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1 de Maio de 2024

Voto do ministro Celso de Mello na ADI sobre alteração no Código Florestal - íntegra

Publicado por Expresso da Notícia
há 19 anos
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Os dispositivos do Código Florestal que estavam suspensos por liminar voltam a ter eficácia. Em decisão por maioria (sete votos contra dois), o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) revogou a liminar anteriormente concedida pelo ministro-presidente, Nelson Jobim, nas férias de julho.

A liminar havia sido deferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3540 , proposta pelo procurador-geral da República. A ação contesta o artigo 1º da Medida Provisória nº 2.166 /01 na parte em que alterou o artigo , parágrafos 1º, , , , , e do Código Florestal (Lei 4.771 /65 ). Esses dispositivos prevêem a alteração ou supressão de vegetação de área de preservação permanente por meio de autorização dos órgãos ambientais do Poder Executivo.

Leia, abaixo, a íntegra do votoproferido pelo ministro Celso de Mello:

"1º/09/2005 TRIBUNAL PLENO

MED. CAUT. EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 3.540-1 DISTRITO

FEDERAL

RELATOR : MIN. CELSO DE MELLO

REQUERENTE (S) : PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

REQUERIDO (A/S) : PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ADVOGADO (A/S) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

INTERESSADO (A/S) : ESTADO DE SÃO PAULO

ADVOGADO (A/S) : PGE-SP - JOSE DO CARMO MENDES JUNIOR

INTERESSADO (A/S) : ESTADO DE MINAS GERAIS

ADVOGADO (A/S) : JOSÉ BONIFÁCIO BORGES DE ANDRADA E OUTROS

INTERESSADO (A/S) : CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA - CNI

ADVOGADO (A/S) : MARIA LUIZA WERNECK DOS SANTOS

INTERESSADO (A/S) : ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

ADVOGADO (A/S) : PGE - ES MARIA CHRISTINA DE MORAES

INTERESSADO (A/S) : ESTADO DA BAHIA

ADVOGADO (A/S) : PGE - BA CÂNDICE LUDWIG ROMANO

INTERESSADO (A/S) : INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO - IBRAM

ADVOGADO (A/S) : MARCELO LAVOCAT GALVÃO

INTERESSADO (A/S) : ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

ADVOGADO (A/S) : PGE-MS ULISSES SCHWARZ VIANA

INTERESSADO (A/S) : ESTADO DO AMAZONAS

ADVOGADO (A/S) : PGE-AM PATRÍCIA CUNHA E SILVA PETRUCCELLI

E OUTRA

R E L A T Ó R I O

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO - (Relator): O

eminente Senhor Procurador-Geral da República, ao ajuizar a presente

ação direta, argüiu a inconstitucionalidade do art. 4º, “caput” e §§ 1º a 7º , da Lei nº 4.771 , de 15/09/1965 (Código Florestal ), na

redação dada pela Medida Provisória nº 2.166 -67, de 24/08/2001 .

As normas legais ora impugnadas possuem o seguinte

conteúdo material (fls. 09/16):

“Art. 4º A supressão de vegetação em área de

preservação permanente somente poderá ser autorizada em

caso de utilidade pública ou de interesse social,

devidamente caracterizados e motivados em procedimento

administrativo próprio, quando inexistir alternativa

técnica e locacional ao empreendimento proposto. § 1º A supressão de que trata o ‘caput’ deste

artigo dependerá de autorização do órgão ambiental

estadual competente, com anuência prévia, quando

couber, do órgão federal ou municipal de meio ambiente,

ressalvado o disposto no § 2º deste artigo. § 2º A supressão de vegetação em área de

preservação permanente situada em área urbana,

dependerá de autorização do órgão ambiental competente,

desde que o município possua conselho de meio ambiente

com caráter deliberativo e plano diretor, mediante

anuência prévia do órgão ambiental estadual competente

fundamentada em parecer técnico. § 3º O órgão ambiental competente poderá autorizar

a supressão eventual e de baixo impacto ambiental,

assim definido em regulamento, da vegetação em área de

preservação permanente. § 4º O órgão ambiental competente indicará,

previamente à emissão da autorização para a supressão

de vegetação em área de preservação permanente, as

medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser

adotadas pelo empreendedor. § 5º A supressão de vegetação nativa protetora de

nascentes, ou de dunas e mangues, de que tratam,

respectivamente, as alíneas ‘c’ e ‘f’ do art. 2º deste

Código, somente poderá ser autorizada em caso de

utilidade pública. § 6º Na implantação de reservatório artificial é

obrigatória a desapropriação ou aquisição, pelo

empreendedor, das áreas de preservação permanente

criadas no seu entorno, cujos parâmetros e regime de

uso serão definidos por resolução do CONAMA. § 7º É permitido o acesso de pessoas e animais às

áreas de preservação permanente, para obtenção de água,

desde que não exija a supressão e não comprometa a

regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação

nativa.” (grifei)

O eminente Senhor Ministro-Presidente do Supremo

Tribunal Federal, durante o período de férias forenses (julho de

2005), ao suspender, cautelarmente, a eficácia e aplicabilidade do

art. 1º da Medida Provisória nº 2.166 -67, de 24/08/2001 , na parte em

que alterou o art. 4º, “caput” e parágrafos 1º, 2º, 3º, 4º, , e , da Lei nº 4.771 , de 15 de setembro de 1965 , que instituiu o Código Florestal , proferiu decisão que tem o seguinte conteúdo

(fls. 23/27):

“O PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA ajuíza ADI contra

o art. 1º da Medida Provisória nº 2.166 -67, de 24

agosto de 2001 , na parte em que alterou o art. 4º,

caput e parágrafos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º da

Lei nº 4.771 , de 15 de setembro de 1965 .

Aponta a inconstitucionalidade formal dos referidos

dispositivos por violação ao art. 225 , § 1º, III, da Constituição Federal .

Está na inicial:

‘..............................

[os dispositivos ora atacados] tornam possível

a supressão de área de preservação permanente

mediante mera autorização administrativa do órgão

ambiental, quando, em verdade, o legislador

constituinte determinou que tal supressão somente

poderá ocorrer por meio de lei formal.

..............................

... somente a lei em sentido formal e

específica, entendida esta como o ato normativo

emanado do Poder Legislativo e elaborada segundo os

preceitos do devido processo legislativo

constitucional, poderá autorizar a alteração e/ou

supressão dos espaços territoriais especialmente

protegidos...

..............................’

Alega que o CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE -

CONAMA, com fundamento na Medida Provisória atacada

‘..............................

...está prestes a autorizar, por meio de

resolução, que o gestor ambiental local apure a

'utilidade pública' de um empreendimento de

mineração e autorize, sem lei, a supressão da

vegetação em área de preservação permanente.

..............................’ (fl. 7)

E que

‘..............................

Tal fato... poderá acarretar prejuízos

irreparáveis ao bem ambiental, uma vez que fundado

unicamente na discricionariedade do gestor

ambiental de dizer o que é utilidade pública,

quando essa avaliação evidentemente extrapola a

questão ambiental. [via de conseqüência] Abre-se a

porta, por exclusivos interesses econômicos,

especialmente minerários, para a extinção de

espaços territoriais protegidos e essenciais à

proteção e defesa dos ecossistemas.

..............................’ (fl. 7)

E ainda que

‘..............................

A 78ª Reunião do CONAMA será realizada nos

próximos dias 27 e 28 de julho de 2005..., o que

comprova a necessidade de concessão de

medida cautelar com base no art. 10, § 3º, da

Lei nº 9.868 /99, 'sem a audiência dos órgãos ou das

autoridades das quais emanou a lei ou o ato

normativo impugnado'.

..............................’ (fl. 7)

Requer a concessão de medida cautelar com

fundamento no art. 10 , § 3º , da Lei 9.868 /99 e no

art. 170 do Regimento Interno.

Decido.

Em exame prévio, verificam-se presentes os

pressupostos necessários para o deferimento da medida

cautelar.

A inicial anuncia a proximidade da 78ª Reunião

Ordinária do CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE -

CONAMA, órgão consultivo e deliberativo do SISNAMA -

SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE, que será realizada

nos dias 27 e 28 de julho de 2005 (fls. 17/20).

Ocorre que, com fundamento no art. 4º da Medida

Provisória ora impugnada, o CONAMA , por meio de

Resolução, pode vir a autorizar o gestor ambiental local

a suprimir a vegetação de uma área de preservação

permanente, para fins de ‘empreendimento de mineração’

(fl. 7).

A Constituição Federal impõe ao Poder Público o

dever de defender e proteger o meio ambiente para as

presentes e futuras gerações ( art. 225, ‘caput’, da

CF ).

Ora, a extração de minério causa danos irreparáveis

e irreversíveis ao meio ambiente, eis que a área em que

a atividade for desenvolvida não voltará ao seu estado

anterior, presente por este motivo o ‘ periculum in

mora ’.

O ‘ fumus boni iuris’ encontra-se na norma

constitucional ( art. 225 , § 3º , III , da CF ) que

autoriza a supressão de área de preservação permanente

somente por lei.

Daí que a concessão da medida permitirá uma análise

mais aprofundada sobre o tema e, ao mesmo tempo, não

impedirá o perecimento do direito de eventuais

interessados na exploração ambiental.

Assim, defiro o pedido de medida cautelar para

suspender, ‘ad referendum’ do Plenário, até o

julgamento final desta ação, a eficácia do art. 4º,

‘caput’, e parágrafos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, da

Lei nº 4.771 , de 15 de setembro de 1965 .

Comunique-se, com urgência, o teor desta decisão ao

Diretor do CONAMA e ao Procurador-Geral da República.

Solicitem-se informações.” (grifei)

O Senhor Presidente da República prestou as informações

que lhe foram solicitadas (fls. 48/133) e, nelas, defendeu a

legitimidade constitucional da Medida Provisória n. 2.166 -67/2001 ,

editada por seu antecessor, assinalando que o diploma legislativo em

causa não transgrediu a norma constitucional de parâmetro ( CF ,

art. 225, § 1º, n. III) .

Em conseqüência de tal posição, o Chefe do Poder

Executivo da União pediu a reconsideração do ato decisório ora

submetido ao referendo desta Suprema Corte (fls. 178/195),

destacando, com apoio em parecer do ilustre Consultor Jurídico do

Ministério do Meio Ambiente, Dr. GUSTAVO TRINDADE, as seguintes

conclusões:

“I - as áreas de preservação permanente incluem-se

no conceito de ‘espaços especialmente protegidos’, nos

termos do art. 225 , § 1º , inciso III da Constituição Federal, juntamente com as Unidades de Conservação e a

Reserva Legal;

II - a interpretação/aplicação dos preceitos

constitucionais em debate não podem desbordar da lógica

do razoável. Com efeito, o preceito constitucional em

foco não poderá conduzir à conclusão de que qualquer

atividade humana, em ‘espaços territoriais

especialmente protegidos’, dependa, diretamente, de

autorização legislativa. A interpretação do enunciado

em tais termos esvaziaria a ação administrativa,

concentrando-a no Parlamento; III - o texto constitucional em análise expressa a

necessidade de lei especifica para a alteração e a

supressão de espaços territoriais especialmente

protegidos, jamais para a supressão de vegetação nestas

áreas. O corte de vegetação em área de preservação

permanente não acarreta a supressão da APP, tanto que o Código Florestal Federal reconhece, textualmente

( art. 1º, § 2º, inciso II ), a existência de área de

preservação permanente, mesmo em espaços desprovidos de

vegetação; IV - não depende de lei o ato administrativo que,

nos termos da legislação que disciplina referido

espaço, nele autoriza, licencia ou permite obras ou

atividade; V – o art. 225 , § 1º , inciso III da Constituição Federal determina uma dupla condição para que se

promovam alterações ou supressões de espaços

territoriais especialmente protegidos: a) existência de

prévia lei autorizativa e b) vedação de qualquer

utilização que comprometa a integridade dos atributos

que justifiquem sua proteção; VI - a lei autorizativa para uma eventual supressão

de vegetação em área de preservação permanente

estabelecida pelo artigo é o próprio Código Florestal ( art. 3º, § 1º e art. 4º ). Portanto, não há

necessidade de uma lei específica que autorize a

supressão de vegetação em área de preservação

permanente;

VII - a segunda condição constitucional, para que

se possa alterar ou suprimir um espaço territorial

especialmente protegido, é que tal alteração ou

supressão não implique qualquer utilização que

comprometa a integridade dos atributos que justifiquem

sua proteção. Tal dispositivo só pode ser compreendido

em consonância com a exigência constitucional do

licenciamento ambiental para obras ou atividades

potencialmente poluidoras ou causadoras de degradação

do meio ambiente;

VIII - entender que não é possível aos órgãos

ambientais autorizar a supressão de vegetação em APP,

cabendo tal possibilidade, exclusivamente, ao Poder

Legislativo é subverter o sistema constitucional das

competências dos três poderes, atribuindo ao

Legislativo o que é de competência do Executivo. Não

depende de lei o simples ato administrativo, que,

vinculado à norma geral legal que disciplina o uso de

determinado espaço territorial especialmente protegido,

decide sobre obras ou atividades a serem nele

executadas; IX - com as modificações introduzidas na legislação

ambiental, as áreas de preservação permanente se

consolidaram como espaços em regra insuscetíveis de

utilização, ressalvados os casos em que, constatada a

presença dos requisitos previstos em lei, o órgão

ambiental competente possa, com fulcro no interesse

público, devidamente caracterizado e motivado em

procedimento administrativo próprio, autorizar a

retirada da vegetação e a conseqüente intervenção

nesses locais; X - assim sendo, as disposições do art. do Código Florestal Federal encontram-se em perfeita

harmonia com a Constituição Federal , em especial o seu

art. 225, § 1º, inciso III.” (grifei)

Os Estados de Minas Gerais (fls. 139/150), de São Paulo

(fls. 153/154), do Espírito Santo (fls. 268/274), da Bahia

(fls. 280/285), de Mato Grosso do Sul (fls. 328/341) e do Amazonas

(fls. 364/377), bem assim a Confederação Nacional da Indústria – CNI

(fls. 205/239) e o Instituto Brasileiro de Mineração IBRAMAM

(fls. 294/295), foram por mim admitidos na presente relação

processual (fls. 201, 203, 264, 277, 287, 326, 343 e 379), na

condição formal de “amici curiae” ( Lei nº 9.868 /99, art. 7º , § 2º ),

cabendo assinalar que esses intervenientes, ao sustentarem a plena

validade constitucional da Medida Provisória em referência, postulam

não seja referendada a r. decisão proferida pelo eminente Senhor

Ministro-Presidente desta Suprema Corte.

Para os fins a que se refere o art. 21, inciso V, do RISTF , submeto a decisão em causa ao exame do Egrégio Plenário do

Supremo Tribunal Federal.

É o relatório .

V O T O

O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO - (Relator): Trata-se

de ação direta, que, ajuizada pelo eminente Procurador-Geral da

República, objetiva o reconhecimento da inconstitucionalidade do

artigo 1º da Medida Provisória nº 2.166 -67, de 24/08/2001 , na parte

em que alterou o art. 4º, “caput” e §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º,

da Lei nº 4.771 , de 15/09/1965 , que instituiu o Código Florestal .

O eminente Chefe do Ministério Público da União, ao

deduzir a pretensão de inconstitucionalidade que motivou a decisão

ora objeto de apreciação por esta Suprema Corte, sustenta que a

referida Medida Provisória teria ofendido a norma inscrita no

art. 225 , § 1º , inciso III , da Constituição Federal , que assim

dispõe:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao

poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito,

incumbe ao Poder Público:

............................................... III - definir, em todas as unidades da

Federação, espaços territoriais e seus componentes

a serem especialmente protegidos, sendo a alteração

e a supressão permitidas somente através de lei,

vedada qualquer utilização que comprometa a

integridade dos atributos que justifiquem sua

proteção.’ (...).” (grifei)

O autor da presente ação direta, para sustentar a

pretendida declaração de inconstitucionalidade, apóia-se na alegação

de que, em face da norma de parâmetro supostamente transgredida pela

Medida Provisória em causa, os atos de modificação e/ou de supressão

dos espaços territoriais especialmente protegidos submetem-se ao

postulado constitucional da reserva absoluta de lei em sentido

formal (fls. 04/07):

“Depreende-se desta norma constitucional que

somente a lei em sentido formal e específica, entendida

esta como o ato normativo emanado do Poder Legislativo

e elaborada segundo os preceitos do devido processo

legislativo constitucional, poderá autorizar a

alteração e/ou supressão dos espaços territoriais

especialmente protegidos, condicionada à integridade

dos atributos que justifiquem sua proteção.

Nesta esteira de raciocínio, tem-se, portanto, que

a competência para autorizar qualquer supressão de área

de preservação permanente é exclusiva do Poder

Legislativo, não sendo tal competência objeto de

delegação a autoridade administrativa, ‘ in casu’ , órgão

ambiental.

Não obstante o citado mandamento constitucional, a

Medida Provisória 2.166 -67/2001 , nos dispositivos supra

transcritos, transgredindo a ordem vigente, tornou

possível que o gestor de um órgão ambiental, portanto,

de natureza administrativa, subtraia uma competência

que o Poder Constituinte atribui expressamente ao

Legislativo.

Deste modo, a Medida Provisória , ineludivelmente,

viola o Princípio da Reserva Legal consubstanciado no

art. 225 , § 1º , inciso III , da Carta Política , eis que

a expressão contida no dispositivo – ‘sendo a alteração

ou supressão permitidas somente através de lei’ -

abriga uma manifestação absoluta do Princípio da

Reserva Legal, implicando dizer que a Constituição

excluiu qualquer outra fonte infralegal para

disciplinar a matéria.

...................................................

Ressai, assim, que as áreas de preservação

permanente são espécies do gênero espaço

territorialmente protegido, recaindo sobre elas a

vedação imposta pelo dispositivo constitucional que não

permite a sua alteração ou supressão, exceto quando

prevista em lei.

Portanto, é evidente a inconstitucionalidade dos

dispositivos citados, pois somente a lei em sentido

estrito e específica poderá dispor das áreas de

preservação permanente e, ainda assim, desde que

cuidando de não comprometer a ‘integridade dos

atributos que justifiquem sua proteção’ ( art. 225,

§ 1º, III ). A lei em hipótese alguma pode delegar ao

administrador ou a ato normativo infralegal o poder de

determinar as hipóteses, em tese, ou os pressupostos

para a supressão de APP, ainda que criadas por ato

administrativo.” (grifei)

O exame da pretensão cautelar deduzida pelo eminente

Procurador-Geral da República – que veio a ser acolhida, no período

de férias forenses, pelo Excelentíssimo Senhor Ministro-Presidente

do Supremo Tribunal Federal, em decisão ora submetida ao referendo

desta Corte – impõe algumas considerações preliminares em torno

da relevantíssima questão constitucional pertinente à proteção do

meio ambiente.

Todos sabemos que os preceitos inscritos no art. 225 da Carta Política traduzem, na concreção de seu alcance, a consagração

constitucional, em nosso sistema de direito positivo, de uma das

mais expressivas prerrogativas asseguradas às formações sociais

contemporâneas.

Essa prerrogativa, que se qualifica pelo seu caráter

de metaindividualidade, consiste no reconhecimento de que todos têm

direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Trata-se, consoante já o proclamou o Supremo Tribunal

Federal (RTJ 158/205-206, Rel. Min. CELSO DE MELLO), com apoio em

douta lição expendida por CELSO LAFER (“A reconstrução dos Direitos

Humanos”, p. 131/132, 1988, Companhia das Letras), de um típico

direito de terceira geração, que assiste, de modo subjetivamente

indeterminado, a todo o gênero humano, circunstância essa que

justifica a especial obrigação - que incumbe ao Estado e à própria

coletividade - de defendê-lo e de preservá-lo em benefício das

presentes e futuras gerações, evitando-se, desse modo, que irrompam,

no seio da comunhão social, os graves conflitos intergeneracionais

marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade na proteção da

integridade desse bem essencial de uso comum de todos quantos

compõem o grupo social.

Vale referir, Senhor Presidente, neste ponto, até mesmo

em face da justa preocupação revelada pelos povos e pela comunidade

internacional em tema de direitos humanos, que estes, em seu

processo de afirmação e consolidação, comportam diversos níveis de

compreensão e abordagem, que permitem distingui-los em ordens

sucessivas resultantes de sua evolução histórica.

Nesse contexto, e tal como enfatizado por esta Suprema

Corte (RTJ 164/158-161), impende destacar, na linha desse processo

evolutivo, os direitos de primeira geração (direitos civis e

políticos), que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou

formais, e que realçam o princípio da liberdade.

Os direitos de segunda geração (direitos econômicos,

sociais e culturais), de outro lado, identificam-se com as

liberdades positivas, reais ou concretas, pondo em relevo, sob tal

perspectiva, o princípio da igualdade.

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os direitos de

terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva

atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes

dos agrupamentos sociais, consagram o princípio da solidariedade e

constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de

quarta geração (como o direito ao desenvolvimento e o direito à

paz), um momento importante no processo de expansão e reconhecimento

dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores

fundamentais indisponíveis, como prerrogativas impregnadas de uma

natureza essencialmente inexaurível, consoante proclama autorizado

magistério doutrinário (CELSO LAFER, “Desafios: ética e política”,

p. 239, 1995, Siciliano).

Cumpre rememorar, bem por isso, na linha do que vem de

ser afirmado, a precisa lição ministrada por PAULO BONAVIDES (“Curso

de Direito Constitucional”, p. 481, item n. 5, 4ª ed., 1993,

Malheiros), que confere particular ênfase, dentre os direitos de

terceira geração, ao direito a um meio ambiente ecologicamente

equilibrado:

“Com efeito, um novo pólo jurídico de alforria do

homem se acrescenta historicamente aos da liberdade e

da igualdade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e

universalidade, os direitos da terceira geração tendem

a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos

que não se destinam especificamente à proteção dos

interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um

determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o

gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua

afirmação como valor supremo em termos de

existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já

os enumeram com familiaridade, assinalando-lhes o

caráter fascinante de coroamento de uma evolução de

trezentos anos na esteira da concretização dos direitos

fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas

referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente,

à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.”

(grifei)

A preocupação com a preservação do meio ambiente - que

hoje transcende o plano das presentes gerações, para também atuar em

favor das gerações futuras - tem constituído, por isso mesmo, objeto

de regulações normativas e de proclamações jurídicas, que,

ultrapassando a província meramente doméstica do direito nacional de

cada Estado soberano, projetam-se no plano das declarações

internacionais, que refletem, em sua expressão concreta, o

compromisso das Nações com o indeclinável respeito a esse direito

fundamental que assiste a toda a Humanidade.

A questão do meio ambiente, hoje, especialmente em

função da Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente (1972) e das

conclusões da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e

Desenvolvimento (Rio/92), passou a compor um dos tópicos mais

expressivos da nova agenda internacional (GERALDO EULÁLIO DO

NASCIMENTO E SILVA, “Direito Ambiental Internacional”, 2ª ed., 2002,

Thex Editora), particularmente no ponto em que se reconheceu, ao

gênero humano, o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao

gozo de condições de vida adequada, em ambiente que lhe permita

desenvolver todas as suas potencialidades em clima de dignidade e de

bem-estar.

Extremamente valioso, sob o aspecto ora referido, o

douto magistério expendido por JOSÉ AFONSO DA SILVA (“Direito

Ambiental Constitucional”, p. 69/70, item n. 7, 4ª ed./2ª tir.,

2003, Malheiros):

“A ‘Declaração de Estocolmo’ abriu caminho para que

as Constituições supervenientes reconhecessem o meio

ambiente ecologicamente equilibrado como um ‘direito

fundamental’ entre os direitos sociais do Homem, com

sua característica de ‘direitos a serem realizados’ e

‘direitos a não serem perturbados.

...................................................

O que é importante (...) é que se tenha a

consciência de que o direito à vida, como matriz de

todos os demais direitos fundamentais do Homem, é que

há de orientar todas as formas de atuação no campo da

tutela do meio ambiente. Cumpre compreender que ele é

um fator preponderante, que há de estar acima de

quaisquer outras considerações como as de

desenvolvimento, como as de respeito ao direito de

propriedade, como as da iniciativa privada. Também

estes são garantidos no texto constitucional , mas, a

toda evidência, não podem primar sobre o direito

fundamental à vida, que está em jogo quando se discute

a tutela da qualidade do meio ambiente. É que a tutela

da qualidade do meio ambiente é instrumental no sentido

de que, através dela, o que se protege é um valor

maior: ‘a qualidade da vida’.” (grifei)

Dentro desse contexto, Senhor Presidente, emerge, com

nitidez, a idéia de que o meio ambiente constitui patrimônio público

a ser necessariamente assegurado e protegido pelos organismos

sociais e pelas instituições estatais, qualificando-se como encargo

irrenunciável que se impõe - sempre em benefício das presentes e das

futuras gerações - tanto ao Poder Público quanto à coletividade em

si mesma considerada (MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, “Polícia do

Meio Ambiente”, “in” Revista Forense 317/179, 181; LUÍS ROBERTO

BARROSO, “A proteção do meio ambiente na Constituição brasileira”,

“in” Revista Forense 317/161, 167-168, v.g.).

Na realidade, Senhor Presidente, o direito à

integridade do meio ambiente constitui prerrogativa jurídica de

titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação

dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder

deferido, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas,

num sentido verdadeiramente mais abrangente, atribuído à própria

coletividade social.

O reconhecimento desse direito de titularidade

coletiva, tal como se qualifica o direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, constitui, portanto, uma realidade a que

não mais se mostram alheios ou insensíveis, como precedentemente

enfatizado, os ordenamentos positivos consagrados pelos sistemas

jurídicos nacionais e as formulações normativas proclamadas no plano

internacional, como enfatizado por autores eminentes (JOSÉ FRANCISCO

REZEK, “Direito Internacional Público”, p. 223/224, item n. 132,

1989, Saraiva; JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Direito Ambiental

Constitucional”, p. 46/57 e 58/70, 4ª ed./2ª tir., 2003, Malheiros).

Dentro desse contexto, e com absoluta fidelidade aos

valores constitucionais suscetíveis de tutela estatal e de proteção

social, editou-se a Medida Provisória em questão, e de cuja prática,

ao longo destes últimos quatro (04) anos – tal como atestam as

informações prestadas pelo Senhor Presidente da República

(fls. 48/132) e acentuam as diversas manifestações produzidas pelos

“amici curiae” (fls. 139/150, 153/176, 268/275, 280/285, 328/341,

205/262, 294/324 e 364/377) – não resultou o alegado efeito lesivo e

predatório ao patrimônio ambiental, como temido pelo eminente Senhor

Procurador-Geral da República.

É por essa razão, salvo melhor juízo, e não obstante o

justo receio divisado pelo eminente Senhor Ministro-Presidente desta

Suprema Corte, cuja decisão reflete o alto espírito público que a

norteou, que entendo não deva subsistir, na espécie, a medida que

implicou a suspensão cautelar da eficácia do ato estatal impugnado,

especialmente se se considerarem os elementos referidos pelo ilustre

Consultor Jurídico do Ministério do Meio Ambiente, Dr. GUSTAVO

TRINDADE, em sua excelente análise do sentido, do alcance e da

finalidade das normas ora impugnadas:

“Importante analisar, pontualmente, alguns dos

dispositivos do art. do Código Florestal Federal que

restam suspensos, bem como avaliar os efeitos de tal

decisão cautelar.

a) ‘Art. 4º - A supressão de vegetação em área de

preservação permanente somente poderá ser autorizada em

caso de utilidade pública ou de interesse social,

devidamente caracterizados e motivados em procedimento

administrativo próprio, quando inexistir alternativa

técnica e locacional ao empreendimento proposto’.

- A suspensão do caput do art. 4º retira a garantia

de que a supressão de vegetação em área de preservação

permanente somente poderia ser permitida em caso de

utilidade pública ou de interesse social. (...).

- o caput do art. 4º prevê a possibilidade de

supressão de vegetação em área de preservação

permanente somente nos casos de utilidade pública e

interesse social e quando inexistir alternativa técnica

e locacional ao empreendimento proposto. A

possibilidade de permissão de supressão de vegetação em

área de preservação permanente, quando tal intervenção

for possível ou viável noutra área, fere diretamente o

regime jurídico em questão.

b) ‘§ 1º - A supressão de que trata o caput deste

artigo dependerá de autorização do órgão ambiental

estadual competente, com anuência prévia, quando

couber, do órgão federal ou municipal de meio

ambiente, ressalvado o disposto no § 2º deste

artigo’.

- a decisão cautelar retirou a possibilidade de

órgão ambiental, no estrito cumprimento da legislação

ambiental, autorizar a supressão de vegetação em APP.

Ou seja, aos órgãos do Sistema Nacional de Meio

Ambiente - SISNAMA, com longa tradição e competência

técnica na avaliação de estudos de impactos ambientais,

não mais compete praticar atos administrativos que

envolvam autorização para a supressão de vegetação em

APP. Como efeito da decisão cautelar, cabe ao Poder

Legislativo autorizar a supressão de vegetação,

invertendo-se o sistema constitucional de competências,

atribuindo-se ao Legislativo o que é competência do

Poder Executivo.

c) ‘§ 3º - O órgão ambiental competente poderá

autorizar a supressão eventual e de baixo impacto

ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação

em área de preservação permanente’.

- a suspensão de tal dispositivo impede que o

órgão ambiental possa autorizar a supressão eventual

e de baixo impacto ambiental de vegetação em área de

preservação permanente. A implantação de um pontilhão

para a travessia de um curso d’água, a implantação de

instalações para captação e condução de água para

abastecimento doméstico, a construção de cerca de

divisas de propriedades, a realização de trilhas de

ecoturismo, a pesquisa científica, dentre outras

atividades usuais e de pequeno impacto ambiental,

estão vedadas de serem realizadas. Somente lei

específica poderá autorizar tais tipos de

intervenções.

d) ‘§ 4º - O órgão ambiental competente indicará,

previamente à emissão da autorização para a supressão

de vegetação em área de preservação permanente, as

medidas mitigadoras e compensatórias que deverão ser

adotadas pelo empreendedor’.

- não há mais a exigência legal de que a supressão

de vegetação em área de preservação permanente seja

condicionada à realização de medidas mitigadoras e

compensatórias pelo empreendedor.

e) ‘§ 7º - É permitido o acesso de pessoas e

animais às áreas de preservação permanente, para

obtenção de água, desde que não exija a supressão e não

comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo

da vegetação nativa’.

- (...) a decisão cautelar que suspendeu a eficácia

do art. do Código Florestal impede o acesso de

pessoas e animais às áreas de preservação permanente,

para obtenção de água. O acesso de pessoas e animais às

áreas de preservação permanente, para obtenção de água,

por ilegal, submete seus infratores às penalidades da

Lei 9.605 , de 12.02.1998 , que dispõe sobre as sanções

penais e administrativas derivadas de condutas e

atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras

providências.” (grifei)

Os motivos que me levam a assim compreender a questão,

ao menos em juízo de estrita delibação, prendem-se a essas razões e,

ainda, aos fundamentos que o Excelentíssimo Senhor Presidente da

República, com igual consistência, bem expôs em sua manifestação, na

qual sustentou a plena validade jurídico-constitucional da Medida

Provisória editada por seu antecessor (fls. 180/190):

“Primeiramente, cumpre esclarecer que é equivocada

a interpretação conferida pelo requerente ao

dispositivo constitucional utilizado como parâmetro de

controle ( artigo 225, § 1º, inciso III ).

Isso, porque o que a Constituição da República

prevê como sendo de definição exclusivamente através de

lei é a alteração e supressão de espaços territoriais

especialmente protegidos. Em contrapartida, o texto

normativo impugnado autoriza, mediante procedimento

administrativo próprio, a supressão de vegetação em

área de preservação permanente. Vale transcrever os

dispositivos concernentes, ‘litteris’: Constituição da República:

Art. 225. (...)

§ 1º . Para assegurar a efetividade desse

direito, incumbe ao Poder Público:

(...) III - definir, em todas as unidades da

Federação, espaços territoriais e seus

componentes a serem especialmente protegidos,

sendo a alteração e a supressão permitidas

somente através de lei, vedada qualquer

utilização que comprometa a integridade dos

atributos que justifiquem sua proteção.’

(Grifou-se);

Lei nº 4.771 , de 15.09.65 , com a redação dada

pela MP nº 2.166 -67, de 24.08.2001 :

Art. 4º . A supressão de vegetação em área

de preservação permanente somente poderá ser

autorizada em caso de utilidade pública ou de

interesse social, devidamente caracterizados e

motivados em procedimento administrativo

próprio, quando inexistir alternativa técnica e

locacional ao empreendimento proposto.’

(Grifou-se).

Da leitura dos citados artigos, percebe-se que

a nova redação conferida ao Código Florestal não

interfere na exigência constitucional de que os

espaços territoriais especialmente protegidos sejam

alterados ou suprimidos somente através de lei,

pois o que se disciplinou foi a supressão da

vegetação em área de preservação permanente.

...............................................

No mesmo sentido, ensina ÉDIS MILARÉ:

‘Pensamos que a alteração e a supressão

sujeitas à lei são as do próprio regime

jurídico que rege o espaço protegido. Vale

dizer, depende de lei a alteração ou revogação

da legislação (...) que institui, delimita e

disciplina esse espaço protegido. Não depende

de lei o ato administrativo que, nos termos da

legislação que disciplina referido espaço, nele

autoriza, licencia ou permite obras ou

atividade’ (Grifou-se).

...............................................

Ressalte-se, por fim, que, mesmo PAULO AFFONSO

LEME MACHADO, que defende que a ‘área de

preservação permanente’ é espécie do gênero ‘espaço

territorial especialmente protegido’, não vislumbra

inconstitucionalidade na norma impugnada na

presente ação direta, considerando que as

alterações ao Código Florestal , realizadas pela

MP nº 2.166 -67, de 2001 , embora insuficientes,

foram benéficas e trouxeram certo avanço ao Direito

Ambiental Brasileiro. Assim preleciona o mencionado

doutrinador:

‘O art. do Código Florestal não usou a

terminologia ‘Estudo Prévio de Impacto

Ambiental', mas utilizou ‘procedimento

administrativo próprio', que deverá

compreender: a) as alternativas técnicas e

locacionais ( art. 4º, ‘caput’ ) b) análise do

impacto ambiental ( art. 4º, § 2º ), para poder

classificar o grau de importância

desse impacto; e c) estudo de medidas

mitigadoras e compensatórias a serem adotadas

se houver a supressão da vegetação. Ao

requerente da eliminação da APP caberá provar a

não-existência de outras alternativas para o

projeto, pois, sem essa prova, o pedido

obrigatoriamente será indeferido (art. 4º,

‘caput’).

Merece aplausos esta parte da legislação

florestal (...).’ (destacou-se).

Com base em tal afirmação, vale evidenciar que

a Medida Provisória nº 2.166 -67, de 2001 , trouxe

mudanças benéficas à disciplina da supressão de

vegetação em área de preservação permanente, pois,

no regime anterior, não se garantia que tal

supressão apenas fosse autorizada quando existisse

interesse social ou utilidade pública. Também não

era previsto que somente diante de inexistência de

alternativa técnica e locacional ao empreendimento

é que se permitiria a supressão. (...).

...............................................

Cumpre, então, ressaltar que o desígnio do

legislador constituinte não foi exigir lei

específica para cada hipótese de supressão de

vegetação em áreas de preservação permanente.

Exigiu-se, na verdade, uma lei autorizativa

genérica, disciplinando a forma pela qual tal

supressão pode ser feita sem prejuízos para o meio

ambiente. E tal lei - genérica e abstrata como

todas devem ser - já existe, pelo menos em relação

às APP's, consubstanciando-se justamente no Código Florestal.

Outro aspecto a ser considerado é que, ao

prevalecer a tese defendida pelo ilustre

Procurador-Geral da República, de que haveria

necessidade de lei em sentido formal para qualquer

caso de supressão de vegetação em espaço

territorial especialmente protegido, está-se

conferindo elevado grau de casuísmo à edição de

normas que, por sua natureza, devem prever

situações abstratas.

Com efeito, além de se impedir os órgãos

públicos ambientais de autorizar ou licenciar

qualquer tipo de intervenção em espaços protegidos,

ter-se-á a necessidade de lei específica para cada

caso de supressão de vegetação em tais áreas, desde

a implantação de um pequeno corredor de acesso de

pessoas para obtenção de água, por exemplo, até a

construção de portos, gasodutos, hidrelétricas,

dentre inúmeras outras atividades de suma

relevância para o desenvolvimento nacional. Da

mesma forma, com a concessão da medida cautelar,

para que se possa derrubar uma árvore em área

protegida, é necessário que se edite uma lei.

Para que se possa vislumbrar a inviabilidade

deste entendimento, vale transcrever trecho da

Informação nº 460 /2005/CONJUR/MMA (em anexo), ‘in

verbis’:

‘24. Da mesma forma, haverá necessidade de

lei específica, em sentido estrito, para que

possa ocorrer a supressão de uma árvore em área

de Reserva Legal. Cada autorização de corte

deve, no entendimento exposto pelo Procurador-

-Geral da República e acolhido, cautelarmente,

pelo Presidente do STF, ser objeto de aprovação

de uma lei em sentido formal. Importante

referir que a Reserva Legal abrange 80% da área

das propriedades rurais situadas na Amazônia

Legal, 35% da área das propriedades rurais

localizadas nas zonas de cerrado da Amazônia

Legal e 20% da área das propriedades rurais

localizadas nas demais regiões do país.

25. Destaca-se, também, que supressão de

qualquer vegetação em unidade de conservação

dependerá de autorização legislativa, caso a

caso. Vejamos o seguinte exemplo: a cidade de

Brasília e sua região de entorno estão

localizados no interior de uma Área de Proteção

Ambiental (APA do Planalto Central), uma

unidade de conservação de uso

sustentável, criada nos termos do art. 15 da

Lei nº 9.985 /00, que institui o Sistema

Nacional de Unidades de Conservação. Vingando o

entendimento exposto na peça inicial, toda e

qualquer intervenção nos recursos naturais,

como o simples corte de uma árvore exótica,

somente será possível após lei autorizativa

específica.’

Diante desse panorama, resta clara a

improcedência da alegação no sentido de se exigir

lei específica para cada supressão de vegetação em

área especialmente protegida. Esvazia-se o Poder

Executivo, através dos órgãos competentes, de suas

atribuições, abarrotando-se o Poder Legislativo -

Federal, Estadual e Municipal - de projetos de leis

desnecessárias.

Observe-se, ainda, que aquele que pretender a

supressão de vegetação em área protegida terá de se

submeter à realização de ‘lobbies’ junto ao

Congresso Nacional, à Assembléia Legislativa ou à

Câmara dos Vereadores, conforme o ente federativo

ao qual esteja sujeita a área que se pretende

desmatar. (...).

Outro aspecto de relevo é a alegação do

requerente de que a autorização, pelo gestor

ambiental local, de supressão de vegetação em área

de preservação permanente, por ser fundada

‘unicamente na discricionariedade (...) de dizer o

que é utilidade pública’, poderia viabilizar a

extinção destes espaços ‘por exclusivos interesses

econômicos, especialmente minerários’. Ora, é

evidente que a discricionariedade de que se

revestem os atos administrativos não permite que se

possa realizá-los em desconformidade com as

restrições legais e constitucionais. Assim, para

que o gestor ambiental confira a autorização para a

supressão de vegetação em APP, ele deverá observar

também a legalidade, a moralidade e todos os demais

princípios que regem o Direito Administrativo.

Diante de todo o exposto, conclui-se que não se

faz presente o requisito do ‘ fumus boni iuris’ para

a concessão da medida cautelar.” ( grifei )

Sem prejuízo do reconhecimento da procedência de todos

esses elementos expostos pelo Senhor Presidente da República, em

defesa da plena validade constitucional do diploma normativo ora

questionado, não constitui demasia destacar, na linha desse mesmo

entendimento, a precisa observação expendida por ÉDIS MILARÉ

(“Direito do Ambiente”, p. 220/222, item n. 8.4, 2000, RT), em

magistério no qual ressalta, tendo presente o que dispõe o art. 225, § 1º, III, da Constituição , que não depende de lei o ato da Pública

Administração que autoriza, licencia ou permite a execução de obras

ou de atividades nos espaços territoriais especialmente protegidos.

Eis, no ponto, Senhor Presidente, a lição desse

eminente autor:

“Os ‘espaços territoriais especialmente protegidos’

a que alude a Constituição figuram hoje no rol dos

Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente

(...). Vale dizer, o espaço territorial especialmente

protegido é um dos instrumentos jurídicos para a

implementação do direito constitucional ao ambiente

hígido e equilibrado, em particular no que se refere à

estrutura e funções dos ecossistemas.

Na prática, confundem-se eles com as conhecidas

‘unidades de conservação’, ou seja, aquelas áreas de

interesse ecológico que, por características naturais

relevantes, recebem tratamento legal próprio, de molde

a reduzir a possibilidade de intervenções danosas ao

meio ambiente.

...................................................

Os espaços territoriais especialmente protegidos

têm sido criados ora por lei, ora por decreto,

definindo-se seus limites e estabelecendo-se a

disciplina do uso, conservação ou preservação de seu

território e dos recursos nele existentes.

É nesse contexto que se deve entender a Constituição .

O Poder Público deve definir espaços territoriais a

serem protegidos. Pode fazê-lo por lei ou por decreto.

Porém, a alteração ou supressão desses espaços só pode

ser feita por lei, mesmo se criados, delimitados e

disciplinados por decreto.

Questão que tem suscitado controvérsia diz com a

necessidade de ‘lei’ para executar qualquer obra ou

serviço nesses espaços territoriais, mesmo quando

admissíveis nos termos da lei ou do decreto que

instituiu e disciplinou qualquer desses territórios

protegidos.

Pensamos que a alteração e a supressão sujeitas à

lei são as do próprio regime jurídico que rege o espaço

protegido. Vale dizer, depende de lei a alteração ou

revogação da legislação - portanto também do decreto -

que institui, delimita e disciplina esse espaço

protegido. Não depende de lei o ato administrativo que,

nos termos da legislação que disciplina esse espaço,

nele autoriza, licencia ou permite obras ou atividades.

Com efeito, os Poderes Legislativo, Executivo e

Judiciário são independentes e harmônicos entre si

(art. 2.º da Constituição). Ao Poder Legislativo cabe

fazer as leis (normas impessoais e gerais) que

disciplinam determinada matéria, no caso o espaço

territorial protegido. Ao Poder Executivo cabe executar

as leis e praticar os atos administrativos (atos

específicos e determinados) que, à luz da lei, decidem

as pretensões dos administrados.

Entender que ato administrativo, no caso, depende de

lei é subverter o sistema constitucional das competências

dos três poderes, atribuindo ao Legislativo o que é de

competência do Executivo. Para que isso fosse possível

seria necessária expressa previsão constitucional, como é

o caso do § 6.º do art. 225 da Constituição , que sujeita

à lei a localização de usinas nucleares.

À míngua dessa exceção, conclui-se, portanto: não

depende de lei o simples ato administrativo que,

vinculado à norma legal que disciplina determinado

espaço territorial protegido, decide sobre obras ou

atividades a serem nele executadas.” (grifei)

Esse entendimento é também exposto por JOSÉ AFONSO DA

SILVA (“Direito Ambiental Constitucional”, p. 174/176, item n. 6,

4ª ed./2ª tir., 2003, Malheiros), cujo magistério vale reproduzir,

“in extenso”:

“O art. 4º, com redação da Medida

Provisória 2.166-67, de 2001 , estatui que a

‘supressão de vegetação’ em área de preservação

permanente somente poderá ser autorizada em caso de

utilidade pública ou interesse social, devidamente

caracterizados e motivados em procedimento

administrativo próprio, quando inexistir alternativa

técnica e locacional ao empreendimento proposto. A

autorização há de ser dada pelo órgão ambiental

estadual competente, com anuência prévia, quando

couber, do órgão federal ou municipal de meio

ambiente; mas se a área estiver situada em área

urbana, a autorização do órgão ambiental competente

só poderá ocorrer se o Município possuir Conselho de

Meio Ambiente com caráter deliberativo e Plano

Diretor, e ainda dependerá de anuência prévia do

órgão ambiental estadual competente e deverá ser

fundamentada em parecer técnico. Em qualquer caso, o

órgão ambiental competente, antes de emitir a

autorização, terá que indicar as medidas mitigadoras

e compensatórias que deverão ser adotadas pelo

empreendedor. Aqui (...) expressamente está admitida

a supressão de vegetação em área de preservação

permanente por força da lei; é o que se autoriza no

§ 5º do art. 4º , com cautela e rígida limitação, em

relação à vegetação nativa protetora de nascente ou

de dunas e mangues, apenas em caso de utilidade

pública.

Veja-se que aqui não se admite a supressão de áreas

de preservação permanente em si, mas apenas a

‘supressão de vegetação’. A diferença de redação em

relação ao art. 3º, § 1º (supressão total ou parcial),

orienta a compreensão do art. 4º , que não autoriza o

corte raso. Além de todas as cautelas e limitações

formais indicadas acima com base nos parágrafos do

art. 4º, a supressão de vegetação só será admissível no

caso de utilidade pública e interesse social. Para tal

efeito, a própria lei define esses institutos. Têm-se

como ‘utilidade pública’ (a) as atividades de segurança

nacional e proteção sanitária, (b) as obras essenciais

de infra-estrutura destinadas aos serviços públicos de

transporte, saneamento e energia e (c) demais obras,

planos, atividades ou projetos previstos em resolução

do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA

(art. 1º, § 2º, IV ); e como ‘interesse social’ (a) as

atividades imprescindíveis à proteção da integridade da

vegetação nativa, tais como prevenção, combate e

controle do fogo, controle da erosão, erradicação de

invasores e proteção de plantios com espécies nativas,

conforme resolução do CONAMA, (b) as atividades de

manejo agroflorestal sustentável praticadas na pequena

propriedade ou posse rural familiar que não

descaracterizem a cobertura vegetal e não prejudiquem a

função ambiental da área e (c) demais obras, planos,

atividades ou projetos definidos em resolução do

CONAMA.

Vê-se que a ‘utilidade pública’ inclui obras,

atividades e serviços públicos ainda quando o

empreendimento seja realizado por particulares, tais

como concessionários de serviços públicos. Daí a razão

do disposto no § 6º do art. 4º quando declara que na

implantação de reservatório artificial é obrigatória a

desapropriação ou aquisição, pelo empreendedor, das

áreas de preservação permanente criadas no seu entorno,

cujos parâmetros e regime de uso serão definidos por

resolução do CONAMA. Já no caso de ‘interesse social’,

a supressão de vegetação em área de preservação

permanente só é admitida no interesse da proteção da

própria área. Tanto no caso da utilidade pública como

no de interesse social se dá uma faculdade ao CONAMA

para, mediante resolução, definir demais obras, planos,

atividades ou projetos que possam gerar a possibilidade

de supressão da vegetação na área de preservação

permanente. É preciso que se esclareça que a faculdade

que assim se confere ao CONAMA não é um cheque em

branco que o autorize a aplicar os ditames legais: tais

obras, planos, atividades e projetos hão que se

enquadrar na mesma natureza dos que foram enumerados,

respectivamente, como de utilidade pública e de

interesse social.” Ve-se, portanto, que somente a alteração e a supressão

do regime jurídico pertinente aos espaços territoriais especialmente

protegidos, tanto quanto a própria alteração e supressão desses

mesmos espaços territoriais, é que se qualificam, por efeito da

cláusula inscrita no art. 225 , § 1º , III , da Constituição , como

matérias sujeitas ao princípio da reserva de lei formal.

Quando se tratar, porém, de execução de obras ou de

serviços a serem realizados em tais espaços territoriais, cumpre

reconhecer que, observadas as restrições, limitações e exigências

abstratamente estabelecidas em lei, tornar-se-á lícito ao Estado –

qualquer que seja o nível em que se posicione na estrutura

federativa (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) –

autorizar, licenciar ou permitir a realização de tais atividades no

âmbito do espaço territorial submetido a regime jurídico de proteção

especial.

Todas essas razões, associadas aos pronunciamentos

emanados das entidades intervenientes, convencem-me, ao menos em

juízo de estrita delibação, de que a pretensão de

inconstitucionalidade deduzida pelo eminente Senhor Procurador-Geral

da República não se reveste da necessária plausibilidade jurídica.

Cabe referir, também, por necessário, que não me parece

devidamente caracterizada a situação configuradora de “periculum in

mora”.

Tenho para mim, sob tal perspectiva, que a

descaracterização desse pressuposto essencial à concessão do

provimento cautelar deriva de uma relevante circunstância de ordem

temporal, eis que o diploma normativo em questão, embora reeditado

em 24/08/2001 (há mais de quatro anos, portanto – fls. 16), só veio

a ser impugnado, nesta sede de fiscalização abstrata, em 18/07/2005

(fls. 02).

Vale registrar, neste ponto, não obstante a presente

impugnação tenha por objeto a MP nº 2.166 -67/2001 , que as alterações

introduzidas no art. do Código Florestal resultaram de diploma

normativo anterior consubstanciado na MP nº 1.956 -50 , de 26/05/2000.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao

pronunciar-se sobre esse específico aspecto concernente à questão do

periculum in mora ”, já advertiu que “O tardio ajuizamento da ação

direta de inconstitucionalidade, quando já decorrido lapso temporal

considerável desde a edição do ato normativo impugnado,

desautoriza - não obstante o relevo jurídico da tese deduzida - o

reconhecimento da situação configuradora do periculum in mora, o

que inviabiliza a concessão da medida cautelar postulada”

(RTJ 152/692-693, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

Há, ainda, um outro aspecto que assume relevo na

espécie ora em exame, considerada a preocupação revelada pelo

eminente Senhor Ministro-Presidente desta Suprema Corte, quando, em

sua decisão, assinalou que “a extração de minério causa danos

irreparáveis e irreversíveis ao meio ambiente, eis que a área em que

a atividade for desenvolvida não voltará ao seu estado anterior,

presente por este motivo o ‘periculum in mora’” (fls. 26).

Refiro-me ao fato de que, tal como bem observou o

Senhor Presidente da República, a própria Constituição Federal , ao

autorizar a interferência humana no meio ambiente, com propósitos

empresariais voltados à exploração econômica de recursos minerais,

impôs medida destinada a permitir a restauração das áreas afetadas

por tal atividade, prescrevendo, em seu art. 225, § 2º , que “Aquele

que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio

ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão

público competente, na forma da lei”.

É por tal motivo que o Chefe do Poder Executivo da

União fez consignar, nestes autos, a seguinte observação (fls. 191):

“(...) é evidente que as resoluções que autorizem a exploração de

recursos minerais observarão este ditame constitucional, não

existindo, portanto, o risco apontado na inicial e na decisão

concessiva de medida cautelar”.

Cumpre também destacar, neste ponto, as conseqüências,

que, derivadas da decisão ora em exame, já começam a se verificar,

gerando, na espécie, verdadeiro “periculum in mora” em sentido

inverso, cuja ocorrência recomenda a pronta restauração da eficácia

da Medida Provisória em causa.

Esse particular aspecto da questão assume especial

gravidade, quando se tem presente a ponderação feita pelo Senhor

Presidente da República, fundada, não em um receio puramente

abstrato, mas apoiada em fatos efetivamente ocorrentes

(fls. 191/193):

“Na verdade, há a ocorrência de ‘periculum in mora’

inverso, pois o deferimento da liminar, ao impor que

qualquer supressão de vegetação se dê apenas mediante

lei em sentido estrito, além de gerar interferência

indevida do Poder Legislativo em seara que sempre

pertenceu ao Poder Executivo, atingindo o princípio

federativo, implicará na paralisação de atividades

econômicas, obras de saneamento básico e outros

serviços. (...).

...................................................

Todavia, esta situação já está se verificando. A

Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis

Renováveis do Ministério de Minas e Energia, através do

MEMO nº 165/05/SPG, em anexo, lista os processos de

emissão de licença ambiental para a construção de

gasodutos que estão suspensos em virtude da concessão

da medida liminar: são investimentos que variam de

US$ 172 milhões (cento e setenta e dois milhões de

dólares) a US$ 1.300 milhões (um bilhão e trezentos

milhões de dólares). Ressalte-se que a paralisação

desses empreendimentos poderá comprometer o

abastecimento de energia elétrica da Região Nordeste em

2007, uma vez que as usinas termelétricas representam

cerca de 30% (trinta por cento) da energia elétrica ali

consumida. Com relação à Região Norte, a implantação do

gasoduto Urucu-Porto Velho permitirá a utilização de

gás natural em substituição ao óleo diesel e ao óleo

combustível no abastecimento das usinas termelétricas

do Estado de Rondônia, o que reduzirá custos e trará

benefícios ao meio ambiente, através da menor emissão

de gases poluentes.

Esses são apenas alguns exemplos dos impactos da

medida deferida na presente ação direta. São inúmeros

os empreendimentos de pequeno, médio e grande porte que

foram interrompidos à espera do devido equacionamento

dessa questão, que, mantida nos termos atuais, gerará

prejuízos incalculáveis ao país.” ( grifei)

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que igual

preocupação foi também externada tanto pelos Estados-membros da

Federação que ingressaram, como “amici curiae”, na presente relação

processual, quanto pelas demais entidades intervenientes,

consideradas as razões que produziram nestes autos e que renovaram,

nesta sessão plenária, em suas sustentações orais.

Concluo o meu voto: atento à circunstância de que

existe um permanente estado de tensão entre o imperativo de

desenvolvimento nacional ( CF , art. 3º , II), de um lado, e a

necessidade de preservação da integridade do meio ambiente ( CF ,

art. 225 ), de outro, torna-se essencial reconhecer que a superação

desse antagonismo, que opõe valores constitucionais relevantes,

dependerá da ponderação concreta, em cada caso ocorrente, dos

interesses e direitos postos em situação de conflito, em ordem a

harmonizá-los e a impedir que se aniquilem reciprocamente.

Isso significa, portanto, Senhor Presidente, que a

superação dos antagonismos existentes entre princípios e valores

constitucionais há de resultar da utilização de critérios que

permitam, ao Poder Público (e, portanto, aos magistrados e

Tribunais), ponderar e avaliar, “hic et nunc”, em função de

determinado contexto e sob uma perspectiva axiológica concreta, qual

deva ser o direito a preponderar no caso, considerada a situação de

conflito ocorrente, desde que, no entanto - tal como adverte o

magistério da doutrina na análise da delicadíssima questão

pertinente ao tema da colisão de direitos (DANIEL SARMENTO, “A

Ponderação de Interesses na Constituição Federal” p. 193/203,

“Conclusão”, itens ns. 1 e 2, 2000, Lumen Juris; LUÍS ROBERTO

BARROSO, “Temas de Direito Constitucional”, p. 363/366, 2001,

Renovar; JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, “Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, p. 220/224, item n. 2, 1987,

Almedina; J. J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional”, p. 661,

item n. 3, 5ª ed., 1991, Almedina; EDILSOM PEREIRA DE FARIAS,

“Colisão de Direitos”, p. 94/101, item n. 8.3, 1996, Fabris Editor;

WILSON ANTÔNIO STEINMETZ, “Colisão de Direitos Fundamentais e

Princípio da Proporcionalidade”, p. 139/172, 2001, Livraria do

Advogado Editora; SUZANA DE TOLEDO BARROS, “O Princípio da

Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis

Restritivas de Direitos Fundamentais”, p. 216, “Conclusão”, 2ª ed.,

2000, Brasília Jurídica, v.g.) - a utilização do método da

ponderação de bens e interesses não importe em esvaziamento do

conteúdo essencial dos direitos fundamentais, dentre os quais

avulta, por sua significativa importância, o direito à preservação

do meio ambiente.

Essa asserção torna certo, portanto, que a incolumidade

do meio ambiente não pode ser comprometida por interesses

empresariais nem ficar subordinada a motivações de índole meramente

econômica.

Daí os instrumentos jurídicos – de caráter legal e de

natureza constitucional – que, previstos no ordenamento positivo,

objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não

se lhe alterem as propriedades físicas, químicas e biológicas, o que provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança e bem-estar

da população, além de afetar, com sérias conseqüências, a qualidade

dos recursos ambientais e de causar graves danos ecológicos ao meio

ambiente.

Como precedentemente assinalado neste voto, o diploma

normativo em causa, longe de comprometer os valores constitucionais

consagrados no art. 225 da Lei Fundamental , estabeleceu mecanismos

que permitem um real controle, pelo Estado, das atividades

desenvolvidas no âmbito das áreas de preservação permanente, em

ordem a impedir ações predatórias e lesivas ao patrimônio ambiental,

cuja situação de maior vulnerabilidade reclama proteção mais

intensa, agora propiciada, de modo adequado e compatível com o texto constitucional, pela MP nº 2.166 -67/2001 , no ponto em que introduziu

significativas alterações no art. do Código Florestal .

Sendo assim, e tendo em consideração as razões

expostas, peço vênia para propor, a este Egrégio Plenário, não seja

referendada a r. decisão que deferiu o pedido de medida cautelar,

restaurando-se, desse modo, em plenitude, a eficácia e a

aplicabilidade do diploma legislativo ora impugnado nesta sede de

fiscalização abstrata.

É o meu voto.

ADI 3.540-MC / DF"

Leia notícia sobre esse julgamento no link abaixo:

http://www.expressodanoticia.com.br/index.php?pagid=_:,jvml&id=13&tipo=>*H|w&esq=_:,jvml&id_mat=2684

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