TJ-BA - Recurso Inominado: RI XXXXX20198050043
Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 PROCESSO Nº XXXXX-20.2019.8.05.0043 APENSOS Nº XXXXX-06.2019.8.05.0043 CLASSE: RECURSO INOMINADO RECORRENTE: BANCO BRADESCO SA RECORRIDO: JOSE RAIMUNDO OLIVEIRA DOS SANTOS ORIGEM: Vara do Sistema dos Juizados - CANAVIEIRAS JUIZ (A) PROLATOR (A): EDUARDO GIL GUERREIRO RELATORA: JUÍZA CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO EMENTA RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. SERVIÇOS NÃO CONTRATADOS. ALEGAÇÃO DE COBRANÇA INDEVIDA DE SEGURO SEM PROVA DA CONTRATAÇÃO PELA CONSUMIDORA. SENTENÇA QUE DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS, EM DOBRO, BEM COMO FIXOU INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇAS REALIZADAS HÁ QUASE 04 ANOS. ANUÊNCIA TÁCITA DO CONSUMIDOR. DANOS MORAIS E MATERIAIS NÃO CONFIGURADOS. PROVIMENTO DO RECURSO PARA REFORMAR A SENTENÇA PARA IMPROCEDENTE. Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099 /95. Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, saliento que o Recorrente BANCO BRADESCO S.A pretende a reforma da sentença lançada nos autos que reconheceu como ilícita por ter cobrado serviços sem prova da contratação, determinando a restituição das parcelas comprovadamente pagas, na monta de R$ 832,32 (-) e R$ 665,85 (-), em dobro e ao pagamento de R$ 15.000,00(-) a título de danos morais em favor do Recorrido JOSE RAIMUNDO OLIVEIRA DOS SANTOS. Presentes as condições de admissibilidade de ambos os recursos, conheço-os, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma. VOTO O recurso enseja acolhimento. Declara a autora, no processo n. XXXXX-20.2019.8.05.0043 que, na data de 13 de outubro de 2015, contratou junto ao Acionado um empréstimo consignado no valor de R$ 18,440,11 (dezoito mil quatrocentos e quarenta reais e onze centavos), a ser pago em 60 parcelas de R$ 584,47 (quinhentos e oitenta e quatro reais e quarenta e sete centavos). No entanto, o valor do empréstimo efetivamente liberado na conta corrente do Autor foi de R$ 17.000,00 (dezessete mil reais), sendo questionado, o Réu alegou que a diferença entre a quantidade contratada e a efetivamente liberada se referia a cobrança do valor do IOF de R$ 607,79 (seiscentos e sete reais e setenta e nove centavos) e à contratação de um seguro, supostamente contratado pelo reclamante no ato da assinatura do contrato, no valor de R$ 832,32 (oitocentos e trinta e dois reais e trinta e dois centavos). De igual modo, no processo n. XXXXX-06.2019.8.05.0043 , o Requerente, em 08 de outubro de 2015, contratou junto ao Acionado um empréstimo consignado no valor de R$ 14.753,99 (quatorze mil setecentos e cinquenta e três reais e noventa e nove centavos), a ser pago em 60 parcelas de R$ 469,41 (quatrocentos e sessenta e nove e quarenta e um centavos). No entanto, o valor do empréstimo efetivamente liberado na conta corrente do Autor foi de R$ 13.600,00 (treze e seiscentos reais), sendo questionado, o Réu alegou que a diferença entre a quantidade contratada e a efetivamente liberada se referia a cobrança do valor do IOF de R$ 488,14 (quatrocentos e oitenta e oito reais e quatorze centavos) e à contratação de um seguro, no ato da assinatura do contrato, no valor de R$ 665,85 (seiscentos sessenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos). No entanto, foi realizada a cobrança de um seguro (INTITULADO COMO SEGURO PRESTAMISTA) sem que o peticionário sequer tivesse autorizado. Assim, requer a repetição do indébito e danos morais. A demandada, por sua vez, limitou-se a defender a validade da contratação, negando o dever de indenizar pelos danos morais e materiais. Requer a improcedência. (evento 08) Como norma de ordem pública constitucional (arts. 5º , XXXII e 170 , V , da CF ), o Código de Defesa do Consumidor foi promulgado com o objetivo precípuo de garantir o equilíbrio de direitos e deveres entre o consumidor e o fornecedor nas relações de consumo, pautado nos princípios da boa-fé e lealdade, consagrando como direito básico do consumidor ¿a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem¿ (art. 6º, III). Ao fornecedor cabe provar não somente a qualidade dos serviços prestados e dos produtos inseridos no mercado de consumo, mas também que todas as informações pertinentes foram devidamente apresentadas ao consumidor. Compulsando os autos e documentos acostados, verifica-se que os contratos foram firmados em 13/10/2015 e 08/10/2015, com incidência da cobrança relativa ao seguro discutido, sem que a acionada tenha acostado prova da contratação pela consumidora, o que corrobora com a versão autoral de ausência de vontade livre e consciente na contratação dos seguros. Por outro lado, considerando que os contratos foram firmados em 13/10/2015 e 08/10/2015 e apenas em 15 e 16/10/2019 houve o ajuizamento das demandas, estando a parte protegida durante todo este tempo, somente vindo a questionar o contrato quase 04 anos após, entendo que a mesma anuiu tacitamente com a cobrança perpetuada, de modo que, em que pese o desinteresse em permanecer com o seguro, os valores pagos possibilitaram a fruição do serviço ao tempo que o contrato esteve em vigência, pelo que não enseja a restituição do indébito. Esta Turma entende que, nesses casos, resta caracterizada a convalidação da contratação, presumindo-se ter havido aceitação/anuência tácita, além do fato de o serviço ter ficado à disposição da parte. Nesse sentido, o julgado a seguir: JECCAP-0001181) CIVIL. CONSUMIDOR. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. VÍNCULO ASSOCIATIVO. CONDIÇÃO SINE QUA NON PARA CONCESSÃO DE EMPRÉSTIMO. VENDA CASADA NÃO CONFIGURADA. INDEVIDA RESTITUIÇÃO DE VALORES. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. 1) Segundo entendimento do STJ, em sendo o Código de Defesa do Consumidor lei especial para as relações de consumo - as quais não deixam de ser, em sua essência, relações civis - e o Código Civil lei geral sobre direito civil, convivem ambos os diplomas legislativos no mesmo sistema, de modo que, em casos de omissão da lei consumerista, impõe-se a aplicação da norma civil. Assim, frente à lacuna existente no CDC no que concerne ao prazo prescricional aplicável em hipóteses que se discute a abusividade de cláusula contratual, e, considerando-se a subsidiariedade do CC às relações de consumo, deve-se aplicar, na espécie, o prazo prescricional de 10 (dez) anos disposto no art. 205 do Código Civil . ( REsp XXXXX/DF ; REsp XXXXX/RJ ). 2) Somente aos participantes de planos previdenciários é possível a concessão de assistência financeira pelas entidades de previdência privada (Lei nº 6.435 /77, Decreto nº 81.402 /78 e Lei Complementar nº 109 /2001), razão pela qual a requerida só pode conceder crédito àquele que se vincule previamente a um de seus planos previdenciários, não havendo que se falar em devolução dos valores na forma simples ou em dobro pela cobrança da primeira vinculação, por tratar-se de condição sine qua non para a concessão do empréstimo. 3) Os instrumentos contratuais juntados aos autos (ordem 17) revelam que os descontos no contracheque da autora, efetuados sob as rubricas "SABEMI SEG. SEGURO DE VIDA" e "SABEMI SEG. PREVIDÊNCIA", referem-se a plano de pecúlio/previdência/seguro firmados em 08.02.2007, juntamente com a concessão de assistência financeira, sendo aquele o primeiro vínculo associativo existente entre as partes, pelo que não se configura a ocorrência de venda casada, de sorte que o consumidor obteve benefícios na contratação e funda-se sobretudo, no princípio da liberdade de associação para fins lícitos. Não há que se falar, portanto, em ilegalidade do contrato, tampouco em devolução de valores. Em relação à subscrição firmada em 31.01.2008 (ordem 17), juntamente com nova contratação de seguro, também não se evidencia a prática de venda casada, vez que não houve nova contratação de empréstimo, não havendo, portanto, que se falar em condicionamento da concessão de mútuo à nova adesão àqueles contratos. Impende registrar que, em relação ao seguro, esteve a parte autora coberta dos riscos previstos, desde o início da vigência do contrato, não sendo razoável, somente neste momento, vir a juízo requerer a sua anulação e consequente devolução de valores. Precedentes da Turma Recursal. (grifei) 4) A liberdade de associar-se ou manter-se associado é garantida pela Carta Magna , nos termos do art. 5º , XX . Assim, é plenamente possível a desistência e o cancelamento do contrato de pecúlio/previdência a partir do momento em que o consumidor expressamente manifesta o desejo de não mais mantê-lo, o que ocorreu, in casu, com o ajuizamento da presente demanda, sendo garantida a restituição das contribuições eventualmente descontadas pela requerida após a manifestação de vontade do reclamante. 5) Recurso conhecido e provido em parte, para afastar a condenação da requerida à restituição dos valores relativos ao contrato de pecúlio/previdência/seguro, mantendo-se o cancelamento definitivo do vínculo associativo. 6) Sentença parcialmente reformada. ( Recurso Inominado nº XXXXX-31.2014.8.03.0001 , Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais/AP, Rel. César Augusto Scapin. j. 19.11.2015). De igual modo, divirjo do entendimento do MM Juiz a quo por não vislumbrar a ocorrência de danos morais no caso em análise. Embora seu conceito esteja em permanente construção, entende‑se por dano moral ou extrapatrimonial aquele que atinge, fundamentalmente, bens incorpóreos, a exemplo da imagem, honra, dignidade, privacidade, autoestima, prestígio social, reputação etc. Indenizável é o dano moral sério, intolerável para o homem médio, aquele capaz de, em uma pessoa normal, provocar uma perturbação nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos sentimentos e nos afetos, extrapolando a naturalidade dos fatos da vida social. Não é todo e qualquer ilícito que gera danos de natureza moral. A situação que merece compensação pecuniária deve adequar-se à moral do homo medius da comunidade onde vive a vítima, não podendo escapar ao sentimento comum da pessoa que convive em sociedade e deve se acostumar com seus acasos. Ao Juiz cabe a tarefa de distinguir o dano moral do mero incômodo ou aborrecimento do dia a dia, do simples inconveniente ou desconforto, a serem creditados às dificuldades do relacionamento humano ou da vida em sociedade, que também podem causar tristeza de ordem pessoal, sobretudo nos indivíduos de sensibilidade frágil ou comprometida por algum abalo psicológico. A análise das características do suposto fato gerador poderá fazer concluir não ser ele apto a ocasionar dano moral. Assim, não se mostra aceitável que, após vários anos da contratação, pagando as prestações dos serviços sem qualquer insurgência, a Recorrida possa alegar ter sofrido dor íntima intensa, sofrimento psicológico, padecimento, aflição, angústia, humilhação, vergonha, intranquilidade psíquica ou qualquer outra consequência relacionada à personalidade humana, sendo o evento, portanto, incapaz de ter ensejado, nos termos apurados, prejuízo de natureza moral passível de compensação pecuniária. Assim sendo, ante ao exposto, voto no sentido de CONHECER e DAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Recorrente BANCO BRADESCO S.A para JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS. Como a Recorrente logrou êxito em seu recurso, não há condenação por sucumbência. Salvador, Bahia, Sala das sessões, 24 de fevereiro de 2021. CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO Juíza Relatora ACÓRDÃO Realizado julgamento do recurso do processo acima epigrafado, a TERCEIRA TURMA, decidiu, à unanimidade de votos, CONHECER e DAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Recorrente BANCO BRADESCO S.A para JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS. Como a Recorrente logrou êxito em seu recurso, não há condenação por sucumbência. Salvador, Bahia, Sala das sessões, 24 de fevereiro de 2021. CRISTIANE MENEZES SANTOS BARRETO Juíza Relatora / Presidente em substituição