HABEAS CORPUS. ART. 168 , CAPUT, DA LEI N.º 11.101 /2005. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS QUE EVIDENCIEM A CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS PARA A MANUTENÇÃO DA CAUTELAR EXTREMA. PERICULUM LIBERTATIS NÃO DEMONSTRADO. MEDIDAS PROCESSUAIS MENOS INVASIVAS, PREVISTAS NO ART. 319 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL , QUE SE MOSTRAM, POR SI SÓS, SUFICIENTES AO ACAUTELAMENTO DO PROCESSO E DA SOCIEDADE. LIMINAR RATIFICADA. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA. 1. A medida cautelar extrema, para ser legítima à luz da sistemática constitucional, exige que o Magistrado, sempre mediante fundamentos concretos extraídos de elementos constantes dos autos (arts. 5.º , incisos LXI , LXV e LXVI , e 93 , inciso IX , da Constituição da Republica ), demonstre a existência de prova da materialidade do crime e de indícios suficientes de autoria delitiva (fumus comissi delicti), bem como o preenchimento de ao menos um dos requisitos autorizativos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal , no sentido de que o réu, solto, irá perturbar ou colocar em perigo (periculum libertatis) a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal. 2. Além disso, de acordo com a microrreforma processual procedida pela Lei n.º 12.403 /2011 e com os princípios da excepcionalidade (art. 282 , § 4.º , parte final, e § 6.º, do Código de Processo Penal - CPP ), provisionalidade (art. 316 do CPP ) e proporcionalidade (arts. 282 , incisos I e II , e 310 , inciso II , parte final, do CPP ), a prisão preventiva há de ser medida necessária e adequada aos propósitos cautelares a que serve, não devendo ser decretada ou mantida caso intervenções estatais menos invasivas à liberdade individual, enumeradas no art. 319 do Código de Processo Penal , mostrem-se, por si sós, suficientes ao acautelamento do processo e/ou da sociedade. 3. Vale ainda ressaltar que todos os cidadãos, sem exceções nem privilégios, têm a favor de si a presunção de inocência como princípio constitucional fundamental, de forma a assegurar-lhes o direito de aguardar em liberdade eventual formação da culpa. Excepcionalmente, admite-se a decretação da prisão processual, se for demonstrada a imprescindibilidade dessa medida cautelar extrema, que somente pode ser decretada como ultima ratio, nos termos inflexíveis previstos na Lei Processual Penal - repita-se, para acautelar o meio social e/ou econômico, resguardar a instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal. 4. A prisão-pena somente pode ser implementada após o trânsito em julgado de condenação criminal, em conformidade com a conclusão de mérito do Supremo Tribunal Federal nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade n.os 43, 44 e 54, de relatoria do Ministro MARCO AURÉLIO. 5. O entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal e por este Superior Tribunal de Justiça é no sentido de não se admitir habeas corpus contra decisão denegatória de liminar proferida em outro writ na instância de origem, sob pena de indevida supressão de instância. Na situação dos autos, todavia, há excepcionalidade que impõe mitigar a vedação referida na Súmula n.º 691 do Supremo Tribunal Federal. 6. Na decisão em que foi mantida a decretação da medida cautelar extrema, consignou-se que há risco de manipulação de testemunhas. Todavia, o título prisional que justificou a prisão não demonstra de que forma o Paciente, concretamente, poderia influenciar depoentes. Não há sequer a individualização de quem, arrolado nos autos pelas partes, poderia eventualmente ser coagido ao ser ouvido em juízo. 7. A prisão foi fundada também no risco de destruição de provas. Mas na decisão de primeiro grau não há esclarecimentos sobre quais elementos de materialidade ainda poderiam ser eventualmente produzidos. A impossibilidade de instruir os autos com provas decorrentes de documentos que já foram inutilizados, livros e computadores removidos da sede da empresa no passado, ou máquinas que não foram encontradas, hoje, independe da prisão do Paciente. 8. Justificou-se a constrição, ainda, para assegurar a ordem econômica. Todavia, não há indicação se a proibição do agente de atuar na empresa e de manter contato com pessoas determinadas não seria suficiente para acautelar o processo. 9. Esclarecida essa conjuntura, conclui-se que a decretação da prisão preventiva está fundada em motivação inválida, pois não apontou elementos concretos que justificassem a necessidade da custódia - a qual está amparada, na verdade, em hipóteses vagas. Sem a efetiva evidência de intimidação às testemunhas ou da ingerência em provas que ainda serão utilizadas, nem da possibilidade concreta de prejudicar eventuais negociantes, motivar a prisão no resguardo da instrução criminal e da ordem econômica mostra-se inidôneo. Não há, no título prisional, indicação concreta de quais futuros atos investigatórios ou instrutórios poderiam, eventualmente, ser manipulados pelo Paciente. 10. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que o prolongamento da instrução por motivo processual alheio à defesa não pode prejudicar o Acusado - mormente na hipótese, em que há fundada evidência de que o fim da instrução mitigaria a necessidade da prisão processual, em razão da motivação que a apoia. 11. Os fatos de o crime não ter sido cometido com violência ou grave ameaça, e tratar-se de réu primário, reforçam a impossibilidade de reconhecimento da configuração do periculum libertatis na espécie. 12. Ordem de habeas corpus concedida para ratificar a liminar em que foi determinada a substituição da prisão preventiva do Paciente, se por al não estivesse preso, mediante a imposição das medidas cautelares do art. 319, incisos I; III; IV e VI, do Código de Processo Penal , com condições estabelecidas pelo Juiz da causa, que poderia eventualmente impor outras medidas que entendesse necessárias, desde que devidamente fundamentadas.