve mesmo existir?”.

Pois bem. Conforme se depreende do texto legal, os prazos processuais devem ser contabilizados em dobro quando a parte é representada pela Defensoria Pública (o que se aplica também a casos nos quais a instituição atua na qualidade de legitimada direta, como ocorre, por exemplo, em Ações Civis Públicas).

Destarte, os prazos devem sempre ser conjugados com a previsão contida na referida Lei Complementar, sendo, automaticamente, contabilizados em dobro. Trata-se de imposição legal, não havendo qualquer discricionariedade do juízo ou instância administrativa.

Questão mais tormentosa surge em situação na qual a Defensoria Pública ingressa na causa quando já iniciada a contagem do prazo. Imagine-se, por exemplo, que alguém é intimado para responder a ação cível, dispondo do prazo de quinze dias para oferecer resposta. Por algum motivo (muitas vezes até mesmo pela falta de informação quanto à existência de instituição incumbida da defesa dos necessitados) a pessoa intimada só comparece à Defensoria quando decorridos quatorze dias, restando, portanto, apenas um dia para a apresentação de defesa; ou, ainda, somente chega ao órgão no décimo sétimo dia, ou seja, quando já escoado o prazo de quinze.

A doutrina costuma apontar três possíveis teses acerca da questão: (a) Conta-se o prazo restante em dobro. Ou seja, no caso apresentado, o Defensor Público disporia de dois dias (um dia faltante em dobro) para apresentar contestação. Na segunda situação, quando o assistido comparecesse no décimo sétimo dia, como não existiria mais prazo em curso, não haveria, por questão lógica, como dobrá-lo, daí a questão estaria preclusa. (b) Conta-se o prazo total em dobro, devolvendo-o integralmente. Ou seja, o Defensor disporia de trinta dias, independente do momento de comparecimento do assistido. Operar-se-ia uma espécie de interrupção do prazo, que seria reiniciado a partir da participação da Defensoria. (c) O prazo é contado integralmente em dobro, descontando-se os dias já escoados. No caso apresentado, o Defensor disporia de trinta dias (prazo em dobro), contudo, descontados os dias já ultrapassados.

Em todas essas situações pode-se adicionar mais uma discussão: a necessidade (ou não) de cientificar o juízo de que a parte está (ou passou) a ser assistida por membro da Defensoria Pública.

Assim, na situação hipotética a, por exemplo, teria o Defensor que peticionar no décimo quarto dia, informado ao juízo que a Defensoria Pública passará a atuar no caso, a fim de que possa dobrar o prazo restante de um dia. O mesmo deveria ocorrer nas hipóteses b e c, de forma que a dobra somente ocorreria se houvesse prévia cientificação.

O debate chegou ao Superior Tribunal de Justiça, o qual, em recente decisão da lavra do Ministro Marco Buzzi, publicada em 04/12/2015, optou pela terceira corrente (c). Sendo assim, é desnecessária a prévia notificação do juízo de que a parte é assistida por Defensor Público para que faça jus à contagem de prazo em dobro. Basta, portanto, que a peça seja interposta dentro do lapso temporal (dobrado) respectivo, contado da citação/intimação (no exemplo apresentado, trinta dias – duas vezes quinze, contados da citação do assistido). Como decorrência, antes disso, não é possível proclamar a revelia do réu.

No caso enfrentado pela Corte, deu-se provimento “ao recurso especial para declarar tempestivos os embargos à execução opostos pela defensoria pública, ainda que fora do prazo simples, independentemente de prévia comunicação ao juízo, acerca da aplicação do prazo em dobro” (REsp 1249354; Ministro MARCO BUZZI; 04/12/2015).

Importante observar que o STJ adotou o mesmo entendimento conferido pelo tribunal a processos envolvendo litisconsortes com procuradores distintos (REsp 713.367/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 07/06/2005, DJ 27/06/2005), no sentido de que é cabível a interposição da peça mesmo após o transcurso do prazo legal, quando a parte for beneficiária do prazo em dobro, independentemente de comunicação prévia ao juízo.

Edilson Santana Gonçalves Filho é Defensor Público Federal. Ex-Defensor do Estado do Maranhão. Coautor do livro Dicionário de Ministério Público e autor da obra A Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais – sua vinculação às relações entre particulares. Especialista em Direito Processual. Escreve regularmente para a coluna Defensorar.
Art. 44. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública da União: I – receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos; Art. 89. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios: I – receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos; Art. 128. São prerrogativas dos membros da Defensoria Pública do Estado, dentre outras que a lei local estabelecer: – receber, inclusive quando necessário, mediante entrega dos autos com vista, intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição ou instância administrativa, contando-se-lhes em dobro todos os prazos;
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