ADMINISTRATIVO. LEI 12.846 /2013 ( LEI ANTICORRUPCAO ). EMPRESA CONSTITUÍDA PARA DIFICULTAR A FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA. ENQUADRAMENTO NO ART. 5º , V , DA LEI 12.846 /2013. FATOS MINUDENTEMENTE DESCRITOS NA PETIÇÃO INICIAL. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO DE PRECEDENTE DO STJ FIRMADO NO RECURSO ESPECIAL XXXXX/RN . HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra ESS Empresa de Serviços Salineiros Ltda., imputando-lhe conduta descrita na Lei 12.846 /2013 (chamada Lei Anticorrupcao , denominação truncada, na medida em que seu campo de aplicação não se circunscreve a apenas atos de corrupção stricto sensu), por ter integrado organização criminosa que conseguiu sonegar R$ 527.869.928,06 (quinhentos e vinte e sete milhões, oitocentos e sessenta e nove mil, novecentos e vinte e oito reais e seis centavos). 2. O Tribunal de origem manteve a sanção de dissolução compulsória da pessoa jurídica, sob o fundamento de que a recorrente, "como mais uma empresa paper company do Grupo Líder, durante toda a sua existência serviu à prática de atos lesivos à Administração Pública, tal como anotado no art. 5º , incisos III e V , da Lei Anticorrupcao , haja vista que sua própria existência serviu apenas para dificultar as atividades de investigação e fiscalização tributária da Receita Federal do Brasil, fazendo uso de interpostas pessoas - laranjas" (fl. 359, e-STJ). AUSÊNCIA DE OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC 3. Não se configura a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil/2015 , uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado. APLICAÇÃO DE ENTENDIMENTO FIRMADO EM PRECEDENTE DA SEGUNDA TURMA 4. As alegações de mérito apresentadas pela recorrente nos presentes autos já foram anteriormente enfrentadas no Recurso Especial XXXXX/RN , Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 22.9.2020, em processo que versou sobre outra paper company do mesmo Grupo Líder, que atuou de forma idêntica. 5. Na ocasião, entendeu-se que a Lei 12.846 /2013 não subordina a apuração judicial das infrações nela descritas à anterior instauração de processo administrativo. Limita-se a reiterar o consagrado cânone da independência das instâncias ao estabelecer em seu art. 18 que, "Na esfera administrativa, a responsabilidade da pessoa jurídica não afasta a possibilidade de sua responsabilização na esfera judicial". Em outras palavras, a abertura de processo administrativo prévio não se coloca como conditio sine qua non para o ajuizamento de ação com base na Lei Anticorrupcao . 6. Em boa hora a Lei 12.846 /2013 foi promulgada para ampliar e fortalecer, no ordenamento brasileiro, os mecanismos de combate administrativo e judicial a comportamentos "contra a administração pública", fazendo-o sob um duplo regime de responsabilidade objetiva (para a pessoa jurídica) e responsabilidade subjetiva (culpa, para a pessoa física), consoante os arts. 1º , 2º e 3º , § 2º. Nela, a responsabilização se realiza no âmbito administrativo (art. 6 e segs.) e no âmbito judicial (art. 18 e segs), sem prejuízo de medidas adicionais fixadas em outras esferas e regimes jurídicos aplicáveis. São estipuladas três classes de atos de presumida lesividade à Administração Pública, nacional ou estrangeira. Os atentatórios, primeiro, contra o patrimônio público material e imaterial, nacional ou estrangeiro; segundo, contra os princípios da administração pública; e, terceiro, contra compromissos internacionais assumidos pelo Brasil (art. 5º). 7. Acrescentou ainda a Segunda Turma: "A previsão do art. 5º, V, da Lei 12.486/2013, que caracteriza como ato atentatório contra o patrimônio público nacional a conduta consistente em 'dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos', abrange a constituição das chamadas 'empresas de fachada' com o fim de frustrar a fiscalização tributária." AUSÊNCIA DE INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL 8. Afirmou-se no mesmo julgamento que o fato de o autor ter requerido a condenação da pessoa jurídica nas sanções previstas no art. 19 da Lei Anticorrupcao não configura hipótese de inépcia da inicial, pois a conduta foi minudentemente descrita na peça, dando à recorrente todas as possibilidades de contestação, "na medida em que o réu se defende dos fatos descritos na petição inicial" ( REsp XXXXX/MA , Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 13.6.2018). 9. Ademais, incide a orientação, assentada acerca da Lei de Improbidade Administrativa , de que "A ausência de indicação precisa das sanções a serem impostas não gera a inépcia da inicial, pois tal tarefa compete ao Juiz, quando da prolação da sentença" ( AgRg no AREsp XXXXX/RO , Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 10.3.2015). INOCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA 10. A recorrente aponta cerceamento de defesa, sob o argumento de que na primeira instância proferiu-se despacho encerrando a instrução sem que fosse oportunizado às partes requerer a produção de provas. 11. Sobre a alegação, assim se pronunciou o Tribunal de origem (fls. 441-442, e-STJ): "da análise dos autos, verifico que há uma decisão posterior a esse despacho e anterior à sentença que concedeu à ora embargante o prazo de 15 (quinze) dias para se manifestar acerca da prova documental que o MPF viesse a juntar aos autos; bem como apresentar outras provas que entendesse necessárias. Em resposta a essa decisão (id. XXXXX.1960604), a recorrente ficou restrita ao argumento de extemporaneidade dos documentos trazidos pelo MPF e de ausência de provas, sem se manifestar acerca da necessidade de produção de prova pericial". 12. Impossível considerar a versão fática alternativa apresentada pela recorrente, por força do que estatui a Súmula 7 /STJ. Nesse sentido: AgInt no AREsp XXXXX/RS , Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 9.4.2018; REsp XXXXX/RN , Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 18.9.2018; AgRg no REsp XXXXX/ES , Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora Convocada - TRF 3ª Região), Segunda Turma, DJe 12.2.2016. CONCLUSÃO 13. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.