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4 de Maio de 2024

TJSP condena Gafisa por atraso na entrega e impõe restituição de 100% dos valores pagos + comissão de corretagem e SATI

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Uma compradora de imóvel na planta da incorporadora Gafisa apresentou uma ação de rescisão contratual na Justiça de São Paulo com um pedido de quebra de contrato por ato da vendedora no mínimo de forma inusitada!

A adquirente fechou negócio nas dependências de um estande de vendas com a marca da incorporadora em 26 de janeiro de 2011, sendo certo que o prazo previsto para a entrega do projeto de imóvel era o mês de janeiro de 2014.

Firme no argumento de que a cláusula de tolerância dos 180 dias seria NULA, a autora solicitou a rescisão do contrato por culpa exclusiva da incorporadora Gafisa no momento do protocolo da ação em 24 de março de 2014, além de também pedir a restituição dos valores indevidamente pagos a título de suposta comissão de corretagem e taxa SATI.

Em junho de 2014, curiosamente faltando apenas um mês para o término do prazo de tolerância dos 180 dias, o Juiz de primeira instância proferiu sentença através da qual NEGOU o pedido de quebra de contrato por ato da vendedora, sob o argumento de que NÃO TERIA DECORRIDO O PRAZO DA CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA dos 180 dias, sendo que tal cláusula era mesmo VÁLIDA, discordando do argumento lançado pela compradora na petição inicial.

Entretanto, vislumbrando evidente ILEGALIDADE na cobrança de valores destinados ao pagamento de suposta comissão de corretagem e taxa SATI, o Juiz condenou a incorporadora na restituição.

Inconformadas, AMBAS as partes recorreram. A compradora (autora) para pedir no Tribunal a declaração de invalidade da cláusula de tolerância dos 180 dias e reiterar a quebra de Contrato pela incorporadora. A vendedora (ré) recorreu para reverter a condenação na devolução dos valores pagos a título de comissão de corretagem e taxa SATI.

Ocorre que quando do protocolo do recurso de apelação da compradora, o que ocorreu em JULHO de 2014, fez juntar nas razões recursais um documento encaminhado a ela pela incorporadora Gafisa, através do qual a vendedora informava que não conseguiria cumprir o prazo de entrega da obra e que o novo prazo era o mês de janeiro de 2015, o que, naquele momento, tornava o atraso simplesmente INCONTROVERSO.

Que sorte!

Pois a 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, através do Relator Desembargador Francisco Loureiro, em acórdão datado de 18 de dezembro de 2014, por votação unânime, deu razão ao argumento da compradora e negou provimento ao recurso da incorporadora.

Para o Tribunal, de fato, nada havia de ilegal ou abusivo na cláusula de tolerância de 180 dias prevista em Contrato, notadamente porque sua existência refletia em um COSTUME no mercado imobiliário quando o assunto envolve a compra e venda de imóvel na planta ou em construção, sendo certo que todas as incorporadoras trazem essa cláusula em seus contratos.

O Tribunal declarou que o entendimento jurisprudencial há muito temo existente é no sentido de que tal cláusula é legítima e justificável.

Porém, tendo em vista que a incorporadora havia encaminhado carta através da qual informava o não cumprimento do prazo de entrega nem mesmo dentro do período de tolerância, o atraso por culpa da vendedora era inequívoco, motivo pelo qual era mesmo de se admitir o pedido de rescisão de contrato por culpa da incorporadora.

O Tribunal também afirmou que: “há entendimento sedimentado do STJ e do STF de que, nos termos do art. 462 do CPC, fatos novos devem ser levados em conta pelo juiz e as condições da ação são sensíveis a fatos supervenientes, que devem coexistir no momento da sentença (STF, ADI 3.367, Rel. Cezar Peluso).

E que:

“o fato novo e relevante verificado depois da propositura da demanda é o próprio atraso na entrega do imóvel adquirido pela autora. Quando da propositura da ação, em março de 2014, o atraso ainda não estava caracterizado. Afinal, embora a conclusão da obra tenha sido prevista inicialmente para janeiro de 2014, o contrato contém cláusula de tolerância de 180 dias para a alienante. Em que pese a argumentação da autora, não se pode afirmar que a previsão contratual de referido prazo de tolerância é per se abusiva e, consequentemente, nula. Na verdade, a inserção no contrato de cláusula segundo a qual a incorporadora/construtora tem a seu favor um prazo de tolerância adicional de seis meses para entrega da obra constitui antiga prática, que de tão usada e aceita no meio social já teria a força de usos e costumes.”

“Sendo assim, quando do ajuizamento da ação em março de 2014, e quando da prolação da sentença em junho do mesmo ano, o atraso ainda não estava configurado, porque ainda não havia transcorrido integralmente o prazo de tolerância de 06 meses.”

Rejeitando a linha de argumentação da incorporadora Gafisa, no sentido de que a demora na expedição do “habite-se” ocorreu por culpa da Prefeitura (sempre a Prefeitura, não é mesmo?), o Tribunal admitiu a ocorrência de ATRASO SUPERVENIENTE e declarou a rescisão do contrato de promessa de venda e compra por culpa exclusiva da vendedora e assim sendo, impôs sua condenação na restituição à vista de 100% dos valores pagos em Contrato pela compradora, acrescido de correção monetária desde cada um dos pagamento (correção retroativa) e juros legais de 1% ao mês desde a citação até o mês do efetivo pagamento.

Sobre a questão afeta à devolução das comissões de corretagem e taxa SATI, rejeitando a linha de argumentação da defesa no sentido de que a incorporadora não poderia devolver algo que não havia recebido, o Tribunal entendeu que a Gafisa tinha mesmo o dever de arcar com a restituição “em que pese as quantias mencionadas tenham sido entregues a terceiros que participaram da intermediação do negócio, é certo que os mesmos agiam como prepostos da ré e no interesse desta, de modo que a promitente compradora pagou na confiança inspirada por sua qualidade. Mais do que isto, a apelante deve restituir à requerente o montante pago a título de comissão de corretagem e taxa SATI em virtude de sua obrigação de reparar as perdas e danos advindos do inadimplemento culposo do contrato.”

O Relator do acórdão ainda declarou, sabiamente que: “Assim, mesmo tendo sido pagas a comissão e a taxa SATI a pessoas diversas da recorrente, deve esta devolver à demandante a quantia adimplida a tal título, sob pena de não restar a autora integralmente ressarcida dos prejuízos sofridos. Ademais, não se pode olvidar que quem contratou os serviços de intermediação e de promoção de vendas foi a empreendedora imobiliária, e não a promitente compradora. Os corretores são treinados pela construtora, atuam em stands de vendas por ela montados, falam em seu nome e tentam vender os seus produtos. Inviável a empreendedora alegar, no momento em que o contrato se frustra, que a promitente compradora contratou e pagou diretamente a corretora, invertendo o que de fato ocorre e toda a lógica da comercialização de apartamentos em construção.”

Finalizou a decisão com a declaração de quebra do contrato por culpa da incorporadora, condenando-a na restituição integral de todos os valores pagos entre parcelas do Contrato + comissões de corretagem + taxa SATI, tudo acrescido de correção monetária desde cada pagamento – correção retroativa – e juros legais de 1% ao mês desde a citação da empresa até o mês do efetivo pagamento.

A parte curiosa do presente caso é o fato de que a autora da ação tentou obter a rescisão do contrato fundada em premissa equivocada, pois deveria saber, antes de tudo, que infelizmente o entendimento que prevalece em nossos Tribunais – hoje mais do que nunca! – é pela validade da cláusula de tolerância dos 180 dias, justamente, como fundamentou o Relator do acórdão, em uma questão de costume e aceitação da existência dessa tolerância no mercado imobiliário como um todo, motivo pelo qual, teoricamente, a autora da ação perderia o pedido de rescisão, já que foi motivado na suposta culpa da incorporadora.

Por sorte, quando do protocolo do recurso de apelação, a autora recebeu uma carta da vendedora, através da qual atestava que nem mesmo dentro do prazo de tolerância conseguiria cumprir sua principal obrigação, consistente na entrega do imóvel dentro do prazo limite existente no Contrato, daí porque o Tribunal, analisando tal documento, entendeu que houve prévia confissão da vendedora e o pedido de rescisão contratual feito pela autora por culpa exclusiva da incorporadora seria justificado, senão inicialmente, posteriormente ao julgamento da causa em primeira instância.

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo e Mercadante Advocacia (Especialista em Direito Imobiliário)

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