PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. IRREGULARIDADE. IMPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA RESTABELECER A SENTENÇA CONDENATÓRIA. ADMISSIBILIDADE IMPLÍCITA, DESNECESSIDADE DE ENUMERAÇÃO E INDICAÇÃO DE ÓBICES NÃO APLICÁVEIS. ACÓRDÃO PROFERIDO NA CORTE DE ORIGEM QUE VIOLA DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE E DA MELHOR PROPOSTA DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. CONEXÃO COM RESP XXXXX/RS : CAUTELAR DA ANULATÓRIA. DECISÃO DE PROVIMENTO DO RESP DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. I - Na origem, a empresa Prestação de Serviços Ltda. - PRT ajuizou ação ordinária contra o Município de Farroupilha com o objetivo de anular o Edital Concorrência n. 10/2003, relativo ao sistema de limpeza da cidade, sob a alegação de existência de irregularidades que teriam vedado a participação de outros licitantes. Os pedidos foram julgados parcialmente procedentes com relação a alguns dos réus. No Tribunal a quo a sentença foi reformada, julgando improcedentes os pedidos constantes nas três ações e, no tocante à cautelar, deliberou sobre a perda de seu objeto. II - A deficiência de outros recursos interpostos contra o acórdão objeto do presente recurso especial não vincula a decisão proferida nestes autos. Assim, o fato de eventual recurso não ter ultrapassado a barreira da admissibilidade, não obriga que este mesmo desfecho ocorra nos presentes autos, se não presentes as mesmas circunstâncias. III - A Corte Especial deste Tribunal já se manifestou no sentido de que o juízo de admissibilidade do especial pode ser realizado de forma implícita, sem necessidade de exposição de motivos. Assim, o exame de mérito recursal já traduz o entendimento de que foram atendidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade, inexistindo necessidade de pronunciamento explícito pelo julgador a esse respeito. (EREsp XXXXX/PI, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Corte Especial, DJe 19/12/2014). No mesmo sentido: AgInt no REsp XXXXX/MG , Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 10/08/2020, DJe 26/08/2020; AgRg no REsp XXXXX/SC , Relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/6/2015; AgRg no Ag XXXXX/AL , Relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 3/4/2014). IV - O Acórdão proferido na Corte a quo viola expressamente o artigo 46 da Lei n. 8.666 /93 ao adotar o tipo de licitação "técnica e preço". O poder público municipal, ao adotar o critério técnica e preço, incorreu em erro, uma vez que tal critério é destinado exclusivamente para as licitações de natureza predominantemente intelectual, o que não é o caso. V - O critério "técnica e preço" destina-se à concessão prevista na Lei n. 8.987 /95 e não à contratação da Lei n. 8.666 /93. Portanto, o critério de julgamento das propostas deveria ser o de menor preço (art. 45 , § 1º , I , da Lei 8.666 /93). VI - No caso em análise, o trabalho a ser desenvolvido é predominantemente manual e não intelectual, quais sejam, conforme fixado na sentença: "Coleta de resíduos sólidos (R$ 52.593,30), varrição de ruas (R$ 49.446,00) e capinas, roçadas e pintura (R$ 38.431,74) são os quesitos de maior valoração numa planilha orçamentária de R$ 201.888,93". Ou seja, dúvidas não há de que não se trata de tarefa predominantemente braçal e não intelectual.(fls. 1.374) VII - Há também violação do artigo 33 da Lei n. 8.666 /93. Isto porque como bem ressaltado na sentença "o edital de licitação ora discutido restringiu a participação de empresas consorciadas no processo licitatório, sem qualquer justificativa". A conduta afronta expressamente o artigo 33 da Lei n. 8.666 /93, além de frustrar o objetivo de selecionar a proposta mais vantajosa à administração pública.VIII - Em atenção aos princípios da isonomia e da escolha da proposta mais vantajosa, considerando que o Edital prevê a prestação de serviços diversos, não há razão para se vedar a participação de empresas sob consórcio. Tal vedação não atende aos princípios norteadores da licitação; logo, deve ser afastada do Edital.IX - Também como bem ressaltado na sentença "não se trata de critério discricionário do Administrador Público, mas de um princípio jurídico que deve ser mantido". Ademais, não consta no edital nenhuma motivação jurídica e legal para se vedar a participação de consórcio de empresas X - Por certo, ainda que de alta complexidade, não é o caso dos serviços de limpeza pública e tratamento final em aterro sanitário de uma cidade de porte médio, se tanto. Descabe ao Judiciário, com base num juízo subjetivo, impor ao Administrador Público a admissão de consórcio. Diante de tais fundamentos, constata-se que houve expressa afronta aos princípios basilares da administração pública, especialmente, os referentes à legalidade, impessoalidade e à moralidade, bem como a frustação da licitude do processo licitatório com a avença celebrada com a empresa Vega Engenharia Ambiental Ltda. para a prestação de serviços de coleta e transporte de resíduos.XI - O Edital 10/2003, sem observer a natureza jurídica de uma ou de outra prestação de serviços, mesclou ambos os institutos. Permitiu uma concessão de serviço, por conta e risco do Município, com prazo de 12 anos, prorrogável por mais 12 anos, em completo desrespeito ao art. 57 , II , da Lei 8.666 /93. Logo o Edital não pode subsistir na forma como foi lançado.XII - Se o Município estivesse a outorgar a concessão prevista na Lei n. 8.987/93, haveria a necessidade de ato justificando a conveniência da outorga da concessão, do objeto, área e prazo; o investimento seria, por conta e risco, do contratado; e o preço seria pago pelos usuários, mediante tarifa. Neste caso, poder-se-ia justificar o prazo de 12 anos, prorrogável por mais 12 e os respectivos custos e despesas. No entanto, considerando que o preço será pago pelo Município e não pelos usuários, nada há a justificar a incidência de outra Lei que não a Lei n. 8.666 /93.XIII - No mesmo sentido também se manifestou o Ministério Público Federal no parecer d e fls. 3.618-3.620.XIV - Correta, portanto, a decisão recorrida que deu provimento ao recurso especial para restabelecer os termos da sentença condenatória.XV - Conexão com o REsp n. 1.45.437/RS, originário da cautelar desta anulatória, dando provimento ao recurso especial do Ministério Público para restabelecer a sentença monocrática que julgou parcialmente procedente a cautelar, para anular o Edital de Concorrência n. 10/2003 e os atos que lhe sucederam.XVI - Agravo interno improvido.